sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

Lula deveria valorizar e agradecer o papel que as Forças Armadas tiveram na derrota do golpe

A entrevista que Lula deu à Natuza Nery da GloboNews (*), e divulgada no dia 18/01/23, revelou um Presidente surpreendido pelos fatos que cercaram a tentativa de golpe da extrema-direita bolsonarista no dia 8/01/23, sete dias após a sua magnífica posse.


Em que pese Bolsonaro tenha trabalhado a cada dia do seu mandato para envolver as Forças Armadas no seu projeto antidemocrático, a tentativa de golpe teve como consequência esclarecer e demonstrar o compromisso firme destas com a Constituição, com o Estado Democrático de Direito e com a legalidade.

Quem é contra os fatos? Os fatos listados, a seguir, são essenciais para a compreensão e superação da crise, e para a construção de um clima de estabilidade democrática:

1. A gravidade do atentado revelou um Presidente não informado pelos sistemas de informação do Estado sobre o que aconteceria, embora o que se soubesse por outros meios já fosse muito preocupante;

2. A desconfiança e a insegurança legítimas do Presidente tem base objetiva:
  • A tropa de elite institucional formada por militares das três Forças Armadas para proteger o Palácio do Planalto não agiu; pior, se omitiu; e fortes evidências mostram que foi conivente, simpática e complacente com os invasores;
  • O dispositivo de proteção da capital federal a cargo da PM/DF, sob o comando do Governador Ibaneis chegou, permissivamente, a dar escolta à massa de extremistas até a Praça dos Três Poderes; e ficou óbvio que quando lá chegaram passaram à execução do já planejado: tomar os palácios e proceder ao quebra-quebra dos símbolos da República e da democracia brasileira;
  • Não foram poucas as manifestações individuais de militares da ativa e da reserva de apoio aos insurretos.
3. Mas Lula, provavelmente, em virtude das fortes emoções que cercaram tais gravíssimos acontecimentos para derrubá-lo há poucos dias de sua posse, não conseguiu ter uma visão equilibrada do papel que as Forças Armadas tiveram para inviabilizar o golpe que Bolsonaro tentou dar apoiado por seus extremistas delirantes:
  • Fato I: as FFAA, incluídas as três forças, não saíram dos quartéis para apoiar o golpe;
  • Fato II: as FFAA já não apoiaram o golpe, quando Bolsonaro pretendera dá-lo nos 7 de setembro de 2021 e 2022; antes dos 1º e 2º turnos da eleição presidencial de 2022 e, entre 30/10/22 e 31/12/22, após a vitória de Lula, quando ainda estava no poder.
4. Foram importantíssimas as tempestivas e firmes atitudes de Lula, de Flavio Dino, dos ministros do STF, dos chefes do Poder Legislativo, dos Governadores, das Instituições civis e Personalidades do campo democrático, das principais Redes jornalísticas de Imprensa, Televisão e Rádio e, nas redes sociais, de milhões de brasileiros comprometidos com a democracia; elas demonstram a existência de uma união vigorosa das instâncias da República em defesa da democracia, e a opção esmagadora dos brasileiros pela democracia.

5. Mas essa resistência democrática não barraria o golpe se as FFAA usassem o seu poder armado para apoiá-lo. Não quiseram usá-lo, foram contra usá-lo e decidiram não o usar. Não cabe a nós ficarmos criando narrativas fantasiosas: se as Forças Armadas tivessem apoiado o golpe ele teria sido concretizado; somente por erro de análise ou por conveniência política alguns poderão dizer o contrário, mas esta é a simples realidade.

6. Reconhecer isto não significa leniência com os crimes contra a democracia que tenham sido cometidos por militares ou civis. Todos devem ser punidos, em respeito ao devido processo legal, a começar pelos principais responsáveis. 

Por que é fundamental trazer esta discussão? Porque, se Lula não compreender isso não conseguirá valorizar - e agradecer - o papel que as FFAA (diga-se, a sua cadeia de comando) tiveram na derrota do golpe e, consequentemente, não conseguirá fazer os gestos rápidos que se fazem necessários para pacificar o país, e evitar futuras crises que, infelizmente, ainda estão no horizonte das possibilidades.

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terça-feira, 17 de janeiro de 2023

O golpe que Bolsonaro quis dar, e tentou dar, mas que não teve apoio das F.A. para dar

Desde cedo temos tido dificuldade de analisar, e separar, duas questões factuais da relação de Bolsonaro com as Forças Armadas, em particular com o Exército:
  1. O fato de que Bolsonaro sempre quis dar o golpe que tentou dar. Talvez tenha estado iludido pelo fato de que muitos militares são bolsonaristas, de que votaram nele em 2018 e 2022, de que ele comprou adesões com altos salários e cargos no governo, e de que, individualmente, alguns militares extremistas estiveram até dispostos a apoiá-lo na aventura do golpe;
  2. O fato de que as Forças Armadas não saíram dos quartéis para apoiar o golpe que Bolsonaro quis dar. Na verdade, decidiram não sair. Já não o tinham apoiado nos golpes que quis dar nos 7 de setembro de 2021 e 2022, antes dos 1º e 2º turnos da eleição presidencial de 2022 e, entre 30/10/22 e 31/12/22, após a vitória de Lula, quando ainda estava no poder. Finalmente, não o apoiaram na “brancaleônica” e infame intentona de 8/01/23 após a posse de Lula.
Não cabe a nós ficarmos criando narrativas fantasiosas: se as Forças Armadas tivessem apoiado o golpe ele teria sido concretizado. E isto, apesar das tempestivas e firmes atitudes de Lula, de Flavio Dino, dos ministros do STF, dos chefes do Poder Legislativo, dos Governadores, das Instituições civis e Personalidades do campo democrático, das principais Redes jornalísticas de Imprensa, Televisão e Rádio e, nas redes sociais, de milhões de brasileiros comprometidos com a democracia.


Perduraria tal golpe tão isolado politicamente, nacional e internacionalmente? Provavelmente seria um “golpe voo de galinha”. Mas é sempre mais fácil dar um golpe do que retornar à democracia.

OS CAMINHOS DA DEMOCRACIA

A tentativa de insurreição promovida pela extrema-direita bolsonarista, para a tomada do poder, ocorrida no dia 8 de janeiro de 2023, entrará para a história da república, e será lembrada, com repugnância, como o “golpe que Bolsonaro prometeu dar e incentivou dar, que sabia que não tinha força para dar, mas que não teve coragem moral para impedir que os seus apoiadores extremistas tentassem dar”. 

A responsabilidade de Bolsonaro é clara. Será cobrado com a força da lei e das que regem o Estado Democrático de Direito. É o mesmo tenente que o Exército tivera que expulsar de suas fileiras no passado e que, por acidente, tornou-se Presidente da República!

Os seus “intervencionistas” tiveram o seu dia de glória. Invadiram e depredaram os palácios desprotegidos dos Três Poderes, o Planalto, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Foi um passeio, fizeram o que quiseram. Ao fazê-lo, por um momento, talvez tenham gozado o prazer, a catarse e a sensação vã de que estes símbolos estavam em suas mãos e sob o seu controle. 

Mas esse dia infame jamais será esquecido, pois foram criminosamente desrespeitados e conspurcados os símbolos maiores da República e da Democracia!

Ah…, sim, demonstrando o seu delírio insano, pensaram atrair o apoio das Forças Armadas para o seu projeto golpista. Com isso, ultrapassaram todos os limites da paciência. Existem males que vêm para o bem. Doravante, terão que se haver com a força da lei. E saiu fortalecida a nossa democracia!

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O jornalista Marcelo Godoy, do Estadão, foi extremamente feliz ao analizar a questão militar no seu artigo do dia 16/01/2023, cuja íntegra segue abaixo (*):

EXÉRCITO TERÁ DE RECONSTRUIR DISCIPLINA E CONTROLE DA RESERVA APÓS GOLPE BOLSONARISTA
“O golpe só não teve sucesso também porque, desde os coronéis até o Alto Comandos das Forças, os chefes militares não aceitaram a ruptura desejada pelos extremistas. Eles cumpriram com seu dever. Em tempos extremos, de polarização, a decisão desses homens deve ser reconhecida.”

Marcelo Godoy – O Estado de S.Paulo, 16/01/23

Um dos piores dias da história do Brasil. É assim que generais ouvidos pelo Estadão classificaram o que houve na Esplanada dos Ministérios, no dia 8, em Brasília. Uma semana antes, o Comando Militar do Planalto (CMP) havia mobilizado 6 mil homens para garantir a segurança da posse de Luiz Inácio Lula da Silva, sem que estes pudessem ser vistos ou simplesmente aparecer. E tudo saiu como planejado. Nada estragou a festa do presidente eleito.

O que houve, então, para que a segurança falhasse e a chamada “tomada de poder” levada a cabo pelos extremistas pudesse ser concluída com a invasão e depredação das sedes do três Poderes? Houve um apagão na área de inteligência, e o cenário que o CMP tinha era o de mais uma manifestação, como tantas outras levadas a cabo pelo bolsonarismo nos últimos dois anos. Todas, apesar de muitas de suas palavras de ordem serem manifestamente golpistas – intervenção militar, fechar o STF e o Congresso, etc – não haviam passado da palavra para a ação.

Mas o cenário que a chefia da Segurança Pública do Distrito Federal e que os militares do Exército trabalhavam estava errado. Faltou aos responsáveis pela segurança e pelos órgãos de inteligência a correta leitura da tempestade que se avizinhava. E havia raios e trovoadas que a anunciavam nas últimas semanas. Episódios de violência haviam sido registrados em dezenas de atos e protestos dos que estavam inconformados com a eleição de Lula. Eles se repetiram nas estradas, com tentativas de assassinato de policiais rodoviários; nas cidades, com as agressões a estudantes e em outros atentados à ordem pública.

Até que, na véspera do Natal, bolsonaristas tentaram explodir uma bomba em um caminhão-tanque em Brasília. A tentativa frustrada podia causar caos e mortes no aeroporto de Brasília. Mas não foi suficiente para alertar as autoridades. Muitos dos que tinham responsabilidade institucional continuaram a escalar a crise, como o almirante Almir Garnier Santos, que se recusou a passar o comando da Marinha ao sucessor, o almirante Marcos Sampaio Olsen. Garnier empregara mulher e filho no governo Bolsonaro. E esqueceu que a continência se presta à Presidência e não ao presidente, adubando o extremismo.

Era evidente que a radicalização dos perdedores na eleição lentamente deixava o campo das palavras para passar ao das ações. Saía da arena política para “continuá-la” nos movimentos armados. Foi assim que se convocou a intentona do dia 8. Chamada pelos radicais de “tomada do poder”, seus organizadores pediam a participação de militares da reserva que tivessem experiência para enfrentar policiais na manifestação. Deixavam claro que a intenção era acampar na sede dos três Poderes para forçar a ação das Forças Armadas a fim de derrubar Lula. Seguiam o modelos dos golpes registrados recentemente na Bolívia e no Sri Lanka.

Para ter sucesso, a intentona bolsonarista contava com a simpatia que o movimento despertava nos quartéis. Assim também outros radicais no passado tentaram tomar o poder por meio de insurreições armadas nos anos 1920 e 1930. A última vez que um partido político tentara usar essa fórmula foi em 1938, quando o tenente Severo Fournier liderou os fascistas da Ação Integralista Brasileira no assalto ao Palácio da Guanabara, no Rio, então residência oficial da Presidência. Três anos antes, os comunistas, liderados por Luiz Carlos Prestes, haviam tentado tomar o poder, rebelando unidades militares no Rio e no Nordeste.

Fournier e Prestes apostavam no apoio que teriam no Exército e na Armada. E falharam. O mesmo se passou agora com a intentona bolsonarista. É possível que a simpatia pelos acampados na frente dos quartéis tenha levado muitos dos generais a subestimar a ameaça representada pelos extremistas, o que os impediu de analisar corretamente o processo de radicalização acelerada desse grupo. A ideia de que os episódios de fanatismo se reproduziam sem maiores consequências ajudou a criar a avaliação errada.

Agora, confrontados com o fracasso da estratégia para desmobilizar os acampamentos na frente dos quartéis, os generais se veem diante da desconfiança de que teriam sido lenientes com os extremistas. Trata-se de julgamento açodado. Se alguém queria dar um golpe – e a minuta apreendida na casa do ex-ministro Anderson Torres mostra que havia sim quem desejasse isso –, é necessário dizer que a ruptura constitucional só não ocorreu porque os criminosos não obtiveram o apoio que esperavam nas Forças Armadas.

Ainda assim é necessário estabelecer as responsabilidades sobre o que aconteceu em Brasília. E as Inteligências Policial e Militar são as principais responsáveis pelo que houve. Ou por incompetência de ver o que qualquer jornalista já sabia desde sexta-feira, dia 6 – os planos violentos do bolsonarismo –, ou por conivência criminosa. Em qualquer dos casos, o bom senso exige que seus chefes sejam mudados. É preciso apurar as responsabilidades e isolar os extremistas.

Mas também se deve fazer Justiça. O golpe só não teve sucesso também porque, desde os coronéis até o Alto Comandos das Forças, os chefes militares não aceitaram a ruptura desejada pelos extremistas. Eles cumpriram com seu dever. Em tempos extremos, de polarização, a decisão desses homens deve ser reconhecida. Por mais que a simpatia passada dos generais pelo que hoje é chamado de bolsonarismo exista e por mais que esse projeto de poder tenha se mostrado um desastre, é preciso dizer que, no dia 8, só os que se deram bem no governo ou que se fanatizaram aderiram ao plano de tomada de poder dos radicais.

Os militares têm, agora, a missão de reconstruir as relações com os civis e a disciplina entre os milhares de integrantes da reserva. O caso do coronel Adriano Testoni não é único. Após ofender o Exército e seus generais no dia 8, o coronel bolsonarista foi indiciado em Inquérito Policial Militar (IPM), concluído em 3 dias, depois de ter sido aberto por ordem do general Gustavo Henrique Dutra Menezes, comandante do CMP. Enfrentar o extremismo será uma das principais missões da atual geração de oficiais. Com o devido processo legal, mas sem passar a mão na cabeça ou anistiar os bandidos que envergonharam o País.

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segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

OS CAMINHOS DA DEMOCRACIA (*)

(Artigo revisitado após a tentativa infame de golpe em 8 de janeiro de 2023)

A tentativa de insurreição promovida pela extrema-direita bolsonarista, para a tomada do poder, ocorrida ontem, dia 8 de janeiro de 2023, entrará para a história da república, e será lembrada, com repugnância, como o “golpe que Bolsonaro prometeu dar e incentivou dar, que sabia que não tinha força para dar, mas que, em sua insanidade, não teve coragem moral nem responsabilidade para impedir que os seus apoiadores extremistas tentassem dar”.


A responsabilidade de Bolsonaro é clara. Será cobrado com a força da lei e das que regem o Estado Democrático de Direito. É o mesmo tenente que o Exército tivera que expulsar de suas fileiras no passado e que, por acidente, tornou-se Presidente da República!

Os seus “intervencionistas” tiveram o seu dia de glória. Invadiram e depredaram os palácios desprotegidos dos Três Poderes, o Planalto, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Foi um passeio, fizeram o que quiseram. Ao fazê-lo, por um momento, talvez tenham gozado o prazer, a catarse e a sensação vã de que estes símbolos estavam em suas mãos e sob o seu controle. 

Mas esse dia infame jamais será esquecido, pois foram criminosamente desrespeitados e conspurcados os símbolos maiores da República e da Democracia!

Ah…, sim, demonstrando o seu delírio insano, pensaram atrair o apoio das Forças Armadas para o seu projeto golpista. Com isso, ultrapassaram todos os limites da paciência. Existem males que vêm para o bem. Doravante, terão que se haver com a força da lei. E saiu fortalecida a nossa democracia!

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quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

Uma nova oportunidade para o Brasil: a disputa política entre os democratas-radicais e os democratas-conservadores

Aqui está todo o ministério de Lula. Torço pelo seu sucesso, pois torço pelo Brasil.

Abaixo, em ilustração de Walmyr Buzatto, o ministério completo, com o nome de cada um dos ministros:


A vitória incontestável da chapa Lula-Alckmin nas eleições presidenciais, embora por pequena diferença de votos, demonstrou exaustiva e completamente a importância para a democracia da existência de um sistema de votação e apuração de votos confiável e não sujeito a fraudes. O nosso, o eletrônico, passou pelos testes mais exigentes, inclusive por parte dos que pretendiam contestá-lo de boa ou de má fé; caso contrário, o país teria mergulhado em grave crise institucional.

Foi a vitória da radicalidade democrática, a de um campo político democrata-radical, que em distinção mais tradicional temos denominado de centro-esquerda.

Mas os democratas brasileiros não se distinguem apenas como os acima. Saberemos, todos os democratas brasileiros, nos olharmos e nos reconhecermos além das polarizações ideológicas que nos cegam e dividem? E que trazem o risco de nos confrontarmos de forma fratricida para combater os espectros e fantasmas ameaçadores do fascismo e do comunismo?

Não, não queremos viver em um mundo paralelo e imaginário habitado por fanáticos e por suas narrativas fake delirantes! Enquanto sociedade, só teremos uma saída boa para todos se preferirmos mais viver no mundo real das incertezas desafiadoras, que dão sabor à vida, do que no mundo irreal das certezas simplificadoras e enganosas, e que são o ovo da serpente da violência e da irracionalidade!

Existe um outro vasto contingente de democratas, de um campo político democrata-conservador, que em distinção mais tradicional temos denominado de centro-direita.

Este último campo elegeu a maioria dos senadores e deputados federais; por isso, de uma certa forma, também foi vitorioso.

Uma estranha eleição: os democratas-radicais e os democratas-conservadores foram, ambos, de uma certa forma vitoriosos e de uma certa forma derrotados. Não cabe tapar o sol com a peneira.

Tudo o que se pode dizer é que as eleições de 2022 foram uma vitória da democracia, com os seus vitoriosos e os seus derrotados!

Cabe, agora, passadas as emoções das eleições, usarmos todos os instrumentos do conhecimento, da racionalidade e da ciência para caracterizar, definir e descrever quem são esses democratas, radicais ou conservadores.

Confesso estar otimista de que nos reconheçamos, a grande maioria dos brasileiros, como democratas! Se conseguirmos fazer, em nossas mentes, essa operação, conseguiremos liberar uma energia cívica imensa para derrotar as forças do atraso que bloqueiam o progresso e o desenvolvimento de nossa democracia!

A derrota de Bolsonaro foi a derrota da extrema-direita, que, assim como a extrema-esquerda, não tem compromissos com a democracia. Simplesmente, defendem ditaduras e não têm apreço pelo Estado Democrático de direito. 

Bolsonaro está fora e à direita do campo dos democratas-conservadores, que são democratas! Cabe a Lula, também, segurar os seus extremistas!

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

Os caminhos da democracia

Todo o debate político que se seguirá nos próximos quatro anos se dará no campo dos que defendem a democracia como valor universal. E acho que devamos iniciá-lo imediatamente.

Pode-se distinguir, basicamente, dois campos neste debate: o dos “democratas-radicais” e o dos “democratas-conservadores”, embora a diversidade seja bem maior. O que os distingue é defenderem a democracia; portanto, repudiam todo tipo de ditadura e defendem o Estado Democrático de Direito. Antecipo que situo-me no primeiro campo.


A derrota de Bolsonaro foi a derrota da extrema-direita, que defende uma ditadura inspirada no fascismo. Ele está fora e à direita do campo dos democratas-conservadores, pois, embora a maioria dos seus eleitores sejam conservadores, eles são democratas e não defendem ditaduras. Enquanto liderança está acabado, pois nada tem a oferecer para enfrentar as tarefas da construção de um Brasil moderno.

Lula está no campo dos democratas-radicais, embora exista entre os seus apoiadores grupos minoritários que são de extrema-esquerda e que, também, não têm apreço pela democracia. Pessoalmente, sou dos que não considera Lula inocente, não o absolvi e não esqueci o que ele e o PT andaram aprontando. Mas, eleito e empossado, torço pelo seu sucesso, pois torço pelo Brasil.


Acredito que a democracia é o valor mais importante na hierarquia de valores políticos fundamentais, e que este também seja o pensamento da imensa maioria dos brasileiros.

Bolsonaro, em nome do seu projeto anti-iluminista, anti-positivista, anti-ciência e inspirado no fascismo, incentivou, planejou e torceu, até o último instante, para que as Forças Armadas o apoiassem no golpe militar que queria dar.

Os militares brasileiros, embora constrangidos e pressionados, disseram não ao golpe! Não porque não sejam conservadores, mas porque foram formados para analisar e considerar estarmos geopoliticamente no mundo ocidental, capitalista e democrático. E orgulham-se de na 2ª Guerra Mundial terem lutado contra o fascismo. 

Os militares, majoritariamente, estão no campo democrático-conservador, o mesmo de Tarcísio de Freitas. Bolsonaro tentou empurrá-los para o campo da extrema-direita e do fascismo. Saltaram desse bonde, pois querem olhar para o futuro. E o buscam no campo da democracia.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Pelé, o Rei

Não podemos negá-lo, temos orgulho de sermos a pátria do Rei Pelé! Um brasileiro vindo de família pobre, preto, mas sem dúvida o mais admirado e conhecido em todo o mundo por seu mérito e genialidade como jogador de futebol. Os seus feitos esportivos são tão extraordinários que o seu nome virou adjetivo para expressar as melhores qualidades e a própria excelência em qualquer atividade humana.


Eu, 77 anos, tive o privilégio de assistir a todas as copas de que participou. Primeiro, no rádio, como em 1958 (na Suécia) e 1962 (Chile), quando pela primeira e única vez uma seleção foi bicampeã em duas copas sucessivas, e a de 1966 (Inglaterra). Depois, a última de que participou, a primeira com cobertura de TV, em 1970, no México, quando o Brasil consagrou-se tricampeão. Estava instaurada uma hegemonia futebolística que levou o Brasil ao pentacampeonato em 2002 (Coreia do Sul e Japão), depois de conquistar o tetracampeonato na copa de 1994 (EUA).

Foi um tempo em que uma seleção que entrasse em campo contra o Brasil sentia, simultaneamente, o orgulho dessa oportunidade, e o sabor amargo de que eram poucas as chances de que saísse vitorioso! Pois, se é verdade que no futebol, como em todo jogo,  reina a incerteza, a seleção brasileira acabara de impor um novo componente objetivo e subjetivo de racionalidade determinística: a sua indiscutível superioridade técnica.

Pelé foi o único jogador de futebol, em campo, a conquistar a taça de campeão do mundo por três vezes. 


Para o nosso orgulho, foi, também, um outro brasileiro, o Zagallo, um ícone de nossa história futebolística, o único a conquistar essa honra por três vezes. Duas como jogador, em 1958 e 1962, e uma terceira como treinador, em 1970, no México. 

Fato importante a ser registrado em nossa historiografia político-futebolística, entretanto, é que Zagallo entrou como treinador de última hora, em substituição a João Saldanha, quando a seleção já estava convocada e treinando. Isto não retira o mérito de Zagallo; mas não pode passar em branco, pois a CBF foi obrigada a substituir a João Saldanha, ligado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), por uma imposição do então ditador militar de plantão, o General Emilio Garrastazu Médici.

Mas a melhor forma de homenagear ao Rei Pelé é passar a palavra para quem o conhece bem: o Dr. Tostão, campeão do mundo, um outro gênio da bola, e seu súdito como todos nós.


“Antes de a bola chegar, pelo olhar, Pelé já me dizia o que pretendia fazer”

TOSTÃO 

Quando quero me sentir orgulhoso e importante, falo que joguei com Pelé. A primeira vez que o vi em campo, pelo Santos, foi no estádio Independência, em Belo Horizonte, antes da Copa de 1958. Ele devia ter 17 anos, e eu, dez. Fiquei encantado com suas tabelas com Coutinho.


Em 1966, na Copa do Mundo da Inglaterra, eu fui o reserva dele. No dia da apresentação, em Lambari, no sul de Minas, o encontrei pela primeira vez fora dos gramados. Ele me recebeu com alegria e com um largo sorriso. O Cruzeiro fez um jogo-treino contra a Seleção, em Caxambu, e eu atuei pela Seleção, no lugar de Pelé, que não entrou na partida. Depois do jogo, meu pai, que estava presente, me pediu para conhecer o Rei. Pelé conversou e brincou com ele. Meu pai, emocionado, chorou, como um súdito apaixonado pela realeza.

Pelé estava sempre alegre, sorridente. Atendia a todos com gentileza. Na época, não havia a distância que há hoje entre os grandes craques, a imprensa e o público. Pelé me passava a impressão que o gênio e o ser humano eram um só. Não parecia ter o conflito frequente que há nas celebridades, entre o ser humano e a personagem, o criador e a criatura.

Pelé foi o melhor de todos os tempos porque tinha, no mais alto nível, todas as qualidades de um supercraque. Depois, como analista, procurei em minhas lembranças alguma deficiência de Pelé e não encontrei. O que mais eu estranhava é que Pelé tinha uma condição física magistral, uma velocidade e uma impulsão maior que todos os outros, mesmo sendo um menino pobre, que nunca frequentou uma boa academia, que nunca teve acesso à moderna tecnologia nutricional e que treinou pouquíssimo, porque, desde muito jovem, jogava pelo Santos três vezes por semana, pelo Brasil e pelo mundo.

Emocionalmente, Pelé era também muito forte, consciente de que era superior a todos e que dependia do conjunto para brilhar. Quando o jogo estava difícil e ele era muito bem marcado, ficava inquieto, possesso. Às vezes, ia jogar de centroavante, entre os zagueiros. Pedia a bola e, com velocidade e força física, tirava os zagueiros da jogada para finalizar e fazer o gol.

Antes da Copa de 1970, falava-se muito que ele estava decadente, mais lento e e que não tinha a mesma regularidade de antes. Pelé se preparou muito para o Mundial, para encerrar a carreira como o maior de todos os tempos

Logo que comecei a jogar ao lado dele, percebi que, antes de a bola chegar, ele ficava agitado e me olhava com os olhos salientes, como se dissesse o que pretendia. Eu tentava acompanhá-lo, pelos movimentos do corpo. É a comunicação analógica. Se eu tivesse jogado no Santos ou ele no Cruzeiro, faríamos uma dupla muito melhor. Além disso, na época, a Seleção atuava muito menos que hoje.

É impressionante como Pelé, mesmo tendo encerrado a carreira há 50 anos, manteve o prestígio mundial de um Rei. Continuou a ser uma estrela, um garoto-propaganda, uma celebridade em todo o mundo. Depois que morrerem todas as pessoas que viram Pelé jogar ao vivo, no gramado e pela televisão, como Pelé será visto pelas novas e futuras gerações?

Os reis também morrem. É a finitude da vida, a única certeza absoluta. Já estou com saudade de Pelé, de vê-lo nos gramados, na concentração, com seu jeito alegre e simples de ser Rei. Parafraseando João Guimarães Rosa, Pelé não morreu, ficou encantado.”

quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Tebet ministra do Planejamento

Tebet decidiu aceitar a pasta de Planejamento.

Todos os que votamos e acreditamos nela lhe desejamos sucesso porque lhe queremos bem e torcemos pelo Brasil.


Mas, ao tomar essa decisão assume o compromisso tácito de não ser candidata a Presidente em 2026. A razão é simples: por um lado, Lula tem o direito constitucional à reeleição; e, caso não o queira, dificilmente o PT abrirá mão de lançar candidato próprio, como, p.ex., Fernando Haddad ou Wellington Dias.

Registro, entretanto, que este é o delineamento mais provável. A política gosta de nos pregar surpresas, e, claro, ainda manterei a esperança de que o Brasil moderno, que anseia por nascer, tenha em Simone uma de suas principais protagonistas.
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Por que julgo mais provável que Simone não vá ser candidata em 2026?

1. Porque a ida para o ministério corresponde a um empenho pelo sucesso do governo Lula; não cabe a hipótese de ela ser uma estranha no ninho e o de percorrer um caminho autônomo que lhe permita, ao mesmo tempo, participar do governo e apresentar-se como candidata a Presidente em oposição ao candidato que, CERTAMENTE, o PT apresentará;

2. As diferenças de opinião terão que ser arbitradas e resolvidas harmoniosa e organicamente, particularmente as com Haddad, que é o ministro forte; caso contrário ela será fritada sem dó nem piedade;

3. Simone não é “Maria vai com as outras”; aí está um potencial de conflito; tudo irá depender de se Lula a apoiará e de se o MDB a bancará;

4. Estão errados, com todo o respeito, os que pensem que será fácil para ela romper, mais adiante, para sair candidata; isso somente seria possível se ela sair do governo, ao mesmo tempo, como vencedora de um debate público e como injustiçada e perseguida; isso poderá acontecer, mas julgo pouco provável; se houver conflito insanável, o mais provável é que ela seja expelida em meio a um processo de fritura para marca-la como incompetente ou traidora; já conhecemos este filme.