terça-feira, 6 de junho de 2023

Sobre narrativas, fatos, mentiras e realidade

O amigo facebookiano Elson Rezende de Mello (*) coloca a seguinte questão: - “Narrativa é mentira?”.

Esta, sem dúvida, é uma questão relevante, pois o uso da palavra “narrativa” ganhou nos dias de hoje um significado voluntarista, que a coloca quase como sinônimo de explicação mentirosa ou fake conveniente, ao bel prazer dos que as constroem, para manipular ou influenciar a outrem, ou mesmo a um país inteiro.

Mas a expressão narrativa merece mais respeito, ou, no mínimo, precisamos restaurá-lo!

Minha resposta: 

Narrativas não são mentiras! Não, em princípio.

Todas as melhores ou piores obras literárias são narrativas. Embora influenciem aos leitores, às vezes muito; são obras de arte e, mesmo que ficcionais ou fantasiosas, não são mentiras construídas com a intenção deliberada de enganar.

Os melhores (e os piores) livros de História, enquanto ciência, são narrativas.

Toda pesquisa científica começa com uma “narrativa”, uma teoria ou hipótese. Estas são abandonadas se os testes empíricos e de validação científica ou experimental não a confirmarem. A estatística e a análise de dados se converteram em poderosos auxiliares nesta tarefa. Os bancos de dados são imensos e os algoritmos e a Inteligência Artificial hoje são poderosos instrumentos da pesquisa científica.

Nos doutorados, entretanto, se revelam os picaretas. Existe uma multidão de teses de doutorado em que os dados são “marretados” para comprovar as teses mais esdrúxulas. São teses fraudadas. 

Na verdade, como o mundo da imaginação criativa, da explicação racional e da lógica é poderoso, os verdadeiros cientistas são os que vivem em paz com os dados empíricos e com os fatos. 

Alguns entram em crise, se desesperam e, mesmo, se revoltam, quando não conseguem comprovar as teses de sua imaginação com os dados empíricos. 

Se picaretas, desonestos ou mentirosos, fraudam suas teses. Se existem muitos desses “doutores” por aí, entretanto, logo depois da titulação enfiam suas teses no fundo das gavetas porque não servem para nada.

Esse é o campo da epistemologia, que trata da forma de se adquirir conhecimento, que confronta as narrativas da imaginação racional com os dados empíricos e com os fatos reais.

Ora, e as narrativas fake? Essas sim, são narrativas intencionalmente mentirosas! Infelizmente entraram na moda. Creio que combatê-las é indispensável! É mesmo uma questão de saúde pública e mental, não apenas política, seja no plano individual como social.

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(*) Jornalista, artista, desenhista, chargista e cartunista; aposentado da Universidade Federal de Viçosa, MG.