domingo, 8 de março de 2020

Ditadura nunca mais!

A chave para a compreensão de como Bolsonaro se movimenta politicamente é a sua permanente ação para manter unidos os bolsonaristas de raiz, os que são de extrema-direita como ele. São facilmente identificáveis: defendem regimes autoritários ou ditaduras de direita; estão propondo, neste instante, o fechamento do Congresso e do STF; não têm qualquer apreço pelo Estado Democrático de Direito. São a sua base firme. Notabilizam-se por defender milícias e greves inconstitucionais de PMs. Proclamam estar a postos, seja para ameaçar as instituições democráticas ou, mesmo, para reeleger Bolsonaro em 2022.

Bolsonaro fez uma troca. Preferiu ficar com esses fiéis radicais, a manter o apoio da maioria dos seus eleitores, os democratas que votaram nele para impedir que o PT voltasse ao governo. Claro, estes são muito abstratos, pois não os vê quando frequenta a porta dos quartéis para fazer suas panfletagens!

Manifestação de mulheres lutando contra a censura durante a ditadura militar. Hoje, domingo, 8 de março de 2020, comemora-se o Dia Internacional da Mulher
Ofereceu a cabeça de Moro, a quem traiu, tal como os rabos-presos lhe pediram. Tentou lhe retirar a Segurança Pública (o que só não o fez porque suas bases reagiram) e, se pudesse, já o teria mandado embora. Empenha-se, exercendo sua autoridade, em desmoralizar a Moro; ao tolher a sua ação, abandonou a luta contra a corrupção e a impunidade para proteger o seu clã; em sua mediocridade, o vê apenas como um concorrente, e mostra-se enciumado com sua popularidade. Felizmente Moro não perde o foco e tem uma paciência infinita!

Tem pago custos altos por isso: rachou com o PSL; demitiu o Bebbiano e o Gal Santos Cruz; rompeu com a Joice Hasselmann; perdeu parte de sua base parlamentar e recebe críticas de pessoas influentes  que antes lhes eram simpáticas, tal como a Janaina Paschoal; em consequência, vê a sua base democrática na sociedade diluir-se, como constatado pelas pesquisas de opinião. Parece não se importar em perde-los.

Ao convocar a manifestação do dia 15/03, já está provado que não foi porque não pudesse acertar os ponteiros com o Congresso em torno de questões orçamentárias, pois já negociou uma solução. Mas nega, convenientemente, essa pacificação, pois joga no confronto e na radicalização.

Na verdade, a manifestação tem como objetivo dar um tranco no Congresso e no STF e impor uma nova ordem. Apoia-se nos que defendem e querem uma ditadura. Tenta recuperar a iniciativa que julga ter perdido em busca de mais poderes, pois já há algum tempo, em sua louca paranóia, vê-se cercado de inimigos e acuado.

Faltando-lhe a visão de estadista, quer resolver “no pau”, em confronto de rua, o que não pode vencer com estratégia, planejamento, política e exercício digno dos imensos poderes constitucionais que um presidente tem, e em harmonia com os demais poderes.

Chama os seus radicais para um combate contra as instituições do Estado Democrático de Direito; passa longe de sua pauta propostas de reformas democráticas, e não vê as manifestações cívicas como formas pacíficas de aperfeiçoa-las, mas como instrumentos de força para subjuga-las como se tivessem que decidir com um fuzil apontado para suas cabeças; tudo o que conseguem propor é um Estado miliciano baseado na intolerância e na violência!

Se posicionariam o presidente, e os seus filhos Flavio e Eduardo Bolsonaro, nesta manifestação, a favor da prisão em 2ª instância? Claro que não, isto já saiu da pauta dos membros do seu clã!

Pensa ter apoio militar para isso, e não lhe faltam os puxa-sacos, como o Gal Heleno. Mas, se esse jogo de risco der errado, e se os generais não lhe derem apoio, como já está acontecendo com seus eleitores democratas, ele terá somado vigorosos pontos para a auto-desmoralização e para uma irrecuperável perda de confiança dentre os brasileiros.

O mais importante é que não podemos ficar passivos diante desses ataques ao Estado Democrático de Direito. Se fecharmos os olhos, por covardia, ingenuidade ou condescendência, estaremos deixando que cresça um monstro que poderá destruir a democracia tão duramente conquistada.

Desejamos isso para o Brasil? Claro que não! É necessário, portanto, que o presidente tenha compostura!

terça-feira, 3 de março de 2020

Carta aos democratas que votaram em Bolsonaro

Prezados eleitores democratas de Bolsonaro,

Permitam-me abrir uma discussão com vocês. Observem que não me considero dono da verdade e não me arrogo trazer para vocês certezas absolutas, pois o futuro é sempre cercado de incertezas. Além disso, em momentos de crise aumenta a imprevisibilidade. Se não existissem já muitos fatores que aumentam essas incertezas, some-se, ainda, as trazidas pela pandemia do coronavírus.

Passeata dos 100 mil, em 26 de junho 1968 no Rio de Janeiro. Foi a primeira manifestação de massas contra a ditadura militar. Ocorreu espontaneamente no dia seguinte ao assassinato do estudante secundarista Edson Luís durante repressão da PM no restaurante estudantil do Calabouço (*). 
Em primeiro lugar, permitam-me dizer que não podemos confundir os eleitores de Bolsonaro com o próprio Bolsonaro, pois, como verão, movem-se com lógicas diferentes.

Dele já sabemos, não porque eu queira isso, mas porque o seu pensamento político é um dos mais bem documentados por suas palavras e ações, que Bolsonaro é de extrema-direita e que tem um verdadeiro fascínio pelos ditadores e pelas ditaduras.

Mas pensam assim todos os seus eleitores? Uma parte sim, a estes eu denomino de “bolsonaristas de raiz”, pois o têm como líder e o merecem. São todos deste tipo? Acho que não, estes são apenas a minoria dos seus eleitores.

A maioria dos seus eleitores são democratas, que votaram nele para garantir a alternância do poder e para impedir que o PT voltasse ao governo.

Democratas, tenham votado ou não em Bolsonaro, não defendem ditaduras e somente querem viver em um Estado Democrático de Direito.

Então, qual o problema da manifestação do dia 15/03? Em primeiro lugar ela não está sendo convocada pelos democratas, mas por Bolsonaro e pelos bolsonaristas de raiz. Em segundo lugar, o seu objetivo é “enquadrar” duas instituições do Estado de Direito, o Congresso e o STF; não para pressiona-las para que apoiem pautas éticas, como a prisão em 2ª instância, ou para aperfeiçoa-las enquanto instituições democráticas, mas para submete-las ao arbítrio do poder executivo.

Vamos ser francos, essa manifestação é para dar mais poderes discricionários ao presidente Bolsonaro! Existiria algum impasse entre o Poder Executivo e os poderes Legislativo e Judiciário que não possa ser resolvido por meio da negociação? Claro que não!

Apenas concepções que não conseguem conviver com os valores da democracia acham isso impossível!

Todos os democratas sabemos que este é o objetivo da manifestação. E sabem disso, em primeiro lugar, os que estão convocando a manifestação! Mas, para surpresa de todos são, exatamente, os primeiros a negá-lo!

Claro, isso é muito estranho! Por isso, caros amigos, esses são os meus argumentos para que os democratas - todos, de todos os matizes - fiquem longe dessa manifestação! O sagrado direito de estar nas ruas, de protestar e de manifestar-se carece de qualquer legitimidade se for para romper com o valor maior do Estado Democrático de Direito!


Carlos Alberto Torres
3 de março de 2020

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(*) Tive a honra de participar desse evento histórico quando cursava o 3º ano do Curso de Engenharia da UFRJ.

O desmonte do combate à corrupção

Este material foi postado por Deltan Dallagnol em sua página no Facebook. Eu o reproduzo aqui pois é uma  referência importante para os que reconhecem o caráter democrático da luta contra a impunidade.

Sem dúvida o Congresso Nacional e o STF, em aliança com Bolsonaro, têm sido responsáveis pelos retrocessos ocorridos no combate à impunidade. Esses retrocessos têm ocorrido por decisões legislativas e do STF com poder normativo.

Bolsonaro, por sua vez, faz cara de paisagem e atua continua e decisivamente para limitar a ação do ministro Sergio Moro. Sua intenção é retirar-lhe todo o poder de promover o aperfeiçoamento das instituições jurídicas democráticas para a luta contra o crime. Somente não mandou Moro embora porque não quis pagar o desgaste que isso acarretaria em suas próprias bases. Mas, passo a passo, vai tentando enfraquece-lo. No outro dia, quase retirou a Segurança Pública do seu ministério, no mais absurdo acordo - com sabor de traição - com alguns Secretários de Segurança Estaduais, inclusive do PT. Consta que sua intenção é recriar o Ministério da Segurança Pública e nomear como ministro o seu amigo da bancada da bala, o Cel Alberto Fraga da PM/DF.

Deltan Dallagnol:

"Desde o início de fevereiro, tenho publicado uma série de artigos na Gazeta do Povo sobre o Desmonte do Combate à Corrupção (veja o primeiro link abaixo). O que está acontecendo causa indignação. Estou trazendo informações para que a sociedade conheça os problemas e as possíveis soluções e se envolva na discussão. Vou compartilhar aqui em sequência os links para que você possa acompanhar:

O desmonte do combate à corrupção


Nova lei de abuso de autoridade prejudica o combate à corrupção


A colaboração premiada e o combate à corrupção sob ameaça


Juiz de garantias: o que você precisa saber


A regra de que os réus delatados falem por último causa quanta demora e impunidade?


Anulado processo de Pasadena, a refinaria que enterrou bilhões de reais