terça-feira, 23 de maio de 2017

Estadão: A delação que é um escândalo

Nestes dias temos ouvido tudo o que as organizações Globo têm desejado dizer - por seus editoriais e pela boca de seus repórteres e comentaristas - referentes às graves acusações que pesam contra o presidente Temer desde que o seu colunista Lauro Jardim divulgou o teor da gravação clandestina que o empresário Joesley Batista fez na noite de 07/05/17, 22:40h.

Entretanto, é necessário que se diga com coragem, contra todas as conveniências políticas e oportunismos, que as circunstâncias que cercam as graves denúncias que pesam contra o presidente Temer exigem cautela de todos os brasileiros.

O Estadão assumiu outra posição. Pelos interesses que representa, neste episódio claramente divergentes dos da Globo, torna-se relevante a sua opinião, que foi  divulgada no editorial de hoje, dia 23/05/17, terça-feira.


O Estado de S.Paulo 
Editorial. 23 Maio 2017 | 03h13 (*)

O vazamento da delação de Joesley Batista na semana passada deixou uma vez mais o País profundamente consternado, ao envolver em ações criminosas graduados personagens da vida nacional, a começar pelo presidente da República, Michel Temer. Surpreende que denúncias tão graves tenham sido divulgadas – assumindo, assim, ares de veracidade – sem que nada do que delas consta, e tampouco as circunstâncias que envolvem os fatos, tenha sido averiguado previamente. Tal açodamento foi, no mínimo, irresponsável. Haja vista as consequências da divulgação nos campos político, econômico e financeiro. 


A delação do empresário da JBS é escandalosa, e não apenas pelos crimes relatados. As histórias que a cercam são de enorme gravidade, indicando, no mínimo, o pouco cuidado com que se tratou um material com enorme potencial explosivo para o País. 

Em primeiro lugar, causa escândalo o fato de que a principal notícia vazada na noite de quarta-feira passada não foi confirmada e, mesmo assim, o Ministério Público Federal (MPF) não fez qualquer retificação. Foi afirmado que um áudio gravado por Joesley Batista provava que o presidente Michel Temer havia dado anuência à compra do silêncio de Eduardo Cunha e de Lúcio Funaro. Ainda que a conversa apresentada seja bastante constrangedora para o presidente Michel Temer pelo simples fato de ter sido travada com alguém da laia do senhor Joesley Batista, das palavras ouvidas não se comprova a alegada anuência presidencial. Ou seja, aquilo que tanto rebuliço vem causando na vida política e econômica do País desde a semana passada não foi comprovado e, pelo jeito, não o será, pelo simples fato de não existir. 

Como o Broadcast – serviço de notícias em tempo real da Agência Estado – revelou no sábado passado, a gravação da conversa entre Joesley Batista e Michel Temer no Palácio do Jaburu não foi periciada antes de ser usada no pedido de abertura de inquérito contra o presidente. Ou seja, nem mesmo essa medida de elementar prudência foi adotada pelo Ministério Público Federal. Em razão de a denúncia envolver altas personalidades, seria curial dar os passos processuais com extrema segurança, até mesmo para evitar eventual nulidade da ação e consequente impunidade dos eventuais culpados. Tudo indica, no entanto, que o principal objetivo do MPF era obter notoriedade, e não fazer cumprir a lei. 

A fragilidade da delação de Joesley Batista não se esgota nesses pontos. De forma um tanto surpreendente, o MPF não apresentou denúncia contra o colaborador, como se a revelação dos supostos crimes cometidos pelo presidente da República e por outros nomes importantes da vida nacional fosse suficiente para remir a pena do criminoso confesso. Trata-se de evidente abuso, a merecer pronta investigação da Justiça. Se, como o MPF denuncia, os crimes foram tão graves e abrangem toda a política nacional, é um grave e escandaloso erro – para dizer o mínimo – conferir perdão a quem os perpetrou e lucrou abundantemente. Note-se que a lei proíbe que se dê imunidade aos líderes de organização criminosa. Não seria essa a função dos senhores Joesley e Wesley Batista nos acontecimentos em questão? 

Além disso, até o momento não foi apresentada uma possível razão que justificasse o procedimento seguido pelo MPF e pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em relação à delação de Joesley Batista. Como não estava ligado à Operação Lava Jato, o caso deveria ter sido distribuído por sorteio, e não encaminhado diretamente ao ministro Edson Fachin. 

A delação de Joesley Batista ainda expõe o Ministério Público em dois pontos muito sensíveis. O delator contou que o procurador Ângelo Goulart Villela, mediante pagamento de R$ 50 mil mensais, era seu informante dentro do MP. Ora, tal fato leva a checar com lupa todos os passos do empresário nesse processo de colaboração. Além disso, um procurador da República, que atuava muito próximo a Rodrigo Janot, deixou a Procuradoria-Geral da República (PGR) para trabalhar no escritório que negocia com a própria PGR os termos da leniência do Grupo JBS. Tudo isso sem cumprir qualquer quarentena. 

Ansiosamente, o País espera que avance o combate à corrupção. Tal avanço deve ser feito, porém, de forma menos descuidada. 

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segunda-feira, 22 de maio de 2017

Temer x Joesley: Uma briga de quadrilhas?

Vivemos, os cidadãos, como que em meio ao tiroteio de uma briga de quadrilhas. A gravação clandestina do presidente Temer, é preciso que se diga, foi exatamente um momento agudo deste confronto.

Ainda não presenciamos mortes diretas; afinal, são criminosos de colarinho branco, mas milhões de brasileiros inocentes, indiretamente, já sucumbiram com as balas perdidas!

Não estamos mais indefesos! Se éramos ingênuos e desinformados, não o somos mais. Agora, após a Lava-Jato, já sabemos sobre o papel da corrupção no financiamento da conquista e da manutenção do poder político.

Se, para nos esclarecer, já não nos bastassem as delações da Odebrecht e de outras das maiores empreiteiras brasileiras, agora, as delações dos irmãos Batista, da J&F Participações (*) (que inclui a JBS), retirou de diante dos nossos olhos a cortina da inocência!

Não podemos mais nos recusar a encarar a realidade!

Certamente, essa briga não nos é indiferente. Ela está lesando e paralisando o Brasil. Mas não serão medidas paliativas que irão paralisar a roubalheira. Não queremos apenas apartá-la para que tudo pareça, em seguida, ter voltado à normalidade.

Precisamos começar a praticar uma verdadeira radicalidade democrática e republicana para que não haja espaço para a impunidade dos crimes de colarinho branco!

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(*) Em campanha contra nossa ingenuidade coletiva:

Abaixo está um conjunto de matérias referentes à relação de Henrique Meireles com a J&F, holding que tem a JBS como uma de suas empresas. Certamente, se você tem como critério a busca de fatos, provas e evidências para se posicionar, encontrará muitas outras matérias de qualidade. Mas, os links abaixo já serão um bom início.

Sobre Henrique Meireles, não custa lembrar que ele hoje é o poderoso ministro da fazenda e da economia do governo Temer; também foi o poderoso presidente do Banco Central durante os dois governos Lula; em março de 2012 assumiu a poderosa presidência da J&F Participações. 
  1. http://exame.abril.com.br/revista-exame/o-preco-de-henrique-meirelles/amp/;
  2. http://www.revistaforum.com.br/2016/07/01/henrique-meirelles-era-o-todo-poderoso-da-jf-no-periodo-investigado-pela-pf/;
  3. http://agenciabrasil.ebc.com.br/amphtml/politica/noticia/2016-07/meirelles-descarta-ligacao-com-empresas-do-grupo-jbs-friboi;
  4. http://amp.valor.com.br/empresas/2554002/henrique-meirelles-assume-cargo-no-grupo-jf;
  5. http://m.economia.estadao.com.br/noticias/geral,henrique-meirelles-assume-conselho-da-holding-do-jbs-imp-,844104.amp;
  6. https://pt.m.wikipedia.org/wiki/J%26F_Investimentos.
Fico por aqui. Certamente, o buraco é mais embaixo. Meireles, certamente, também, nada sabia sobre as propinas pagas e sobre os empréstimos de pai-para-filho do BNDES às empresas, etc..

sábado, 20 de maio de 2017

Temer: - Meu governo, senhores, tem rumo!

Temer fez o seu segundo pronunciamento hoje, 20/05/17, sábado, após a divulgação da gravação feita pelo empresário Joesley Batista, de diálogo seu com o presidente Temer, em que, dentre outras coisas comprometedoras, este teria avalizado uma "mesada" ao ex-deputado cassado Eduardo Cunha, que encontra-se atualmente preso em Curitiba.

No dia de ontem (19/05/17) vivemos o constrangimento de ver e ouvir, a vivo e a cores, as gravações das delações de Joesley Batista, um jovem empresário, a quem poucos sequer conheciam o seu nome ou feição. Mas, ele é um dos proprietários da JBS, a 2ª maior empresa do país em faturamento.  Apresentou-se muito à vontade, demonstrando arrogância, despudor, desfaçatez e uma "pontinha" de orgulho pelo seu poder sobre os políticos, revelando que pagou propina, com todas as letras, a 1829 candidatos de 29 partidos!

Claramente, nós, os brasileiros, cansados da irresponsabilidade, da corrupção e da impunidade, não as aceitamos mais, muito menos de presidentes da república. Por isso Dilma foi afastada, e Temer também deverá ser, se cometeu crime que o incompatibilize com o cargo!

Entretanto, é necessário que se diga com coragem, contra todas as conveniências políticas e oportunismos, que as circunstâncias que cercam as graves denúncias que pesam contra o presidente Temer exigem cautela de todos os brasileiros.

Elas precisam ser rigorosamente apuradas, para que não afundemos ainda mais o país na crise sem motivo justificado. Já vivemos uma grave crise ética, social e econômica, e estes acontecimentos nos remetem, agora, a uma grave crise institucional. As incertezas quanto ao futuro cresceram vertiginosamente.

A justiça tem os mecanismos para desfazer rapidamente as duvidas que cercam a já sabida edição feita na fita da gravação da conversa entre o presidente Temer e o empresário Joesley Batista feita na noite de 08/03/17 no palácio do Jaburu. Outras questões, que também preocupam a todos, relacionam-se ao tratamento especial concedido pela PGR aos criminosos confessos, em particular a Joesley Batista e a Wesley Batista, referentes à tramitação super-rápida do processo de colhimento de suas confissões, à homologação de suas delações premiadas pelo ministro Fachin, e à sua liberação para que viajassem para o exterior e fixassem residência nos EUA. 



Íntegra do pronunciamento do presidente Temer:

"Muito bem, eu quero cumprimentá-los a todos e dizer, que mais uma vez eu estou aqui para fazer uma declaração aos senhores e as senhoras, jornalistas e ao povo brasileiro.

Eu registro que eu li hoje notícia do jornal Folha de São Paulo de que perícia constatou que houve edição no áudio de minha conversa com o senhor Joesley Batista. Essa gravação clandestina, é o que diz, foi manipulada e adulterada com objetivos nitidamente subterrâneos. Incluída no inquérito sem a devida e adequada averiguação, levou muitas pessoas a um engano induzido e trouxe grave crise ao Brasil.

Por isso, no dia de hoje, estamos entrando com petição no colendo Supremo Tribunal Federal para suspender o inquérito até que seja verificada em definitivo a autenticidade da gravação clandestina.

O autor do grampo está livre e solto passeando pelas ruas de Nova York. O Brasil, que já tinha saído da mais grave crise econômica da sua história, vive agora, sou obrigado a reconhecer, dias de incerteza. Ele não passou nem um dia na cadeia. Não foi preso, não foi julgado, não foi punido. E, pelo jeito, não será.

Cometeu, digamos assim, o crime perfeito.

Graças a essa gravação fraudulenta e manipulada, especulou contra a moeda nacional. A notícia foi vazada, seguramente, por gente ligada ao grupo empresarial, e antes de entregar a gravação, comprou um bilhão de dólares, porque sabia que isso provocaria o caos no câmbio. Por outro lado, sabendo que a divulgação da gravação também reduziria as ações de sua empresa, as vendeu antes da queda da bolsa. Não são palavras minhas apenas, esses fatos já estão sendo apurados pela Comissão de Valores Mobiliários.

A JBS, meus senhores e minhas senhoras, lucrou milhões e milhões de dólares em menos de 24 horas. Esse senhor, nos dois últimos governos, teve empréstimos bilionários no BNDES para fazer avançar os seus negócios. Prejudicou o Brasil, enganou os brasileiros e agora mora nos Estados Unidos. 

Quero, aqui, observar a todos vocês aquilo que alguns da imprensa já notaram: as incoerências entre o áudio e o teor de seu depoimento. Isso compromete a lisura de todo o processo por ele desencadeado.

O que ele fala em seu depoimento não está no áudio. E o que está no áudio demonstra que ele estava insatisfeito com meu governo. Reclamações contra o Ministro da Fazenda, contra o Cade, contra o BNDES. Essa é a prova cabal, de que meu governo não estava aberto a ele. E no caso, convenhamos, no caso central de sua delação, fica patente o fracasso de sua ação. O Cade não decidiu a questão solicitada por ele. O governo não atendeu a seus pedidos. Não se sustenta, portanto, a acusação pífia de corrupção passiva.

E não foi só o Cade. O BNDES mudou no meu governo. A presidente Maria Sílvia moralizou o BNDES. Botou ordem na casa. E tem meu respeito e meu respaldo para fazê-lo! Assim como Pedro Parente o fez na Petrobras. Estamos acabando com os velhos tempos das facilidades aos oportunistas. E isso, meus amigos incomoda muito. Há quem queira me tirar do governo para voltar aos tempos em que faziam tudo o que queriam com o dinheiro público e não prestavam contas a ninguém. Quebraram o Brasil e ficaram ricos.

O autor do grampo relata, no diálogo que tivemos, suas dificuldades. Simplesmente a ouvi. Nada fiz para que ele obtivesse benesses do governo. Não há crime, meus amigos, em ouvir reclamações e me livrar do interlocutor indicando outra pessoa para ouvir suas lamúrias. E confesso que eu ouvi à noite como ouço muitos empresários, políticos, trabalhadores, intelectuais e pessoas de diversos setores da sociedade brasileira. No Palácio do Planalto, no Jaburu, no Alvorada e em São Paulo.

Trabalho, acho que os senhores sabem, rotineiramente até meia noite ou mais. E falo até com pessoas da imprensa, com pessoas da imprensa já falei em horas avançadas. Muitos sabem disso porque falavam comigo ao telefone ou até pessoalmente. Nada demais há nisso.

Mas é bom ouvir com atenção o que dizem as pessoas. E muito do que foi dito nos depoimentos dos senhores Joesley e Ricardo provam apenas falta de sintonia, abundante divergência. O primeiro fala em buscar uma forma de interlocução comigo, pois não a tinha. Já o segundo fala que era meu interlocutor frequente em nome do grupo. Há muitas mentiras espalhadas em seu depoimento.

Lembrem da acusação de que eu dera aval para comprar o silêncio de um ex-deputado. Não existe isso na gravação, mesmo tendo sido ela adulterada. E não existe porque nunca comprei o silêncio de ninguém. Não obstruí a Justiça porque não fiz nada contra a ação do Judiciário.

Falo, aqui só de um dos pontos de contradição e incoerência. Ou seja, houve falso testemunho à Justiça. Chegam ao desplante de me atribuir falas, frases, ou senhas ou palavras chulas que jamais cometeria. Atentam contra meu vocabulário e minha inteligência.

Tenho crença nas instituições brasileiras e nos seus integrantes. Devo até registrar, devo até registrar, que é interessante quando os senhores examinam os seu depoimento e o áudio, os senhores verificam que a conexão de uma sentença a outra, não é conexão de quem diz: olhe eu estou comprando o silêncio de um ex-deputado e estou dando tanto a ele. Não! A conexão é com a frase: “eu me dou muito bem com o ex-deputado, mantenho uma boa relação”, e eu disse: mantenha isso, viu? Enfatizou muito, o viu.

E por isso mesmo eu devo dizer que, não acreditei na narrativa do empresário de que teria segurado juízes, etc. Ele é um conhecido falastrão, exagerado. Aliás, depois, em depoimento, podem conferir, disse que havia inventado essa história, que não era verdadeira, ou seja, era fanfarronice que ele utilizava naquele momento.

Eu quero pontuar que houve grande planejamento para realizar esse grampo. Depois, houve uma montagem e uma ação deliberada para criar um flagrante que incriminasse alguns, enquanto os criminosos fugiam para o exterior em absoluta segurança.

O Brasil, meus senhores, exige que se continue no caminho da recuperação econômica que traçamos para colocar o país nos trilhos. Já recuperamos o PIB, acabamos com a recessão, reduzimos a inflação, derrubamos a taxa de juros, estamos gerando empregos e liberamos mais de 40 bilhões de reais para os trabalhadores brasileiros. Estamos completando as reformas para modernizar o Estado brasileiro.

Meu governo, senhores, tem rumo! Acho que os senhores e as senhoras são testemunhas deste fato, e sabem que o que foi dito, volto a dizer, no áudio, que de resto está sendo impugnado por eventuais, ouso até mencionar que houve mais de 50 edições desse áudio, tentar macular não só a reputação moral do Presidente da República, mas tenta invalidar o nosso país. Mas eu digo com toda segurança: o Brasil não sairá dos trilhos. Eu continuarei à frente do governo.

Muito obrigado."

quinta-feira, 18 de maio de 2017

Temer com a palavra: - Não renunciarei, repito, não renunciarei!

Reportagem publicada no site do jornal "O Globo", na coluna do jornalista Reinaldo Jardim, nesta quarta (17/05/17) (*) informou que Joesley Batista entregou à Procuradoria Geral da República (PGR) gravação de conversa na qual ele e Temer falaram sobre a compra de silêncio do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), preso na Operação Lava Jato (do G1, hoje, 18/05/17).

Aconselhado a renunciar por alguns de seus ministros, inclusive por Roberto Freire, ministro da cultura, Temer fez nesta tarde, 18/05/17, pouco após as 16:00h, o pronunciamento em sua defesa, em que afirma que não renunciará, aqui transcrito na íntegra em vídeo e texto. A história o julgará.

Me permito declarar que não temos nada a comemorar. A crise se aprofunda e os principais prejudicados são a maioria de nosso povo mais simples. Somos todos responsáveis por não termos tido até agora a capacidade e a coragem de construir uma democracia intolerante com a corrupção e com a impunidade dos crimes de colarinho branco. É hora de reagir. 




Leia abaixo a íntegra do pronunciamento de Michel Temer: 

Olha, ao cumprimentá-los, eu quero fazer uma declaração à imprensa brasileira e uma declaração ao País. E, desde logo, ressalto que só falo agora - os fatos se deram ontem - porque eu tentei conhecer, primeiramente, o conteúdo de gravações que me citam. Solicitei, aliás, oficialmente, ao Supremo Tribunal Federal, acesso a esses documentos. Mas até o presente momento não o consegui.

Quero deixar muito claro, dizendo que o meu governo viveu, nesta semana, seu melhor e seu pior momento. Os indicadores de queda da inflação, os números de retorno ao crescimento da economia e os dados de geração de empregos, criaram esperança de dias melhores. O otimismo retornava e as reformas avançavam, no Congresso Nacional. Ontem, contudo, a revelação de conversa gravada clandestinamente trouxe volta o fantasma de crise política de proporção ainda não dimensionada.

Portanto, todo um imenso esforço de retirar o País de sua maior recessão pode se tornar inútil. E nós não podemos jogar no lixo da história tanto trabalho feito em prol do País. Houve, realmente, o relato de um empresário que, por ter relações com um ex-deputado, auxiliava a família do ex-parlamentar. Não solicitei que isso acontecesse. E somente tive conhecimento desse fato nessa conversa pedida pelo empresário.

Repito e ressalto: em nenhum momento autorizei que pagassem a quem quer que seja para ficar calado. Não comprei o silêncio de ninguém. Por uma razão singelíssima: exata e precisamente porque não temo nenhuma delação, não preciso de cargo público nem de foro especial. Nada tenho a esconder, sempre honrei meu nome, na universidade, na vida pública, na vida profissional, nos meus escritos, nos meus trabalhos. E nunca autorizei, por isso mesmo, que utilizassem o meu nome indevidamente.

E por isso quero registrar enfaticamente: a investigação pedida pelo Supremo Tribunal Federal será território, onde surgirão todas as explicações. E no Supremo, demonstrarei não ter nenhum envolvimento com esses fatos.

Não renunciarei, repito, não renunciarei! Sei o que fiz e sei da correção dos meus atos. Exijo investigação plena e muito rápida, para os esclarecimentos ao povo brasileiro. Esta situação de dubiedade ou de dúvida não pode persistir por muito tempo. Se foram rápidas nas gravações clandestinas, não podem tardar nas investigações e na solução respeitantemente a estas investigações.

Tanto esforço e dificuldades superadas, meu único compromisso, meus senhores e minhas senhoras, é com o Brasil. E é só este compromisso que me guiará.

Muito obrigado. Muito boa tarde a todos.


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(*) https://m.oglobo.globo.com/brasil/dono-da-jbs-grava-temer-dando-aval-para-compra-de-silencio-de-cunha-21353935

Pós-escrito (20/05/17):
De-gravação (na íntegra) do comprometedor diálogo entre o presidente Temer e Joesley Batista. Publicado na Folha e S.Paulo em 19/05/17:
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/05/1885414-leia-na-integra-a-conversa-entre-o-presidente-temer-e-joesley-batista.shtml




terça-feira, 16 de maio de 2017

Como decidem juízes imparciais?

Deve um juiz, ao decidir o seu voto, ponderar, além dos fatos, provas e evidências contidos nos autos do processo, também as consequências políticas de sua sentença?


A doutrina preponderante é de que não, de que o juiz não deve considerar a conveniência política subjetiva de sua decisão. Por duas razões fundamentais:
  1. se o fizer, um criminoso pode ser absolvido;
  2. se o fizer, um inocente pode ser condenado.
Filio-me a esta corrente, por estar convencido de que no Estado Democrático de Direito esta é uma premissa da credibilidade da justiça.

Em tese, somente em ditaduras são absolvidos criminosos e condenados inocentes.

Mas, sejamos sinceros, no Brasil, historicamente, prepondera a impunidade para os poderosos (*), os famosos criminosos de colarinho branco, sempre defendidos por bons e caros advogados.

Se queremos, realmente, viver em uma democracia, ninguém pode estar acima da lei!

Enquanto isso, passamos a maior parte do tempo - entre duas ondas de rebeliões nos presídios - insensíveis ao fato de que enchemos a cadeia de pretos, pobres e miseráveis, sendo que muitos estão lá sem sequer serem condenados.

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(*) Pós-escrito (17/05/17).

I. Duas posturas, impossível não comparar:

(1) a de Gilmar Mendes, ministro do STF, exercendo atualmente a presidência do STE. Entre os dias 06 e 08 de junho comandará o julgamento que pede a cassação da chapa Dilma-Temer;

(2) a de Sergio Moro, juiz federal de 1ª instância, da 13.ª Vara Criminal Federal de Curitiba. Até o final de junho dará a sentença relativa à denúncia do Ministério Público Federal contra Lula, que lhe imputa prática de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro; em particular, refere-se à ampliação, reforma e decoração de um triplex e o custeio do armazenamento de bens, “benesses” que teria recebido em troca de negócios na Petrobras.

Ambos os juizes protagonizarão julgamentos cujas consequências, importantíssimas para o futuro do país, estão cercadas de incertezas.

Quem, com o seu exemplo, honrará a magistratura e contribuirá para o aperfeiçoamento da democracia brasileira?

II. Os dois Brasis que presenciaremos nesses dois julgamentos:

Trabalho com possibilidades, contemplando as expectativas apresentadas nas análises mais frequentes que tenho tido a oportunidade de conhecer.

No julgamento da chapa Dilma-Temer preponderarão as ponderações de caráter político para que Temer não seja cassado. Os argumentos políticos são abundantes, particularmente o de que essa será a melhor alternativa para superar a crise econômica e social. Consta ser essa, já, a posição de Gilmar Mendes e a da maioria do TSE. Naturalmente, argumentos jurídicos serão encontrados para dourar a pílula, mas não serão estes que importarão, até mesmo porque serão apenas para consumo de ocasião. Mas, alto lá, e os fatos emanados das delações premiadas demonstrando exaustivamente que a campanha da chapa foi financiada com recursos ilícitos via caixa dois?

No julgamento de Lula preponderarão as ponderações de caráter jurídico na provável condenação de Lula. Os fatos, provas e evidências são abundantes, particularmente porque as operações simbolizadas pela Lava-Jato desnudaram perante a nação o papel da corrupção, no Brasil, para a conquista e manutenção do poder político. Certamente, o PT não é o único responsável pela corrupção sistêmica na política; exatamente por isso, alguns dos maiores lideres do PMDB e do PSDB, e de outros partidos, serão igualmente penalizados.

III. O que fazer?

Se esses previsíveis resultados se concretizarem estaremos ainda em dívida com um projeto de Brasil mais democrático, livre da impunidade, e que não pode mais ser adiado. Muitos brasileiros que apoiarão a não cassação de Temer estarão apoiando a condenação de Lula e muitos brasileiros que estarão apoiando a cassação de Temer estarão apoiando a absolvição de Lula. Até que ponto os seus critérios não correspondem a valores democráticos de ocasião?

E como ficarão as dezenas de milhões de brasileiros, sem poder de decisão, mas que apenas assistem, perplexos, a essas tão contraditórias formas de decidir o destino do país?

Dois pesos e duas medidas? Brasileiros acima da lei? Alguma coisa continuará errada! E muito errada! Estaria faltando, a todos nós, coragem para promover as reformas radicalmente democráticas e republicanas necessárias?

sexta-feira, 28 de abril de 2017

A greve geral do estertor do sindicalismo pelego

Precisamos, os democratas de todos os matizes, de objetivos claros.

A greve geral convocada para hoje (28/04/17) é um equívoco. O seu objetivo fundamental não é resistir às mudanças em andamento nas reformas trabalhista e previdenciária; este é apenas um objetivo de agitação, como “surfar” numa boa onda. É preciso que se diga, o seu objetivo estratégico é viabilizar a candidatura de Lula em 2018, impedindo que ele seja condenado e pague por seus crimes.


O governo Temer - com os seus ministros enrolados - representa bem o sistema de poder político que afundou o país nesta profunda crise. As suas raízes são essencialmente políticas e éticas. Estes são os elementos de continuidade com os governos do PT, os quais o PMDB apoiou, e com os quais se locupletou em sua particular forma fisiológica e patrimonialista de se acercar do poder.

Mas, é preciso que se diga, existem no governo Temer elementos de ruptura com o passado: (1) para chegar em 2018, dentro das premissas do Estado Democrático de Direito, não existe melhor alternativa para os brasileiros, incluídos trabalhadores, empresários e aposentados; (2) As medidas severas no plano fiscal, já encaminhadas, são a base para a recuperação da economia; (3) as complexas reformas trabalhista e previdenciária em votação tornaram-se uma necessidade inadiável, e vêm sendo defendidas desde os governos do PT como indispensáveis.

Mas, por complexas, todas essas reformas, quem não tem dúvidas sobre as suas consequências?

Quanto à trabalhista, de alta sensibilidade, ela vem sendo feita, já, a conta-gotas desde os governos Lula e Dilma. Embora estes não tenham tido a coragem de assumi-la às claras, exatamente para não confrontar sua base sindical. Mas, se se for observar com atenção, desde os governos Lula se intensificou uma nova relação com o mundo empresarial, infelizmente promíscua, de um capitalismo de laços, para estabelecer novas relações de trabalho. 

Entretanto, muito além da esperteza, o que está em jogo é a necessidade de que surjam novas relações sociais de trabalho que correspondam aos avanços tecnológicos e ao objetivo de dinamizar a economia privada no campo e nas cidades. O fim da contribuição sindical obrigatória, p.ex., sempre foi uma proposta dos setores mais avançados da esquerda, e do sindicalismo, para torná-lo menos corporativista, pelego e corrupto. Agora, a própria CUT, majoritariamente petista, é a que mais resiste ao seu fim, e tem o desplante, para isso, em busca de aliados, de transformar Renan Calheiros em “guerreiro do povo brasileiro".

Quanto à reforma previdenciária, também Lula e Dilma já a vinham intentando. A sua questão central é a idade mínima de aposentadoria em suas diversas fórmulas. Esta não é apenas uma questão de qualidade de gestão, como a cobrança eficaz dos inadimplentes, ou os vazamentos provocados pela corrupção. Trata-se de como financiar a previdência em uma sociedade majoritariamente urbana onde as pessoas passaram a ter cada vez maior expectativa de vida.

O caminho mais concreto, neste momento, dado que essas reformas são indispensáveis para superar a crise, é usarem o legítimo e indispensável poder de pressão sindical para melhorar e emendar os projetos que estão em vias de serem aprovados. Mas, não, preferem queimar pneus e impedir que os trabalhadores mais simples e mais necessitados cheguem ao seu trabalho. Essa greve geral, condenada ao fracasso, apenas servirá para o maior isolamento político e social dos que a organizam e apoiam!

E não é surpresa que, enquanto a grande maioria dos brasileiros apoia a Lava-Jato, os organizadores da greve geral engrossam e tentam fortalecer a "santa aliança" dos que a temem e combatem. Preferem comprometer-se com objetivos inconfessáveis, que em nada contribuem para a superação da crise.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

O que diz Moro sobre o abuso de autoridade

Sergio Fernando Moro*
Artigo publicado em 25/04/2017, jornal O Globo


Independência judicial e abuso de autoridade

CURITIBA - As Cortes de Justiça precisam ser independentes. Necessário assegurar que os julgamentos estejam vinculados apenas às leis e às provas e que sejam insensíveis a interesses especiais ou à influência dos poderosos.

A independência dos juízes tem uma longa história. Na Idade Média, os juízes do rei se impuseram, inicialmente, às Cortes locais, estas mais suscetíveis às influências indevidas nos julgamentos. Sucessivamente, os juízes se tornaram independentes do próprio rei e, posteriormente, daqueles que o substituíram no exercício do poder central, o executivo ou o parlamento.

Nos Estados Unidos, a independência judicial foi definitivamente afirmada ainda no ano de 1805 com o fracasso da tentativa de impeachment do juiz Samuel Chase da Suprema Corte. O impeachment foi aprovado na Câmara dos Deputados, mas foi rejeitado no Senado. Tratava-se de tentativa do então presidente Thomas Jefferson, notável por outras realizações, de obter domínio político sobre a Suprema Corte. O célebre John Marshall, então juiz presidente da Suprema Corte, afirmou, sobre o episódio, que o impeachment tinha por base o equivocado entendimento de que a adoção por um juiz de uma interpretação jurídica contrária à legislatura tornaria-o suscetível ao impeachment. A recusa do Senado, mesmo pressionado pela Presidência, em aprovar o impeachment propiciou as bases da tradição de forte independência das Cortes norte-americanas e que é uma das causas da vitalidade da democracia e da economia daquele país.

No Brasil, a independência das Cortes de Justiça é resultado de uma longa construção, trabalho não de um, mas de muitos.

"A lei precisa de salvaguardas expressas para prevenir a punição do juiz"

Seria, porém, injustiça não reconhecer a importância singular de Rui Barbosa nessa construção.

Rui Barbosa é um dos pais fundadores da República. Foi o maior jurista e o mais importante advogado brasileiro. De negativo em sua história, apenas o seu envolvimento na política econômica do encilhamento, a confirmar o ditado de que bons juristas são péssimos economistas e vice-versa.

Rui Barbosa assumiu a defesa, no final do século XIX, do juiz Alcides de Mendonça Lima, do Rio Grande do Sul. O juiz, ao presidir julgamento pelo júri, recusou-se a aplicar lei estadual que eliminava o voto secreto dos jurados, colocando estes a mercê das pressões políticas locais.

O então presidente do Rio Grande do Sul, Júlio de Castilhos, contrariado, solicitou que fosse apurada a responsabilidade do “juiz delinquente e faccioso”. O tribunal gaúcho culminou por condená-lo por crime de abuso de autoridade.

Rui Barbosa levou o caso até o Supremo Tribunal Federal, através da Revisão Criminal nº 215.

Produziu, então, um dos escritos mais célebres do Direito brasileiro, “O Jury e a responsabilidade penal dos juízes”, no qual defendeu a independência dos jurados e dos juízes. Argumentou que um juiz não poderia ser punido por adotar uma interpretação da lei segundo a sua livre consciência. Com a sua insuperável retórica, afirmou que a criminalização da interpretação do Direito, o assim chamado crime de hermenêutica, “fará da toga a mais humilde das profissões servis”. Argumentou que submeter o julgador à sanção criminal por conta de suas interpretações representaria a sua submissão “aos interesses dos poderosos” e substituiria “a consciência pessoal do magistrado, base de toda a confiança na judicatura”, pelo temor que “dissolve o homem em escravo”. Ressaltou que não fazia defesa unicamente do juiz processado, mas da própria independência da magistratura, “alma e nervo da Liberdade”.

O Supremo Tribunal Federal acolheu o recurso e reformou a condenação, isso ainda nos primórdios da República, no distante ano de 1897.

Desde então sepultada entre nós a criminalização da hermenêutica, passo fundamental na construção de um Judiciário independente.

Passado mais de um século, o Senado Federal debruça-se sobre projeto de lei que, a pretexto de regular o crime de abuso de autoridade, contém dispositivos que, se aprovados, terão o efeito prático de criminalizar a interpretação da lei e intimidar a atuação independente dos juízes.

Causa certa surpresa o momento da deliberação, quando da divulgação de diversos escândalos de corrupção envolvendo elevadas autoridades políticas e, portanto, oportunidade na qual nunca se fez mais necessária a independência da magistratura, para que esta, baseada apenas na lei e nas provas, possa determinar, de maneira independente e sem a pressão decorrente de interesses especiais, as responsabilidades dos envolvidos, separando os culpados dos inocentes.

Ninguém é favorável ao abuso de autoridade. Mas é necessário que a lei contenha salvaguardas expressas para prevenir a punição do juiz — e igualmente de outros agentes envolvidos na aplicação da lei, policiais e promotores — pelo simples fato de agir contrariamente aos interesses dos poderosos.

A redação atual do projeto, de autoria do senador Roberto Requião e que tem o apoio do senador Renan Calheiros, não contém salvaguardas suficientes. Afirma, por exemplo, que a interpretação não constituirá crime se for “razoável”, mas ignora que a condição deixará o juiz submetido às incertezas do processo e às influências dos poderosos na definição do que vem a ser uma interpretação razoável. Direito, afinal, não admite certezas matemáticas.

Mas não é só. Admite, em seu art. 3º, que os agentes da lei possam ser processados por abuso de autoridade por ação exclusiva da suposta vítima, sem a necessidade de filtro pelo Ministério Público. Na prática, submete policiais, promotores e juízes à vingança privada proveniente de criminosos poderosos. Se aprovado, é possível que os agentes da lei gastem a maior parte de seu tempo defendendo-se de ações indevidas por parte de criminosos contrariados do que no exercício regular de suas funções.

Há outros problemas na lei, como a criminalização de certas diligências de investigação ou a criminalização da relação entre agentes públicos e advogados, o que envenenará o cotidiano das Cortes.

Espera-se que uma herança de séculos, a construção da independência das Cortes de Justiça, não seja desprezada por nossos representantes eleitos. Compreende-se a angústia do momento com a divulgação de tantos casos de corrupção. Mas deve-se confiar na atuação da Justiça, com todas as suas instâncias, para realizar a devida depuração. Qualquer condenação criminal depende de prova acima de qualquer dúvida razoável. A aprovação de lei que, sem salvaguardas, terá o efeito prático de criminalizar a hermenêutica e de intimidar juízes em nada melhorará a atuação da Justiça nessa tarefa. Apenas a tornará mais suscetível a interesses especiais e que, por serem momentâneos, são volúveis, já que — e este é um alerta importante — os poderosos de hoje não necessariamente serão os de amanhã.

Rui Barbosa também foi Senador da República. É o seu busto que domina o Plenário do Senado. Espera-se que a sua atuação como um dos fundadores da República e em prol da independência da magistratura inspire nossos representantes eleitos.

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*Sergio Fernando Moro é juiz federal