quinta-feira, 2 de setembro de 2021

O 2º Manifesto dos Mineiros

A manifestação convocada por Bolsonaro para o dia 7/09/21, com claros objetivos golpistas, divide a sociedade. Mas já fica claro que ele está com a minoria.

Empresários mineiros fizeram o seu manifesto. Ele se denomina o “2º Manifesto dos Mineiros”. 

O que dizem?

A ruptura pelas armas, pela confrontação física nas ruas, é sinônimo de anarquia, que é antônimo de tudo quanto possa compreender uma caminhada serena, cidadã e construtiva. A democracia não pode ser ameaçada, antes, deve ser fortalecida e aperfeiçoada. O que se pretende provocar é outro tipo de ruptura: a ruptura através das ideias e da mudança de comportamentos em todas as dimensões da vida.”

A matéria publicada pelo Estadão traz a íntegra da sua posição (*):

“Horas após o presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, divulgar documento com críticas ao Supremo Tribunal Federal. (STF), questionando decisões dos ministros, defendendo sites investigados pela divulgação de fake news e a liberdade de expressão de políticos presos por ataques à Corte, um grupo de mais de 200 empresários e executivos mineiros divulgou documento, nesta quarta-feira, 1/09/21, nomeado Segundo Manifesto dos Mineiros. 

A peça defende as instituições brasileiras, o Estado de Direito e a democracia, em contraponto às considerações de Roscoe, feitas também nesta quarta. O empresário é próximo do presidente Jair Bolsonaro.

O novo Manifesto dos Mineiros faz alusão ao documento assinado por lideranças estaduais, em 1943, que exigia o fim do Estado Novo e a redemocratização do Brasil. Na época, a carta aberta trilhou o caminho para o surgimento de diversas outras, contribuindo para um clima político que levou à deposição de Getulio Vargas (1882-1954), em 1945.”


Leia a íntegra do ‘Segundo Manifesto dos Mineiros ao Povo Brasileiro’:


As mudanças estruturais que o Estado Brasileiro necessita (e que o Povo Brasileiro reclama) exigem das lideranças, todas, e daqueles que ocupam cargos e funções nas estruturas produtivas e fornecedoras de serviço e de conhecimento (tanto públicas quanto privadas) uma urgente tomada de posição.

A ruptura pelas armas, pela confrontação física nas ruas, é sinônimo de anarquia, que é antônimo de tudo quanto possa compreender uma caminhada serena, cidadã e construtiva. A democracia não pode ser ameaçada, antes, deve ser fortalecida e aperfeiçoada. O que se pretende provocar é outro tipo de ruptura: a ruptura através das ideias e da mudança de comportamentos em todas as dimensões da vida.

O objetivo é construir (na verdade, reconstruir) um projeto de Nação para o Brasil, dando sentido novo ao que seja patriotismo, de modo a fazer do povo brasileiro uma gente mais feliz e colocando o Brasil como Nação altiva, livre e democrática no concerto das Nações.

O país necessita de uma verdadeira "reforma do Estado" (reforma continente) nela compreendendo as reformas internas necessárias, sobressaindo: a reforma político-eleitoral, a reforma administrativa, a reforma do sistema de educação (só a educação transforma as pessoas), a reforma do sistema de segurança, a reforma orçamental e econômica, a reforma do sistema tributário (são reformas de conteúdo).

Já se revelou, e faz tempo, equivocada uma maneira de governar onde os Municípios e os Estados são reféns permanentes do que pensa e do que deseja o governo central sediado em Brasília. Esse centralismo que aumenta as desigualdades, já impôs atraso e miséria a toda a Nação Brasileira.

Vive-se um século XXI que já vai alto e os problemas da gente brasileira continuam, na base, praticamente os mesmos: analfabetismo, esquecimento, ausência de infraestrutura básica (como água e esgoto, por exemplo), além do agravamento de uma escalada criminosa crescente, em vários sentidos (de balas perdidas, assaltos e discriminações).

É preciso valorizar, e se necessário for criar um novo capitalismo que valorize a inteligência humana, um capitalismo humanizado, porque o centro da vida é a Pessoa Humana. 

É quase ulceroso falar, no Brasil, em reforma constitucional, mas é imperativo reconhecer que a Constituição de 1988 já cumpriu o seu papel histórico de assegurar a democracia e de valorizar a cidadania. Quanto ao demais, o que dela se recolhe é um texto antônimo de si mesmo, na medida em que oferece, para uma mesma pergunta, como resposta, sempre um sim e um não. Não se desconhece a delicadeza do tema e as dificuldades a serem encontradas no seu enfrentamento.

É preciso extirpar das leis todo tipo odioso de privilégio que cria castas e diferenças entre as pessoas em função de seus fazeres e de suas responsabilidades. É situação, afinal, que não faz de Pessoa alguma, figura diferente e privilegiada em relação aos demais. É preciso repristinar esta verdade: perante o Estado todos os cidadãos são cidadãos comuns.

É preciso pôr fim à vida estamental do aparelho do Estado que, no Brasil, desde sempre, é uma presa capturada por grupos de pessoas que se autoprivilegiam e conduzem a vida das pessoas segundo seus interesses pessoais, secundando os legítimos interesses do Povo e da Sociedade Brasileira.

É preciso criar mecanismos eficientes de erradicação e de controle da erva daninha da corrupção, banindo da vida pública aqueles que se servem do Estado para, criminosamente, atender a interesses menores e que não correspondam às obrigações do cargo e das funções que exerçam. Tais medidas devem alcançar, por igual, aqueles que ocupem posições de destaque em todos os poderes do Estado: Executivo, Legislativo, Judiciário e Instituições agregadas. 

É preciso criar mecanismo a permitir que as instituições representativas da Sociedade Civil tenham voz ativa junto aos poderes constituídos, fazendo as vezes daquele ‘Poder Moderador’ criado na França pelo pensador Benjamin Constant, de modo a nunca mais permitir arranjos que, atendendo a interesses outros, não correspondam aos anseios da Sociedade e do Povo Brasileiro. 

O Brasil se insere dentre os países do mundo que já viveram todas as experiências de governos e mandonismos: o Brasil colônia deu lugar ao Brasil império; que deu lugar ao Brasil república, a velha e a nova; experimentou, por mais de uma vez, as ditaduras; conheceu, em voo de pássaro, a experiência do parlamentarismo, antes de chegar à nova república. Portanto, a experiência para reescrever o Brasil quem a possui somos nós próprios: os Brasileiros. 

Esse passado inspirador retém matéria prima suficiente para que possamos, de mãos dadas, construir um futuro promissor para o Brasil-nação. A respeito, é relevante trazer a texto a constatação de que instituições brasileiras sérias e comprometidas existem e são inúmeras, como ilhas, no entanto. O propósito deste Manifesto está em propiciar a ligação de todas essas ilhas, dando-nos as mãos. Se todas essas ilhas derem as mãos, a partir de propósitos comuns, construiremos um grande Brasil-arquipélago. 

Dessa construção, (na verdade, reconstrução), sobressairá fortalecido o respeito à integridade das pessoas e suas diferenças e nascerá uma sociedade mais tolerante. É preciso plantar e implantar definitivamente uma política que reconheça o valor do meio ambiente. 

Às mudanças estruturais e estruturantes que este Manifesto suscita – e que por certo serão aprimoradas – caminharão através de um ‘GRANDE PACTO PELO BRASIL’. Esta é a pregação maior com a qual se pretende plantar e colher um Brasil que tenha futuro. 

Registro final: Não se adota neste texto por equívoco, como título, a expressão ‘SEGUNDO MANIFESTO DOS MINEIROS’. A iniciativa compreende um alertar a Gente Mineira e a Gente Brasileira, chamando a atenção para aquele corajoso e desprendido ato praticado por um grupo de pró-Homens conseguiu.

O blefe antidemocrático de Bolsonaro

O STF pagou para ver (*). Fez certo e agiu como se espera de uma instituição da democracia no seu dever de defender o Estado Democrático de Direito, particularmente porque é o alvo principal dos ataques antidemocráticos.


Bolsonaro, como se diz, terá que mostrar suas cartas:
  • Se estiver com a democracia, é o que se espera de um presidente eleito pelo voto, fará a sua manifestação em paz e não provocará nem ameaçará as instituições democráticas;
  • Se não estiver com a democracia, enfiará os pés pelas mãos, pois hoje somente contaria: (1) com núcleos radicais de eleitores, que o seguem cegamente, querem caçar fantasmas comunistas, são politicamente negacionistas, de extrema-direita, etc.; (2) com milicianos e organizações clandestinas de bandidos armados e paramilitares nostálgicos da ditadura militar; neste “exército” roto se apoiaria para promover atentados contra a democracia, invadir o STF, etc..
Se esta segunda alternativa é a sua opção, como parece ser, não passa de um blefe com cartas fracas e previsíveis.

A verdade é que já foi abandonado pela imensa maioria dos seus eleitores e pelas Forças Armadas que lhe têm dado repetitivos recados de que não o apoiarão em um golpe; como se não fosse pouco, tem recebido, diariamente, recados críticos do agronegócio, dos industriais, dos banqueiros e de quase todos os representantes do PIB, de que não o apoiarão se quiser romper com a democracia; finalmente, com a sua bancada parlamentar, comprada a peso de ouro com fatias de verbas orçamentárias, não poderá contar, também, para romper com a democracia.

Qualquer que seja a sua alternativa, já perdeu, pois além de decepcionar profundamente aos democratas brasileiros, ex apoiadores ou não, com sua incapacitação intelectual, moral e mental para o cargo, irá decepcionar, também, aos seus ainda apoiadores, e radicais de extrema direita, quando perceberem que o seu líder bravateiro apenas blefava ao chamá-los, como massa de manobra, para um assalto fake aos palácios da democracia sem que para isso contasse com força e apoio.

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Estadão:

Agência Brasil:

terça-feira, 31 de agosto de 2021

O agronegócio em defesa da democracia

O manifesto das entidades do agronegócio divulgado no dia 30 de agosto de 2021, segunda feira, é exemplar na forma como  expressa o compromisso com o Estado Democrático de Direito e como demonstra a compreensão de sua responsabilidade e importância perante a sociedade e a economia brasileiras.

É de se esperar que posicionamentos semelhantes venham de outras importantes entidades do setor econômico, que formam o PIB brasileiro. Seria bom que fossem tão claros e corajosos quanto este do agronegócio. Mas já é claro o desconforto dos agentes econômicos com as intenções antidemocráticas de Bolsonaro.

Observe-se que a FEBRABAN e a FIESP ainda não se manifestaram independente e soberanamente. Apenas ameaçaram com um documento anódino. O artigo de Eliane Cantanhede (*), colocado em anexo, é esclarecedor de suas contradições e do vexame que estão passando.


ÍNTEGRA DO MANIFESTO (**):

As entidades associativas abaixo assinadas tornam pública sua preocupação com os atuais desafios à harmonia político-institucional e, como consequência, à estabilidade econômica e social em nosso País. Somos responsáveis pela geração de milhões de empregos, por forte participação na balança comercial e como base arrecadatória expressiva de tributos públicos. Assim, em nome de nossos setores, cumprimos o dever de nos juntar a muitas outras vozes responsáveis, em chamamento a que nossas lideranças se mostrem à altura do Brasil e de sua história agora prestes a celebrar o bicentenário da Independência.

(***)

A Constituição de 1988 definiu o Estado Democrático de Direito no âmbito do qual escolhemos viver e construir o Brasil com que sonhamos. Mais de três décadas de trajetória democrática, não sem percalços ou frustrações, porém também pela repleta de conquistas e avanços dos quais podemos nos orgulhar. Mais de três décadas de liberdade e pluralismo, com alternância de poder em eleições legítimas e frequentes.

O desenvolvimento econômico e social do Brasil, para ser efetivo e sustentável, requer paz e tranquilidade, condições indispensáveis para seguir avançando na caminhada civilizatória de uma nacionalidade fraterna e solidária, que reconhece a maioria sem ignorar as minorias, que acolhe e fomenta a diversidade, que viceja no confronto respeitoso entre ideias que se antepõem, sem qualquer tipo de violência entre pessoas ou grupos. Acima de tudo, uma sociedade que não mais tolere a miséria e a desigualdade que tanto nos envergonham.

As amplas cadeias produtivas e setores econômicos que representamos precisam de estabilidade, de segurança jurídica, de harmonia, enfim, para poder trabalhar. Em uma palavra, é de liberdade que precisamos - para empreender, gerar e compartilhar riqueza, para contratar e comercializar, no Brasil e no exterior. É o Estado Democrático de Direito que nos assegura essa liberdade empreendedora essencial numa economia capitalista, o que é o inverso de aventuras radicais, greves e paralisações ilegais, de qualquer politização ou partidarização nociva que, longe de resolver nossos problemas, certamente os agravará.

Somos uma das maiores economias do planeta, um dos países mais importantes do mundo, sob qualquer aspecto, e não nos podemos apresentar à comunidade das Nações como uma sociedade permanentemente tensionada em crises intermináveis ou em risco de retrocessos e rupturas institucionais. O Brasil é muito maior e melhor do que a imagem que temos projetado ao mundo. Isto está nos custando caro e levará tempo para reverter.

A moderna agroindústria brasileira tem história de sucesso reconhecida mundo afora, como resultado da inovação e da sustentabilidade que nos tornaram potência agroambiental global. Somos força do progresso, do avanço, da estabilidade indispensável e não de crises evitáveis. Seguiremos contribuindo para a construção de um futuro de prosperidade e dinamismo para o Brasil, como temos feito ao longo dos últimos anos. O Brasil pode contar com nosso trabalho sério e comprovadamente frutífero.

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(***) Abag: Associação Brasileira de Agronegócio

segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Fuzil, ditadura e morte, ou feijão, democracia e paz?

 Aproxima-se o dia 7 de setembro de 2021, dia da Proclamação da Independência, quando a democracia será submetida a um severo teste.

Bolsonaro, crescentemente isolado política e socialmente, está desesperado. É inteiramente responsável pelo seu fracasso como presidente, mas por saber que dificilmente será reeleito pelo voto democrático, chama os seus apoiadores - que são em cada vez menor número - para virar a mesa.


Tenta dar uma demonstração de força e arrastar as Forças Armadas para o seu projeto golpista.

Concentrará seus esforços nas mobilizações de Brasília e da Avenida Paulista em São Paulo. Uma, o centro político e, outra, o símbolo do poder econômico do país. Em ambos os lugares já sabe que os políticos e empresários apenas o suportam, apesar de todas as concessões que vem fazendo ao fisiologismo e à corrupção para obter o apoio do “Centrão” e de certos setores econômicos escolhidos a dedo.

Levará para as ruas os seus adeptos de raiz, que se orientam por uma ideologia totalitária confusa, obscurantista e negacionista de extrema direita; estes o mitificam e o merecem, e defendem o fechamento do STF e do Congresso. Não serão poucos, provavelmente serão muitos. Está jogando tudo nessa convocação para não dar vexame, e está organizando caravanas vindas de toda parte. 

Muitos defendem a violência, as armas, a ditadura e se sentem estimulados pela ideia de uma guerra civil para caçar e matar inimigos fantasmagóricos. Menosprezam o desespero de dezenas de milhões de brasileiros torturados pelo desemprego, pela falta de renda, pela pandemia e pela inflação.

Mas fuzil ou violência não substituem o feijão nem enchem barriga; ao contrário, apenas agravam a crise! Diriam, porém, que isto não afeta o posicionamento dos seus apoiadores mais radicais. Certo, parece que não há dúvida quanto a isso. Relatos respeitáveis dão conta de que grupos armados de seus apoiadores estariam dispostos à violência; e defendem que o momento é este, que não pode ser perdido e que não haverá outra oportunidade. Alguns se proporiam, mesmo, a invadir e tomar os prédios do STF e até do próprio Congresso.

Exatamente porque Bolsonaro os chama para uma guerra sem sentido, e porque a maioria dos que votaram nele já está decepcionada com a sua incapacitação intelectual, moral e mental, dezenas de milhões de seus eleitores não acorrerão ao seu chamado; sobretudo, porque são democratas, e querem viver e trabalhar em paz. E, simplesmente, a maioria dos que ainda guardam alguma simpatia por ele também não endossam métodos violentos.

O golpe que Bolsonaro quer dar só ocorrerá se as Forças Armadas o apoiarem. Esperto, não é? Ou seja, uma ruptura institucional que depende, para o seu sucesso, de um golpe de estado que elas não querem dar! O que as faria endossar semelhante desatino? O caos, uma situação de violência e de confronto com mortos nas ruas? Talvez, mas improvável.

Em síntese, Bolsonaro está chamando as Forças Armadas para dar um golpe militar, simplesmente, para atender ao seu delírio autoritário de governar como ditador. Mas nos seus quase três anos de mandato ele tem sido, antes de tudo, uma desgraça para o país, que seria ainda maior se houvesse um impensável rompimento com a democracia. Portanto, as FA já não o levam mais a sério, e estão querendo vê-lo pelas costas.

Sua lealdade ao presidente se dá exatamente dentro dos preceitos institucionais do Estado Democrático de Direito. E nisto permanecerão firmes, a não ser que ele cometa algum desatino insustentável! Talvez esteja próximo disso. Neste caso, ao invés de empregarem as FA para um golpe, darão o sinal verde para o seu impeachment ou interdição, enquanto atores institucionais fundamentais que são da democracia brasileira.

Em poucos dias, no dia 7/09, essa tese, de que as FA se manterão dentro dos limites constitucionais será submetida a severo teste. Faltam poucos dias; cabe a todos os democratas se manterem ativos e alertas.

O que nós, democratas, podemos e devemos fazer? Primeiro, chamar a todos, inclusive aos democratas que votaram em Bolsonaro, para que fiquem em casa e longe das ruas no dia 7/09. Segundo, chamar a todos para a manifestação do dia 12/09, quando inundaremos as ruas, aos milhões, com o verde e o amarelo, para que retomemos o caminho da democracia. Neste dia as cores de nossa bandeira serão resgatadas e passarão a estar nas mãos certas, as dos democratas! A história não andará para trás!

O governo, a população e as Forças Armadas

O general Carlos Alberto dos Santos Cruz é um dos militares brasileiros mais respeitados, sendo um dos poucos que realmente tem experiência de combate. Em todas as suas missões desempenhou-se com os padrões mais altos de excelência sendo um exemplo para todos os seus pares.


Da Wikipédia, as referências abaixo:
Diverge de Bolsonaro e tem sido uma das vozes mais ativas na defesa do papel institucional e constitucional das Forças Armadas.

No artigo abaixo, publicado no Estadão no dia 29/08, domingo, mostra o seu pensamento claro em defesa do Estado Democrático de Direito, exatamente no momento em que Bolsonaro convoca para o dia 7 de setembro manifestações com o claro objetivo de tentar arrastar as Forças Armadas para uma aventura golpista.


General Carlos Alberto dos Santos Cruz (*)

O Estado de S.Paulo, Opinião

29 de agosto de 2021 

O presidente da República, senadores, deputados, prefeitos e vereadores são eleitos para assumirem suas responsabilidades e fazer o que é possível dentro da lei. O governo é eleito para governar e reforçar o regime democrático por meio do aperfeiçoamento das instituições, promover a paz social e o respeito pessoal, funcional e institucional.

Nenhuma autoridade pode ser agente de desmoralização e de enfraquecimento das estruturas existentes, promover fanfarronices, factoides, passeios com dinheiro público e alegar que não o deixam trabalhar. O populismo, a demagogia e a agitação social não podem ser praticados por autoridades.

A população, pelo voto, elege a pessoa e legitima a autoridade. Na democracia, o equilíbrio existe por uma dinâmica de forças entre os Poderes e outros núcleos de influência. As disputas e os conflitos são resolvidos dentro da legislação vigente. Também podem ser propostas modificações nas leis, dentro das normas e dos procedimentos que devem ser respeitados. Quando o equilíbrio é instável ou rompido, ele tem de ser restabelecido também de acordo com a lei.

Todas as manifestações públicas dentro da lei são válidas e importantes. Elas fazem parte do ambiente democrático, da liberdade de expressão e do jogo de pressões. O estímulo a soluções de força, fora da lei, com risco de violência, é criminoso e covarde. Aqueles que se perdem em suas ações têm de arcar com as consequências legais. Normalmente os extremistas, os incitadores da violência, desaparecem e ficam impunes, pois são covardes na sua essência. As pessoas, na sua luta por aquilo em que acreditam, seja qual for a linha, não devem cair na armadilha dos covardes, dos irresponsáveis e dos inconsequentes.

A convocação de manifestações não pode ser para transferir responsabilidades para a população, para outros Poderes, instituições, e para as Forças Armadas. Isso é falta de coragem funcional. A responsabilidade é intransferível.

É difícil definir democracia. É mais fácil observar algumas de suas características, como o respeito, a liberdade, as eleições periódicas, a igualdade, a dignidade, etc. Uma das expressões mais famosas é a de que a democracia é o “governo do povo, pelo povo, para o povo”. Isso é fundamento conceitual. Na prática, a responsabilidade governamental é transformar essa abstração em realidade com ações dentro da lei, que foi feita pelo povo, por intermédio de seus representantes, ao longo do tempo. As leis sempre podem ser melhoradas, aperfeiçoadas e ajustadas aos tempos atuais, dentro da ordem legal. Fora disso é fuga da responsabilidade, demagogia, populismo, assembleísmo.

Uma manifestação, mesmo que numerosa, com toda a sua validade, não representa a vontade de um povo inteiro. O que representa a vontade de um povo, na democracia, é o voto, que pressupõe, de antemão, o respeito à decisão da maioria.

É desrespeito às instituições militares inventar falsas justificativas e interpretações de conveniência para empurrar seguidores a pedirem intervenção de Forças Armadas (FAs), usar o prestígio e o poder militar como instrumento de intimidação e pressão política, para atingir objetivos de poder pessoal e de grupos. As FAs não podem ser exploradas e desgastadas por interesse político.

Deturpar o artigo 142 da Constituição federal é artimanha e demagogia. Não é verdade que as FAs sejam garantidoras da independência e da harmonia entre os Poderes. Não é isso o que diz a Carta Magna. Não existe nenhuma pista no artigo 142 que ampare essa interpretação. Também não existe nenhuma legitimidade em considerar as FAs “poder moderador” por conta de qualquer narrativa de conveniência. As FAs existem para a defesa da Pátria, para a garantia dos Poderes constitucionais, da lei e da ordem. Não cabe no Brasil atual a ideia de interferência de FAs no funcionamento e exercício dos Poderes da República.

Não estamos na guerra fria, no pós-2.ª Guerra Mundial. Estamos em 2021. O Brasil não vive uma opção única entre a ameaça de caos e um “salvador da pátria”, uma disputa entre amigos e inimigos, direita x esquerda. Isso é manipulação da opinião pública e a redução do nosso país à mediocridade da divisão social binária. Os problemas reais de nosso povo são a corrupção persistente, a fome, o desemprego, a falta de saúde pública, de educação, de segurança pública, de aplicação da lei, a desigualdade social e os privilégios imorais.

Extremos de qualquer matiz não podem impor suas agendas. Aventureiros não podem ser tolerados.

A Constituição e a legislação têm todos os recursos para encaminhar soluções legais. A manutenção ininterrupta de campanha política, de conflito permanente, causa prejuízo à paz social e insegurança, com consequências negativas principalmente para as atividades econômicas e para a vida dos mais necessitados. O governo precisa é transmitir equilíbrio, paz social, cumprir as leis, dar atenção aos principais problemas e exercitar a habilidade política nas disputas.

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(*) GENERAL DA RESERVA, FOI MINISTRO DA SECRETARIA DE GOVERNO

sexta-feira, 27 de agosto de 2021

Onze teses negacionistas

Existe uma batalha ideológica instaurada na sociedade brasileira. Surpreendentemente, ela não está se dando entre cidadãos que apoiam e confiam na ciência. Mas entre os que a apoiam e os que a negam. A surpresa foi verificar que milhões de brasileiros, aliados com o bolsonarismo, são influenciados por essas teses e até as defendem.

Não existirá futuro para o Brasil se essas teses não forem derrotadas, e remetidas para o lugar de onde jamais deveriam ter saído, o lixo da história, da civilização e da cultura, pois são fatores de atraso e puxam o Brasil para trás. Na história, algumas dessas teses estariam bem na idade média.

A ciência se alimenta da transparência, de referências respeitáveis e confiáveis, critérios objetivos e validados pela experimentação, e por conhecimento reprodutível e comprovável. É certo, a ciência não dá todas as respostas existenciais para as necessidades humanas, mas não existe referência mais sólida, confiável e rigorosa quando os humanos se reunem para debater e solucionar os seus problemas comuns, para projetar o futuro desejado, e para pactua-lo coletiva e democraticamente visando construir a prosperidade social e material da nação. Sobretudo, a ciência tem horror das fakenews e não consegue conviver com elas!

O artigo, abaixo, do jornalista Luiz Carlos Azedo, faz uma excelente síntese dessas teses negacionistas.



Luiz Carlos Azedo

Jornalista, coluna Entre Linhas, Correio Braziliense, 27/08/2021 (*)

O negacionismo utiliza os preconceitos e o senso comum para construir teorias conspiratórias. A manipulação da informação explora a boa-fé e a ignorância

Por definição, negacionismo é o ato de negar uma informação estabelecida em bases científicas, ou seja, amplamente estudada e comprovada. Suas características são a manipulação de informações, a utilização de falsos especialistas e as teorias conspiratórias. O negacionista assume uma postura irracional e ideológica, prefere acreditar em informações falsas e sem comprovação, despreza ciência e refuga as verdades inconvenientes. Na ciência, destacam-se o negacionismo do aquecimento global e o da esfericidade terrestre; na História, o do Holocausto. O Brasil vive uma onda negacionista, liderada pelo presidente Jair Bolsonaro e filhos.

O negacionismo utiliza os preconceitos e o senso comum para construir teorias conspiratórias. A manipulação da informação é fundamental, geralmente por falsos especialistas, que exploram a boa-fé e a ignorância. Com o advento das redes sociais, utiliza-se em larga escala das fake news, formando grandes correntes de propagação de mentiras. São teses negacionistas:

1. Gripezinha — desde o começo da pandemia, o presidente Jair Bolsonaro adotou uma política negacionista em relação à gravidade da pandemia da covid-19 e defendeu a chamada “imunização de rebanho”, cuja consequência foi o descontrole sobre a propagação da doença. O número de mortos se aproxima de 600 mil.

2. Cloroquina — em vez de providenciar a imunização em massa da população, Bolsonaro defendeu o uso indiscriminado de um “coquetel” ineficaz contra a doença, formado por hidroxi- cloroquina, ivermectina, nitazoxanida, azitromicina, vitamina D e zinco. Uma CPI no Senado investiga a máfia que se formou no Ministério da Saúde para ganhar dinheiro sujo com a pandemia.

3. Vírus chinês — nas redes sociais, disseminou-se a tese de que o novo coronavírus, de procedência chinesa, teria sido produzido em laboratório e propagado propositalmente pela China para prejudicar a economia mundial, no contexto da guerra comercial com os Estados Unidos. A tese provocou um incidente diplomático com a China.

4. Coronavac — a eficácia da vacina produzida pelo Instituto Butantan ainda é questionada por Bolsonaro, muito embora tenha sido a principal alternativa para conter a pandemia. Nesta semana, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ao anunciar a terceira dose das vacinas, excluiu a CoronaVac, muito embora milhões de brasileiros tenham sido imunizados pelo produto de origem chinesa.

5. Voto impresso — Bolsonaro defende o voto impresso e dissemina a tese de que a urna eletrônica não é confiável, levantando suspeitas sobre a lisura das eleições de 2022, embora nunca tenha sido comprovado um caso sequer de violação da urna eletrônica. A proposta foi rejeitada pela Câmara, por ampla maioria, além de contestada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

6. Poder moderador — o artigo 142 da Constituição de 1988 estabelece que “as Forças Armadas (…) destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos Poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Com base nesse artigo, Bolsonaro atribui aos militares o papel de Poder Moderador, que não existe na Constituição, cuja interpretação cabe ao Supremo, e não ao “comandante supremo” das Forças Armadas.

7. Amazônia — o desmatamento da Amazônia é monitorado por instituições científicas de todo o mundo, sendo um dos fatores de aquecimento global, em consequência de atividades ilegais, como grilagem de terras, queimadas, derrubada da floresta, garimpo etc. Bolsonaro defende a exploração indiscriminada da Amazônia e acusa as ONGs ambientalistas de estarem a serviço de potências estrangeiras.

8. Marxismo cultural — os artistas, os intelectuais e a cultura estão sendo perseguidos pelo governo federal, a pretexto de que seriam agentes do chamado “marxismo cultural”. O cinema, o teatro, a música, as artes plásticas e até a memória cultural, hoje, são sufocados pelos dirigentes dos órgãos culturais.

9. Racismo estrutural — a Fundação Palmares, criada para preservar e valorizar a cultura afrobrasileira e promover políticas afirmativas de combate ao racismo, nega o racismo estrutural. Tornou-se um órgão que não reconhece as comunidades de origem quilombola e combate o movimento negro, cujos líderes históricos renega, como Zumbi dos Palmares.

10. Terras indígenas — o governo promove o desmonte da política indigenista, reconhecida internacionalmente e responsável pela sobrevivência da diversidade étnica das comunidades indígenas. A tese básica é de que há muita terra para poucos índios e de que a cultura indígena não tem nenhum valor civilizatório.

11. Diversidade — o presidente da República não reconhece e menospreza a diversidade de gênero e de orientação sexual. A comunidade LGBTQIA+ (qualquer pessoa não heterossexual ou não cisgênero, ou fora das normas de gênero pela sua orien- tação sexual, identidade, expressão de gênero ou características sexuais) sente-se ameaçada.


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(*) https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-onze-teses-negacionistasx/?fbclid=IwAR1dcXl2U0B1zuLhURm7IYNHGUtP3OnlHr69n69_v_qkPSQFnQn370d1-OA


terça-feira, 24 de agosto de 2021

7 de setembro de 2021, um golpe com data marcada?

Existe muita agitação nas redes bolsonaristas. Elas espalham notícias - fakenews? -, de que grupos radicais de manifestantes bolsonaristas, de extrema direita, estariam planejando tomar de assalto os prédios do Congresso Nacional e do STF no dia 7/09, dia da independência.


Naturalmente, isto está trazendo apreensão aos democratas de todos os matizes políticos, exatamente os que repudiam todo tipo de ditadura e somente querem viver em um Estado Democrático de Direito.

O que podemos e devemos fazer?

(1) mobilizar os democratas, em uma imensa REDE EM DEFESA DA DEMOCRACIA, se opor e denunciar, responsavelmente, publicamente, e às autoridades, toda manifestação que tenha como objetivo atentar contra as instituições democráticas;

(2) apoiar todas as ações dos órgãos do Estado, dos chefes dos poderes executivo estaduais e municipais, dos poderes legislativo e judiciário e, em particular, os de segurança, inclusive preventivamente, em defesa da democracia, de suas instituições e do patrimônio público e privado; 

(3) impedir que bandos de vândalos invadam os imóveis do Congresso e do STF, sob qualquer pretexto, como estão ameaçando;

(4) evitar todo confronto nas ruas e pretextos de golpe, que é tudo o que querem; no dia 7/09 os democratas devem ficar em casa;

Por último, uma consideração de caráter meramente lógico: não se marca data pública para um golpe de estado; não existe clima para golpes, uma proposta que só pode existir e vir da cabeça tresloucada de Bolsonaro e de seus seguidores radicais.

Se está blefando, para manter os brasileiros amedrontados, é bom que saiba que já cansou. O Brasil precisa de um presidente sério para que possa viver e trabalhar em paz.