sábado, 16 de maio de 2020

O que o General Mourão não disse?

O artigo do Gal Mourão, vice-presidente da república, “Limites e Responsabilidades”, publicado no último dia 14/05/20 no Estadão, está merecendo a atenção devida.

Bem escrito, continuará sendo objeto de análise, pois, certamente, Mourão quis dar o seu recado. Foi em boa hora e oportuno. Tenhamos, a partir de cada uma de nossas óticas particulares, gostado, ou não, do seu posicionamento, ele nos traz informações sobre como pensa.

O vice-presidente Hamilton Mourão Foto: Dida Sampaio/Estadão 

Entretanto, ele não disse tudo o que pensa; e não disse, também, o que não pensa, pois não é um puxa-sacos. Portanto, tomarei a liberdade de especular sobre o que ele realmente pensa sobre Bolsonaro, mas que não pode dizê-lo por sua posição e responsabilidade.

Pois bem, temos sido testemunhas das dezenas de vezes em que já foi obrigado a sair em campo para “explicar” falações atrapalhadas de Bolsonaro para livra-lo de situações aflitivas. Ele sabe, pensa e acha, que o presidente é um trapalhão!

Vivemos a tragédia da pandemia. Quase a totalidade dos chefes de Estado, diante da guerra contra o vírus, no melhor ensinamento de Churtill, apenas prometendo a verdade, “sangue, suor e lágrimas”, vêm liderando suas nações, e unindo-as, em defesa da vida. Suas popularidades, em geral, ascenderam a níveis superiores às que tinham antes da pandemia! Bolsonaro, ao contrário, coloca-se contra a ciência, a comunidade de saúde, os governadores e prefeitos e substituiu, em plena guerra contra o coronavírus, pela 2ª vez, os seus “generais comandantes” - Mandetta e Teich - em pleno teatro de batalha. E tornou-se, tanto quanto o vírus, um grave problema sanitário. Perdoem-me, há quem discorde, mas tenho certeza que Mourão e os demais generais que estão na tropa, não têm mais qualquer respeito pelo tirocínio do presidente.

Sairemos, sabe-se quando, desta crise, chorando os nossos mortos e, junto com todos os países do mundo, no que poderá ser a maior recessão econômica de nossa história. Precisamos de estadistas, união e liderança!

Enquanto isso, Bolsonaro só pensa em ser um ditador, fechar o Congresso, o STF, armar o povo; e estimular grupos paramilitares a ocuparem, armados, a Explanada dos Ministérios, que propõem, sem eufemismos, que dê um golpe militar.

Mourão concorda com isso? Será que o seu pensamento é uma visão totalitária, militarista e corporativista? E que menospreza os 35 anos de democracia que já vivemos e o Estado Democrático de Direito?

Espero que não! Espero que essa seja a essência do que Mourão não disse!

--------

Íntegra do artigo "Limites e Responsabilidades"

Antonio Hamilton Martins Mourão* - O Estado de S.Paulo
14 de maio de 2020 | 03h00

A esta altura está claro que a pandemia de covid-19 não é só uma questão de saúde: por seu alcance, sempre foi social; pelos seus efeitos, já se tornou econômica; e por suas consequências pode vir a ser de segurança. A crise que ela causou nunca foi, nem poderia ser, questão afeta exclusivamente a um ministério, a um Poder, a um nível de administração ou a uma classe profissional. É política na medida em que afeta toda a sociedade e esta, enquanto politicamente organizada, só pode enfrentá-la pela ação do Estado. 

Para esse mal nenhum país do mundo tem solução imediata, cada qual procura enfrentá-lo de acordo com a sua realidade. Mas nenhum vem causando tanto mal a si mesmo como o Brasil. Um estrago institucional que já vinha ocorrendo, mas agora atingiu as raias da insensatez, está levando o País ao caos e pode ser resumido em quatro pontos. 

"Com sensibilidade das mais altas autoridades é possível superar a grave situação que vive o País"

O primeiro é a polarização que tomou conta de nossa sociedade, outra praga destes dias que tem muitos lados, pois se radicaliza por tudo, a começar pela opinião, que no Brasil corre o risco de ser judicializada, sempre pelo mesmo viés. Tornamo-nos assim incapazes do essencial para enfrentar qualquer problema: sentar à mesa, conversar e debater. A imprensa, a grande instituição da opinião, precisa rever seus procedimentos nesta calamidade que vivemos. Opiniões distintas, contrárias e favoráveis ao governo, tanto sobre o isolamento como a retomada da economia, enfim, sobre o enfrentamento da crise, devem ter o mesmo espaço nos principais veículos de comunicação. Sem isso teremos descrédito e reação, deteriorando-se o ambiente de convivência e tolerância que deve vigorar numa democracia. 

O segundo ponto é a degradação do conhecimento político por quem deveria usá-lo de maneira responsável, governadores, magistrados e legisladores que esquecem que o Brasil não é uma confederação, mas uma federação, a forma de organização política criada pelos EUA em que o governo central não é um agente dos Estados que a constituem, é parte de um sistema federal que se estende por toda a União. 

Em O Federalista – a famosa coletânea de artigos que ajudou a convencer quase todos os delegados da convenção federal a assinarem a Constituição norte-americana em 17 de setembro de 1787 –, John Jay, um de seus autores, mostrou como a “administração, os conselhos políticos e as decisões judiciais do governo nacional serão mais sensatos, sistemáticos e judiciosos do que os Estados isoladamente”, simplesmente por que esse sistema permite somar esforços e concentrar os talentos de forma a solucionar os problemas de forma mais eficaz. 

O terceiro ponto é a usurpação das prerrogativas do Poder Executivo. A esse respeito, no mesmo Federalista outro de seus autores, James Madison, estabeleceu “como fundamentos básicos que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário devem ser separados e distintos, de tal modo que ninguém possa exercer os poderes de mais de um deles ao mesmo tempo”, uma regra estilhaçada no Brasil de hoje pela profusão de decisões de presidentes de outros Poderes, de juízes de todas as instâncias e de procuradores, que, sem deterem mandatos de autoridade executiva, intentam exercê-la. 

Na obra brasileira que pode ser considerada equivalente ao Federalista, Amaro Cavalcanti (Regime Federativo e a República Brasileira, 1899), que foi ministro de Interior e ministro do Supremo Tribunal Federal, afirmou, apenas dez anos depois da Proclamação da República, que “muitos Estados da Federação, ou não compreenderam bem o seu papel neste regime político, ou, então, têm procedido sem bastante boa fé”, algo que vem custando caro ao País. 

O quarto ponto é o prejuízo à imagem do Brasil no exterior decorrente das manifestações de personalidades que, tendo exercido funções de relevância em administrações anteriores, por se sentirem desprestigiados ou simplesmente inconformados com o governo democraticamente eleito em outubro de 2018, usam seu prestígio para fazer apressadas ilações e apontar o País “como ameaça a si mesmo e aos demais na destruição da Amazônia e no agravamento do aquecimento global”, uma acusação leviana que, neste momento crítico, prejudica ainda mais o esforço do governo para enfrentar o desafio que se coloca ao Brasil naquela imensa região, que desconhecem e pela qual jamais fizeram algo de palpável.  

Esses pontos resumem uma situação grave, mas não insuperável, desde que haja um mínimo de sensibilidade das mais altas autoridades do País. 

Pela maneira desordenada como foram decretadas as medidas de isolamento social, a economia do País está paralisada, a ameaça de desorganização do sistema produtivo é real e as maiores quedas nas exportações brasileiras de janeiro a abril deste ano foram as da indústria de transformação, automobilística e aeronáutica, as que mais geram riqueza. Sem falar na catástrofe do desemprego que está no horizonte. 

Enquanto os países mais importantes do mundo se organizam para enfrentar a pandemia em todas as frentes, de saúde a produção e consumo, aqui, no Brasil, continuamos entregues a estatísticas seletivas, discórdia, corrupção e oportunismo. 

Há tempo para reverter o desastre. Basta que se respeitem os limites e as responsabilidades das autoridades legalmente constituídas. 


* ANTONIO HAMILTON MARTINS MOURÃO É VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA

______
Abaixo, dois materiais com o pensamento de dois generais palacianos, um do Gal Braga Neto, ministro da Casa Civil; outro, do  Gal Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo. Eles apresentam o pensamento de dois militares palacianos, não necessariamente o das Forças Armadas.

(1) Gal Braga Neto

(2) Luiz Eduardo Ramos














quinta-feira, 14 de maio de 2020

Seremos o epicentro da pandemia?

Bolsonaro realmente ama Trump. Não vai deixá-lo na mão.

Observem a curva “United States” em vermelho. Trump lidera o país com o maior número de mortes por dia.

Mas, firmemente, em número de mortes, lá vai o Brasil subindo, na curva também em vermelho. Enquanto os EUA e os demais países já estão descendo, nós vamos subindo, com a ajuda decisiva - e criminosa - de Bolsonaro.

Mas parceria é parceria, Bolsonaro não vai deixar Trump mal! Em algum momento, nos próximos dias, a curva ”Brazil” poderá alcançar a curva “United States”.

Seria como a passagem do bastão numa corrida olímpica de revezamento? Só que o bastão significará que o Brasil substituirá os EUA, e passará a ter o maior número de mortes por dia no mundo! Ou seja, se tornará o epicentro da pandemia!


domingo, 10 de maio de 2020

Por que Bolsonaro quer uma ditadura?

É um dever dize-lo, Bolsonaro quer uma ditadura. Duas são as razões: (1) ele não é um democrata; (2) sabe que não se reelegerá em 2022.

A segunda razão, porque os democratas, inclusive os que nele votaram em 2018, se unirão contra ele em 2022.

Ninguém tem bola de cristal, mas a melhor maneira de enfrentar Bolsonaro é compreender exatamente como ele pensa e o que ele quer, e reagir, pois trata-se de defender a democracia sem desânimo ou pessimismo covarde.


Por que não é provável que Bolsonaro consiga o seu intento? (1) porque a maioria dos brasileiros não desejam uma ditadura; desde 1985, já são 35 anos de democracia, o mais prolongado período de nossa história republicana e, depois da promulgação da Constituição de 1988, foram criados os pesos e contrapesos para a defesa do Estado Democrático de Direito; (2) porque Bolsonaro não conseguiu cooptar as forças armadas para o seu projeto totalitário; mais provável que não o consiga; (3) porque lhe falta moral e respeito, mesmo na extrema direita, para conseguir liderar um golpe de estado.

Mas é necessário detalhar melhor a segunda razão de Bolsonaro para querer dar um golpe. Bolsonaro, que sabe contar votos, também sabe que não se reelegerá; se for ao 2º turno perderá para qualquer outro concorrente, como perderia Haddad contra qualquer outro adversário que o enfrentasse no 2º turno; embora não seja confortável para os apoiadores deste admiti-lo, em 2018 uniram-se contra ele todos os que desejavam a alternância do poder e impedir que o PT voltasse ao governo.

Como já aconteceu com Haddad, o mesmo acontecerá com Bolsonaro em 2022. A maioria dos eleitores democratas se unirá contra ele, incluídos a maioria dos seus eleitores de 2018.

Por isso, porque não é um democrata, quer dar o golpe antes para estender o seu mandato, pois não quer correr o risco de perder. Paradoxalmente, o seu modelo é o da Venezuela. Ele quer um Estado miliciano, autoritário, e sem liberdades civis. Condição para isso, é que, como na Venezuela, ele lhe tenha o Congresso e o STF servis. Por isso, apoia o fechamento desses poderes para depois reabri-los devidamente “formatados” ao seu projeto.

Conseguirá? Este é outro problema. Os democratas não o apoiarão, inclusive os seus eleitores democratas, que já o estão abandonando. Com a saída de Moro, perdeu a bandeira da ética e, doravante, se verá envolvido em processos judiciais. Mas Bolsonaro investe e deposita a esperança de que os seus generais palacianos, paraquedistas como ele, terão influência nas forças armadas suficiente para levá-las à aventura do golpe; até agora não obteve este apoio.

O risco maior, para ele, se continuar a tentar dar o golpe, é ser afastado - isolado da maioria democrática e das FFAA - pela aplicação das normas legais e constitucionais.

A pandemia e a grave recessão que lhe segue, exige a liderança de um estadista, tudo o que Bolsonaro não é.

É tão grave o comportamento de Bolsonaro, tendo ele mesmo se tornado um problema sanitário, maximizando o número de mortes, que corre o risco de ser afastado por “interdição”, sem impeachment sem nada!

quarta-feira, 6 de maio de 2020

Os democratas estão de volta às ruas!

Sabemos que diante de ações de desrespeito que nos agridem, tanto pessoalmente, ou aquelas praticadas por agentes políticos contra as instituições democráticas e contra o bem comum, a pior estratégia é a de fingirmos que nada está acontecendo.

O agressor, se não lhe colocarmos limites, continuará a sua escalada. Alguns, se não forem parados com a devida resposta correta e equilibrada, e se deixados impunes, pensarão, mesmo, que lhes foi dado o direito divino de delinquir.

Podemos até perdoar os transgressores, às vezes é a primeira pena que lhes podemos atribuir; exatamente, o perdão, se houver arrependimento sincero. Mas, sempre, mesmo que tenhamos paciência e prudência, a melhor resposta e estratégia é lhes mostrar os devidos limites; sabem disso todos os que já foram alvo de violência ou arbítrio!

É o que está acontecendo com Bolsonaro em sua escalada. Pensa que tem o poder de nos calar, e se torna cada vez mais agressivo. O Congresso está fazendo o seu papel. O STF está fazendo o seu papel. Mas os cidadãos, corretamente, estão guardando o isolamento/distanciamento social em respeito ao valor maior da vida diante da pandemia do coronavirus. Estamos em casa; enquanto isso, ele está levando os seus radicais para a rua em apoio a um golpe militar, e ao fechamento do Congresso e do STF.

Continuaremos sem ir às ruas enquanto o mais elementar compromisso e respeito com o valor da vida nos aconselhar. Mas não estamos passivos nem acovardados. Está em ebulição, e presente, nas nossas consciências, e nas redes, a nossa indignação. Somos milhões, democratas, simplesmente, a maioria dos brasileiros!

Precisamos, entretanto, dar um passo à frente. Já estamos muito ativos nas redes sociais, mas é necessário abrir a discussão sobre o que podemos fazer a mais.

Transcrevo, abaixo, a proposta de Walmyr Buzatto para a volta dos democratas às ruas. Ela é criativa e responsável, e tem o mérito de poder ser implantada rapidamente usando o poder das redes. Eis sua formulação inicial, pensando em São Paulo, mas que vale para qualquer recanto do país: 

“Não podemos nos aglomerar nas ruas. Não podemos ir à Paulista, em Sampa, para protestar, mas podemos sair na frente de nossas casas, de nossos prédios, em horário combinado, mantendo distanciamento social, protegidos, mas deixando claro que não compactuamos com o que Bolsonaro faz na presidência e queremos que ele saia.” A experiência começou no dia 14/05/2020, como abaixo. Mas pode ser repetida sempre que for combinada. O grupo "Vamos pra Rua!", surgido em Brasília, já o adotou.


Não importa qual seja a sua posição pessoal a favor, ou não, do afastamento de Bolsonaro, o que nos une neste movimento é sermos democratas, repudiarmos todo tipo de ditaduras e somente querermos viver sob um Estado Democrático de Direito. E é dentre os que defendam estas premissas que se abre esta discussão.

No dia 14/05, às 20:30, começou esta experiência para os democratas voltarem às ruas e soltar o seu #ForaBolsonaro! represado no peito.

O importante é que as ruas, novamente, sejam recuperadas pelos democratas. Nada mais justo e correto, pois somos a maioria dos brasileiros; somos dezenas de milhões de cidadãos e patriotas!

Estamos em defesa da democracia e da vida! Por isso estamos respeitando o isolamento e o afastamento social. Pois bem, essa é uma proposta. Certamente, os cidadãos desenvolverão, criativamente, e de forma espontânea e responsável milhares de outras alternativas.

O importante é que os democratas voltem a ocupar as ruas!

domingo, 8 de março de 2020

Ditadura nunca mais!

A chave para a compreensão de como Bolsonaro se movimenta politicamente é a sua permanente ação para manter unidos os bolsonaristas de raiz, os que são de extrema-direita como ele. São facilmente identificáveis: defendem regimes autoritários ou ditaduras de direita; estão propondo, neste instante, o fechamento do Congresso e do STF; não têm qualquer apreço pelo Estado Democrático de Direito. São a sua base firme. Notabilizam-se por defender milícias e greves inconstitucionais de PMs. Proclamam estar a postos, seja para ameaçar as instituições democráticas ou, mesmo, para reeleger Bolsonaro em 2022.

Bolsonaro fez uma troca. Preferiu ficar com esses fiéis radicais, a manter o apoio da maioria dos seus eleitores, os democratas que votaram nele para impedir que o PT voltasse ao governo. Claro, estes são muito abstratos, pois não os vê quando frequenta a porta dos quartéis para fazer suas panfletagens!

Manifestação de mulheres lutando contra a censura durante a ditadura militar. Hoje, domingo, 8 de março de 2020, comemora-se o Dia Internacional da Mulher
Ofereceu a cabeça de Moro, a quem traiu, tal como os rabos-presos lhe pediram. Tentou lhe retirar a Segurança Pública (o que só não o fez porque suas bases reagiram) e, se pudesse, já o teria mandado embora. Empenha-se, exercendo sua autoridade, em desmoralizar a Moro; ao tolher a sua ação, abandonou a luta contra a corrupção e a impunidade para proteger o seu clã; em sua mediocridade, o vê apenas como um concorrente, e mostra-se enciumado com sua popularidade. Felizmente Moro não perde o foco e tem uma paciência infinita!

Tem pago custos altos por isso: rachou com o PSL; demitiu o Bebbiano e o Gal Santos Cruz; rompeu com a Joice Hasselmann; perdeu parte de sua base parlamentar e recebe críticas de pessoas influentes  que antes lhes eram simpáticas, tal como a Janaina Paschoal; em consequência, vê a sua base democrática na sociedade diluir-se, como constatado pelas pesquisas de opinião. Parece não se importar em perde-los.

Ao convocar a manifestação do dia 15/03, já está provado que não foi porque não pudesse acertar os ponteiros com o Congresso em torno de questões orçamentárias, pois já negociou uma solução. Mas nega, convenientemente, essa pacificação, pois joga no confronto e na radicalização.

Na verdade, a manifestação tem como objetivo dar um tranco no Congresso e no STF e impor uma nova ordem. Apoia-se nos que defendem e querem uma ditadura. Tenta recuperar a iniciativa que julga ter perdido em busca de mais poderes, pois já há algum tempo, em sua louca paranóia, vê-se cercado de inimigos e acuado.

Faltando-lhe a visão de estadista, quer resolver “no pau”, em confronto de rua, o que não pode vencer com estratégia, planejamento, política e exercício digno dos imensos poderes constitucionais que um presidente tem, e em harmonia com os demais poderes.

Chama os seus radicais para um combate contra as instituições do Estado Democrático de Direito; passa longe de sua pauta propostas de reformas democráticas, e não vê as manifestações cívicas como formas pacíficas de aperfeiçoa-las, mas como instrumentos de força para subjuga-las como se tivessem que decidir com um fuzil apontado para suas cabeças; tudo o que conseguem propor é um Estado miliciano baseado na intolerância e na violência!

Se posicionariam o presidente, e os seus filhos Flavio e Eduardo Bolsonaro, nesta manifestação, a favor da prisão em 2ª instância? Claro que não, isto já saiu da pauta dos membros do seu clã!

Pensa ter apoio militar para isso, e não lhe faltam os puxa-sacos, como o Gal Heleno. Mas, se esse jogo de risco der errado, e se os generais não lhe derem apoio, como já está acontecendo com seus eleitores democratas, ele terá somado vigorosos pontos para a auto-desmoralização e para uma irrecuperável perda de confiança dentre os brasileiros.

O mais importante é que não podemos ficar passivos diante desses ataques ao Estado Democrático de Direito. Se fecharmos os olhos, por covardia, ingenuidade ou condescendência, estaremos deixando que cresça um monstro que poderá destruir a democracia tão duramente conquistada.

Desejamos isso para o Brasil? Claro que não! É necessário, portanto, que o presidente tenha compostura!

terça-feira, 3 de março de 2020

Carta aos democratas que votaram em Bolsonaro

Prezados eleitores democratas de Bolsonaro,

Permitam-me abrir uma discussão com vocês. Observem que não me considero dono da verdade e não me arrogo trazer para vocês certezas absolutas, pois o futuro é sempre cercado de incertezas. Além disso, em momentos de crise aumenta a imprevisibilidade. Se não existissem já muitos fatores que aumentam essas incertezas, some-se, ainda, as trazidas pela pandemia do coronavírus.

Passeata dos 100 mil, em 26 de junho 1968 no Rio de Janeiro. Foi a primeira manifestação de massas contra a ditadura militar. Ocorreu espontaneamente no dia seguinte ao assassinato do estudante secundarista Edson Luís durante repressão da PM no restaurante estudantil do Calabouço (*). 
Em primeiro lugar, permitam-me dizer que não podemos confundir os eleitores de Bolsonaro com o próprio Bolsonaro, pois, como verão, movem-se com lógicas diferentes.

Dele já sabemos, não porque eu queira isso, mas porque o seu pensamento político é um dos mais bem documentados por suas palavras e ações, que Bolsonaro é de extrema-direita e que tem um verdadeiro fascínio pelos ditadores e pelas ditaduras.

Mas pensam assim todos os seus eleitores? Uma parte sim, a estes eu denomino de “bolsonaristas de raiz”, pois o têm como líder e o merecem. São todos deste tipo? Acho que não, estes são apenas a minoria dos seus eleitores.

A maioria dos seus eleitores são democratas, que votaram nele para garantir a alternância do poder e para impedir que o PT voltasse ao governo.

Democratas, tenham votado ou não em Bolsonaro, não defendem ditaduras e somente querem viver em um Estado Democrático de Direito.

Então, qual o problema da manifestação do dia 15/03? Em primeiro lugar ela não está sendo convocada pelos democratas, mas por Bolsonaro e pelos bolsonaristas de raiz. Em segundo lugar, o seu objetivo é “enquadrar” duas instituições do Estado de Direito, o Congresso e o STF; não para pressiona-las para que apoiem pautas éticas, como a prisão em 2ª instância, ou para aperfeiçoa-las enquanto instituições democráticas, mas para submete-las ao arbítrio do poder executivo.

Vamos ser francos, essa manifestação é para dar mais poderes discricionários ao presidente Bolsonaro! Existiria algum impasse entre o Poder Executivo e os poderes Legislativo e Judiciário que não possa ser resolvido por meio da negociação? Claro que não!

Apenas concepções que não conseguem conviver com os valores da democracia acham isso impossível!

Todos os democratas sabemos que este é o objetivo da manifestação. E sabem disso, em primeiro lugar, os que estão convocando a manifestação! Mas, para surpresa de todos são, exatamente, os primeiros a negá-lo!

Claro, isso é muito estranho! Por isso, caros amigos, esses são os meus argumentos para que os democratas - todos, de todos os matizes - fiquem longe dessa manifestação! O sagrado direito de estar nas ruas, de protestar e de manifestar-se carece de qualquer legitimidade se for para romper com o valor maior do Estado Democrático de Direito!


Carlos Alberto Torres
3 de março de 2020

______
(*) Tive a honra de participar desse evento histórico quando cursava o 3º ano do Curso de Engenharia da UFRJ.

O desmonte do combate à corrupção

Este material foi postado por Deltan Dallagnol em sua página no Facebook. Eu o reproduzo aqui pois é uma  referência importante para os que reconhecem o caráter democrático da luta contra a impunidade.

Sem dúvida o Congresso Nacional e o STF, em aliança com Bolsonaro, têm sido responsáveis pelos retrocessos ocorridos no combate à impunidade. Esses retrocessos têm ocorrido por decisões legislativas e do STF com poder normativo.

Bolsonaro, por sua vez, faz cara de paisagem e atua continua e decisivamente para limitar a ação do ministro Sergio Moro. Sua intenção é retirar-lhe todo o poder de promover o aperfeiçoamento das instituições jurídicas democráticas para a luta contra o crime. Somente não mandou Moro embora porque não quis pagar o desgaste que isso acarretaria em suas próprias bases. Mas, passo a passo, vai tentando enfraquece-lo. No outro dia, quase retirou a Segurança Pública do seu ministério, no mais absurdo acordo - com sabor de traição - com alguns Secretários de Segurança Estaduais, inclusive do PT. Consta que sua intenção é recriar o Ministério da Segurança Pública e nomear como ministro o seu amigo da bancada da bala, o Cel Alberto Fraga da PM/DF.

Deltan Dallagnol:

"Desde o início de fevereiro, tenho publicado uma série de artigos na Gazeta do Povo sobre o Desmonte do Combate à Corrupção (veja o primeiro link abaixo). O que está acontecendo causa indignação. Estou trazendo informações para que a sociedade conheça os problemas e as possíveis soluções e se envolva na discussão. Vou compartilhar aqui em sequência os links para que você possa acompanhar:

O desmonte do combate à corrupção


Nova lei de abuso de autoridade prejudica o combate à corrupção


A colaboração premiada e o combate à corrupção sob ameaça


Juiz de garantias: o que você precisa saber


A regra de que os réus delatados falem por último causa quanta demora e impunidade?


Anulado processo de Pasadena, a refinaria que enterrou bilhões de reais