sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Mapa dos sistemas eleitorais do mundo

Abaixo, dois úteis infográficos sobre os sistemas eleitorais produzidos pelo departamento de infográficos da Globo (https://oglobo.globo.com/infograficos/). Apresento-os aqui como subsídios e referência aos que estão debruçados sobre o esforço de entender as nuances de nosso sistema político. Naturalmente, espera-se que sua utilização por cada um não deixe de observar que esses trabalhos são de um veículo de opinião; portanto, não se deve esperar o rigor de um departamento oficial de estatística. Mas serve - e é como eu os utilizo - como uma valiosa fonte de informação.


(1) O Mapa dos sistemas eleitorais do mundo é um gráfico interativo para ser consultado on-line (http://infograficos.oglobo.globo.com/brasil/mapa-dos-sistemas-eleitorais-no-mundo.html). Abaixo, é apresentada a sua imagem, que, por si só, já tem importância descritiva no exame das cores.



(2) O infográfico Como funcionam os sistemas eleitorais (https://oglobo.globo.com/brasil/infografico-veja-como-funcionam-os-sistemas-eleitorais-21690671), não interativo, é útil para acompanhar as discussões que se dão no presente momento sobre a Reforma do Sistema Político.


 

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Razões da crise e reforma política

A discussão sobre o sistema político-partidário-eleitoral tem sido sonegada à sociedade. Entretanto, desde o dia 09/08/17 e, provavelmente, até o final de setembro, estará sendo votada a reforma eleitoral relatada pelo deputado Vicente Cândido (PT/SP). Na verdade, a proposta, que veio à luz esta semana, já vinha sendo objeto de intensas discussões a portas fechadas e na calada da noite há vários meses!

A grande aliança e convergência dos maiores partidos, o PT, o PMDB, PSDB, DEM, o PP, e da nuvem de partidos menores que compõem o centrão, para apoiar os termos centrais do relatório, já se verificou no início das votações da Comissão Especial para a Reforma política da Câmara. Isto revela que os políticos e partidos estão unidos em "santa aliança" para montar, com a reforma, a sua principal estratégia de sobrevivência para 2018. Será a reforma sob medida para a reeleição dos donos de partidos e de seus respectivos caciques enrolados na Lava-Jato.

A principal é a proposta de criação de um inovador e infame "Fundo de Financiamento da Democracia" de R$3,6 bilhões para sustentar as suas milionárias campanhas eleitorais. Não é idéia nova. O artigo a seguir, do sociólogo Caetano Araújo, nos traz importantes elementos para essa discussão.

Caetano Araujo (*)

A crise ocupa há tempo o centro do debate no país. Em poucos anos rachaduras na fachada ética da política e alertas na economia transformaram-se numa situação de extrema instabilidade, que ameaça tragar boa parte do sistema partidário. Discute-se hoje, principalmente, os lances mais recentes do processo, seus impactos já verificados e, principalmente, num quadro de grande incerteza, diferentes prognósticos alternativos sobre o futuro imediato, geralmente na perspectiva de suas consequências políticas e eleitorais.


Menos atenção tem recebido, no entanto, a questão, crucial, da gênese da crise. Em outras palavras, como chegamos ao ponto em que estamos hoje? Procuro desenvolver aqui uma resposta tentativa, o embrião de uma hipótese a ser trabalhada. No meu argumento, a origem da crise deve ser buscada em duas dimensões diferentes: (1) o sistema de regras que regula as eleições e (2) as decisões estratégicas dos principais atores políticos do país nos últimos anos. Falo, nesse caso, dos maiores partidos brasileiros, com o evidente protagonismo do Partido dos Trabalhadores, vencedor das últimas quatro eleições para Presidente da República.


Vamos às regras

Praticamos no Brasil nas eleições para deputados (federais, estaduais e distritais) e vereadores o sistema de voto proporcional com listas abertas. Nele os eleitores podem votar em legendas ou em candidatos das listas apresentadas pelos partidos políticos. As listas não são pré-ordenadas, de modo que o total de votos de cada partido (soma dos votos da legenda e de todos os nomes) determina o número de cadeiras que cada um obteve, enquanto a entrada dos candidatos é definida pela ordem decrescente dos votos obtidos.

Importa lembrar que esse sistema é uma invenção genuinamente nacional. Foi formulado por Assis Brasil, na década de 1930, com o objetivo de conciliar o voto em partidos, característico para ele de democracias modernas, com o voto em pessoas, que vigorou durante o Império e a República Velha. É usado entre nós desde 1945, de modo que muito provavelmente não há eleitores brasileiros vivos que tenham conhecido outro sistema.

Na comparação internacional, o sistema não teve tanto sucesso. Apenas a Polônia e a Finlândia nos acompanham hoje. A grande maioria dos países democráticos escolheu entre três outras alternativas:
  1. votar em pessoas, adotando o voto distrital;
  2. votar em partidos, com o voto proporcional em listas fechadas ou flexíveis;
  3. ou votar em pessoas para uma parte das cadeiras e em partidos para a outra parte, nos sistemas chamados mistos.
São conhecidas as críticas ao nosso sistema: personalização das campanhas, com as contrapartidas inevitáveis de sua despartidarização e despolitização; campanhas caras; influência do poder econômico; déficit de legitimidade junto aos eleitores.

Como sabemos, tudo isso é verdade. Aqui candidatos arrecadam e gastam recursos de forma autônoma e concorrem todos contra todos, principalmente contra seus companheiros de legenda. O foco de suas campanhas não é apresentar uma plataforma partidária comum, mas os pontos de singularidade política que os diferenciam dos demais candidatos de seus partidos.

Os poucos dados disponíveis mostram que as campanhas eleitorais no Brasil são as mais caras do mundo e seu custo foi crescente, pelo menos até a recente exclusão das empresas do universo de doadores de recursos. Não são de surpreender, portanto, as evidências do uso crescente de recursos não declarados, portanto ilegais.

Os legislativos que saem dessa peneira são dispersos, fato que acumula dificuldades para presidentes, governadores e prefeitos construírem suas bases de apoio. Não por acaso, todos os presidentes eleitos depois de 1988 foram favoráveis à reforma política.

Para os eleitores, o resultado da dispersão significa perda em termos de fiscalização e controle sobre os parlamentares:
  • No sistema de voto distrital essa fiscalização é exercida diretamente porque os eleitores sabem exatamente quem é o deputado que os representa.
  • No sistema de voto proporcional com listas fechadas ou flexíveis a fiscalização é feita por intermédio dos partidos, que são eleitos a partir de uma plataforma e zelam pelo cumprimento do pacto eleitoral por parte dos deputados.
  • No nosso sistema de voto proporcional com listas abertas, a fiscalização direta dos eleitores é difícil, porque o eleitor não pode determinar quem é o seu representante e a fiscalização partidária impossível, por não haver os partidos fortes de que necessitaria. 
  • Em compensação, a fiscalização por parte dos financiadores das campanhas é permanente, uma vez que as duas partes se conhecem, sabem quanto foi aportado e a sua importância para trazer o deputado à cadeira que ocupa. Portanto, tampouco é por acaso que legislativos, parlamentares e partidos são campeões na desconfiança dos eleitores, segundo as pesquisas disponíveis.
Esses problemas foram camuflados no passado, em situações em que o número de eleitores era menor, como no período 1945/1964, e as restrições à liberdade de imprensa maiores, como na ditadura militar posterior a 1964.

A Constituição de 1988, contudo, consagrou uma série de avanços democráticos que se revelaram incompatíveis com a continuidade da nossa regra eleitoral: sufrágio universal, liberdade de imprensa e autonomia do Ministério Público. A contradição entre a regra eleitoral e os avanços da Constituição é demonstrada pela sequência de escândalos ligados ao financiamento da política no país a partir da década de 1990. Para ficar só nos principais, tivemos, sucessivamente, o impedimento de Collor, os anões do orçamento, as operações Satiagraha e Castelo de Areia, o mensalão e, agora, a lava jato, ainda em curso.
Em síntese, nossa regra eleitoral gera um ambiente de competição na qual partidos e candidatos que recusam qualquer recurso de campanha de origem não legal têm dificuldade crescente de concorrer com aqueles que se integram a esses canais de financiamento. Quando isso ocorre a corrupção política deixa de ser residual, ou seja, algo que pode ou não ocorrer em determinado pleito, e passa a ser estrutural.
Resta indagar as razões da persistência dessa regra por quase três décadas. Penso que a resposta deve ser procurada nas estratégias de alianças desenvolvidas pelos maiores partidos brasileiros, em especial o PT.


Estratégias de alianças desenvolvidas pelos maiores partidos brasileiros, em especial o PT

Hoje a situação parece improvável, mas no período entre a posse e a queda de Collor ganhou corpo uma tendência à aliança entre PT e PSDB para as eleições presidenciais seguintes. Essa tendência começou a perder força com a opção do PT de não participar do governo Itamar e, principalmente, com o lançamento do Plano Real, duramente criticado pelo partido. Nos dois mandatos de Fernando Henrique o PT fez oposição sistemática a toda a agenda modernizante do governo e a possibilidade de aliança ficou mais distante.

No início do governo Lula a situação havia mudado. Depois de uma pauta de campanha que aceitou o processo de estabilização da economia, com todas as suas implicações; de uma transição de governo bem-sucedida; da defesa, ainda que tímida, de uma agenda reformista que contou com o apoio do PSDB, na oposição, e do PPS, então no governo.

Uma janela de oportunidade para uma nova política de alianças do PT parecia aberta. Contra essa nova política, pesavam dois fatores importantes: a forte resistência das bases do PT, educadas num discurso político salvacionista, e a oferta permanente de apoio, mais fácil e imediato, de uma grande massa de deputados situados politicamente entre o fisiologismo e o conservadorismo.
O momento decisivo para a definição ocorreu no início de 2003, quando a proposta de reforma política apoiada por PT, PSDB, PFL, PDT, PSB e PPS, de listas fechadas com financiamento público de campanha, estava a ponto de ser votada em plenário. Por pressão dos demais partidos, o PT retirou seu apoio ao projeto, enterrou a reforma política e demarcou seu campo de alianças, tendo como principal referência aliada a centro-direita conservadora.
Vale lembrar que esse movimento do PT não apenas assegurou mais 15 anos de vigência à regra eleitoral, mas, como a aliança replicou-se nos estados, deu sustentação política a velhas elites regionais e, consequentemente, a suas bancadas parlamentares, concentradas nos partidos contrários à reforma.
O PT teve uma segunda oportunidade de redirecionar sua política de alianças. Em 2013, na onda das manifestações populares, que tinham na mudança da política um dos pontos centrais de reivindicação, a presidente Dilma poderia ter encabeçado uma ampla concertação parlamentar pela reforma política. Ao invés de fazê-lo, optou por insuflar propostas diversionistas que em nada resultaram, como plebiscito ou constituinte exclusiva.

Parece evidente hoje que essa política redundou num fracasso completo. Poderia ser avaliada como um sucesso parcial se os objetivos do governo fossem manter inalterado o status quo econômico, social e político do país. No entanto, à luz dos objetivos declarados nas campanhas do PT, ou seja fazer avançar a democracia e recuar a pobreza e a desigualdade, essa política de alianças deve ser reprovada em toda linha.

Além disso, nas duas variantes que se sucederam, a aliança com o chamado “centrão” aumentou a vulnerabilidade do partido. A tentativa, no primeiro governo Lula, de governar com o seu apoio do PMDB, mas sem a sua participação proporcional, resultou no mensalão. A incorporação do PMDB no governo, por sua vez, alimentou a lava jato.

Se essa política deve ser vista com as informações de que dispomos hoje, como um erro colossal, como compreender sua adoção e manutenção por anos a fio?
É claro que alguns sucessos do governo Fernando Henrique e do primeiro período de Lula alimentaram a visão da política brasileira como o palco no qual dois partidos programáticos gerenciavam o apoio do fisiologismo. Essa imagem de Werneck Vianna, muito citada por Fernando Henrique, descrevia bem a situação do momento. Nada dizia, contudo, sobre a sustentabilidade desse arranjo no médio prazo.
Podemos especular sobre as motivações pragmáticas do PT para se diferenciar do seu concorrente direto nas disputas presidenciais. Podemos ainda discutir uma tendência possível de interpretar o conjunto da política nacional através do prisma da conjuntura paulista.

Penso ser mais produtivo analisar as premissas que podem ser usadas para justificar essa opção. Na minha opinião são três essas premissas, todas devidamente desmentidas pelos fatos:

  • Em primeiro lugar, a preponderância do estado sobre a sociedade. Tributária da ideia antiga que faz depender todo movimento de mudança à condução esclarecida de uma vanguarda, capaz de recolher as demandas populares e processá-las na forma de decisões políticas racionais. Nesse aspecto, as jornadas de 2013 mostraram que alguma coisa não funcionava como previsto.
  • Em segundo lugar, a preponderância do Executivo sobre o Legislativo. Outra ideia antiga que afirma a capacidade de o Executivo impor sua vontade aos legisladores como uma constante da política. O processo de impeachment desmentiu essa premissa, ao menos na sua versão absoluta.
  • Em terceiro lugar, a neutralidade política do fisiologismo, do atraso, do centrão, qualquer que seja o nome dado ao grupo de parlamentares que se posiciona na política mais do lado da oferta, menos no da demanda, de apoio parlamentar. Menos expostos às cobranças partidárias, esses deputados tendem a ser, no entanto, mais sensíveis às demandas dos grupos empresariais que financiam suas campanhas, como ficou demonstrado em diversas votações em que os interesses do governo foram contrariados nos últimos anos.

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(*) Caetano Ernesto Pereira  de Araujo é sociólogo e assessor do Senado.

terça-feira, 8 de agosto de 2017

A reforma política do Vicente Cândido (PT/SP)

Vejam o nome que criaram: "Fundo de Financiamento da Democracia". Uma bagatela de R$3,6 bilhões que se adiciona ao já existente "Fundo Partidário", para financiar as campanhas eleitorais. Este é apenas um dos aspectos da reforma política proposta pelo seu relator, o deputado Vicente Cândido (PT/SP) (*).

Defendo que esse fundo não seja criado, e que não saia dos cofres públicos nem sequer R$1,00 a mais com essa finalidade! Os políticos brasileiros, todos o sabemos, já são exorbitantemente caros para o país!


O seu relatório será votado na Comissão Especial da Reforma Política na quarta-feira 09/08/17. Toda a sua tramitação, e elaboração, cuidadosamente, tem se dado com a cautela de não torná-lo um tema de ampla discussão com a sociedade!

O seu objetivo não é formular uma alternativa ao já superado sistema politico-partidário-eleitoral, que é um dos principais responsáveis pelo bloqueio do desenvolvimento da democracia brasileira.

O atual, é responsável pela baixa qualidade da representação parlamentar, em todos níveis, federal estadual e municipal, onde os eleitos são fundamentalmente os que têm acesso a recursos ilícitos de caixa dois, sustentados pela corrupção e pela dilapidação dos recursos públicos gerados pelos pagadores de impostos.

O que se intenta, elaborado por esses mesmos parlamentares, entretanto, não tem por objetivo aperfeiçoa-lo, mas de salvá-los nas próximas eleições de 2018. Em particular, proteger aos donos de partidos e seus caciques, para permitir a sua reeleição e impedir a renovação parlamentar necessária!

É necessário que os democratas, já cansados da longa crise, não julguem essa questão como de menor importância! Nem menos, que se abandonem em um pessimismo de que nada se possa fazer para que uma reforma melhor possa ser alcançada!

É hora de luta e de mobilização!


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Quem é Vicente Cândido?

(1) Wikipedia:

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Convicção e esperança

Fernando Henrique Cardoso (*)
O Estado de S. Paulo, Opinião, 06 Agosto 2017

"... O quadro desastroso – quase 30 partidos atuando no Congresso, separados não por crenças, mas por interesses grupais que se chocam na divisão do bolo orçamentário e no butim do Estado – isola as pessoas e os líderes, enclausurando-os em partidos que se opõem uns aos outros sem que se veja com clareza o porquê."

É hora de sonhar com 2018, deixar de lado o desânimo e preparar o futuro



Escrevo antes de saber o resultado da votação pela Câmara da autorização para o STF poder julgar a denúncia oferecida pelo procurador-geral contra o presidente da República. É pouco provável que a autorização seja concedida. Houve precipitação da Procuradoria, que fez a denúncia sem apurações mais consistentes. Entretanto, para o que desejo dizer, pouco importa a votação: a denúncia em si mesma e a fragmentação dos partidos no encaminhamento da matéria já indicam um clima de quase anomia, no qual algumas instituições do Estado e os partidos políticos se perderam.

Esta não é uma crise só brasileira. Em outros países onde prevalecem sistemas democrático-representativos também se observa a descrença nas instituições, por seu comportamento errático, sobretudo no caso dos partidos. Mesmo nos Estados Unidos, na Inglaterra ou na França – países centrais na elaboração de ideologias democráticas e na formação das instituições políticas correspondentes – se nota certa falta de prestígio de ambas. Não falta quem contraste as deficiências dos regimes democráticos com as supostas vantagens dos regimes autoritários e mesmo ditatoriais.

O contraste é falacioso, sobram exemplos de ineficiência nos regimes autoritários, sem falar na perda da liberdade, individual e pública, cujo valor não pode ser medido em termos de eficiência dos governos. Nem faltam casos para mostrar o quanto podem levar ao desastre os regimes que de autoritários passam a ditatoriais, como na Turquia atual ou, mais impressionantemente ainda, na Venezuela, onde acontece um verdadeiro horror perante os céus. Nela, a inexistência das garantias democráticas se soma ao descalabro econômico-financeiro.

Não é, contudo, o caso do Brasil. Houve, é certo, a perda de controle das finanças públicas pelo governo anterior. Mas nunca se chegou a ameaçar diretamente a democracia. Aqui o que houve foi a generalização e a sacralização da corrupção, com as ineficiências decorrentes, aprofundando a perda de confiança popular no governo e na vida política. Nesse sentido, estamos imersos num mar de pequenos e grandes problemas e tão atarantados com eles que somos incapazes de vislumbrar horizonte melhor. É isso o que mais me preocupa, a despeito da gravidade tanto dos casos de corrupção quanto dos desmandos que vêm ocorrendo.

Falta alguém dizer como De Gaulle disse quando viu o desastre da Quarta República francesa e a derrocada das guerras coloniais: que era preciso manter uma “certa ideia da França” e mudar o rumo das coisas. Aqui e agora, guardadas as proporções, é preciso que alguém – ou algum movimento – encarne uma certa ideia de Brasil e mude o rumo das coisas. Precisamos sentir dentro de cada um de nós a responsabilidade pelo destino nacional. Somos 210 milhões de pessoas, já fizemos muito como país, temos recursos, há que voltar a acreditar no nosso futuro.

Diante do desmazelo dos partidos, da descrença e dos fatos negativos (não só a corrupção, mas o desemprego, as desigualdades e a falta de crença no rumo) é preciso responder com convicções, direção segura e reconstrução dos caminhos para o futuro. Isso não significa desconhecer que existam conflitos, incluídos os de classe, nem propor que política se faça só com “os bons”. Significa que chegou a hora de buscar os mínimos denominadores comuns que nos permitam ultrapassar o impasse de mal-estar e pessimismo.

Infelizmente, os partidos, sozinhos, não darão respostas a essa busca. O quadro desastroso – quase 30 partidos atuando no Congresso, separados não por crenças, mas por interesses grupais que se chocam na divisão do bolo orçamentário e no butim do Estado – isola as pessoas e os líderes, enclausurando-os em partidos que se opõem uns aos outros sem que se veja com clareza o porquê.

Penso que o polo progressista, radicalmente democrático, popular e íntegro precisa se “fulanizar” numa candidatura que em 2018 encarne a esperança. As dicotomias em curso já não preenchem as aspirações das pessoas: elas não querem o autoritarismo estatista nem o fundamentalismo de mercado. Desejam um governo que faça a máquina burocrática funcionar, com políticas públicas que atendam às demandas das pessoas. Um governo que seja inclusivo, quer dizer, que mantenha e expanda as políticas redutoras da pobreza e da desigualdade (educação pública de maior qualidade, impostos menos regressivos, etc.); que seja fiscalmente responsável, atento às finanças públicas, e ao mesmo tempo entenda que precisamos de maior produtividade e mais investimento público e privado, pois sem crescimento da economia não haverá recuperação das finanças públicas e do bem-estar do povo.

Um governo que, sobretudo, diga em alto e bom som que decência não significa elitismo, mas condição para a aceitação dos líderes pelos que hão de sustentá-los. Brizola, referindo-se a Lula, disse que ele era a “UDN de macacão”, lembrando a pregação ética dos fundadores do PT. Infelizmente, Lula despiu o macacão e se deixou engolfar pelo que havia de mais tradicional em nossa política: o clientelismo e o corporativismo, tendo a corrupção como cimento. Não é desse tipo de liderança que precisamos para construir um grande País.

Ainda que venham a ocorrer novos episódios que ponham em causa o atual governo, e melhor seria que não houvesse, de pouco adianta substituir quem manda hoje por alguém eleito indiretamente: ao líder faltaria o sopro de legitimidade dado pelo voto popular, necessário para enfrentar os desafios contemporâneos. É tarde para chorar por impeachments perdidos ou por substituições que nada mudam. É hora de sonhar com 2018 e deixar de lado o desânimo. Preparemos o futuro juntando pessoas, lideranças e movimentos políticos num congraçamento cívico que balance a modorra dos partidos e devolva convicção e esperança à política.

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*Sociólogo, foi Presidente da República

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Peripécias da democracia bloqueada

No dia 02/08/2017, quarta-feira, foi votado no plenário da Câmara dos Deputados a admissibilidade para que o presidente Michel Temer fosse julgado pelo crime de corrupção passiva (*) no STF. A denúncia fora formulada pelo Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, o que obrigou a Comissão de Constituição e Justiça da Camara (CCJ) a pronunciar-se; sua posição foi contrária a do deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ), o relator inicialmente designado. Após sua rejeição, os deputados da CCJ deliberaram sobre um novo parecer, de autoria do deputado Paulo Abi-Ackel, do PSDB-MG, que recomendou ao plenário a rejeição da denúncia contra o presidente Michel Temer. Esse parecer foi aprovado por 41 votos a 24. No plenário, quem votasse SIM ao relatório da CCJ não concederia a permissão; quem votasse NÃO, concederia a permissão.

Naturalmente, todos os que acompanharam a votação na Câmara dos deputados tiveram a oportunidade de conhecer, um a um, por nomes, discursos, fisionomias, partidos e personalidades, a cada um dos deputados que votaram.


Dentre os 21 ausentes foi computado o deputado Rodrigo Maia que não votou exercendo a prerrogativa de presidente da Câmara dos Deputados

Estão certos os que votaram NÃO, a favor do julgamento do presidente Temer no STF, pois colaram-se ao clamor da sociedade de não aceitar mais que haja cidadãos acima da lei, particularmente se ocupam cargos públicos. O número de votos NÃO superou as melhores expectativas! Mas, é preciso que se diga: este número foi bem maior do que os que realmente queriam que Temer fosse julgado.

Os que votaram SIM terão muita dificuldade para explicar o seu voto, e não convencerão ao cidadão de que o fizeram em nome da estabilidade democrática ou da recuperação da economia. Simplesmente, embora insistam nesta explicação, cada vez são em menor número os brasileiros que acreditam nisso.

O que parece ter prevalecido nas motivações reais do voto SIM são: (1) uma polarização político-ideológica que nada mais tem a oferecer ao país; (2) os que preferem a Temer como o seu bandido de estimação, pois não conseguem acreditar em uma "política limpa"; (3) os que venderam os seus votos em troca sabe-se lá de que, mas que serão pagos pelos brasileiros, que em nada foram consultados; (4) os que, por sua concepção da política, não conseguem largar o osso, pois estarão sempre do lado de quem for governo, seja ele qual for, os praticantes da sagrada tradição do patrimonialismo e do fisiologismo. Mas é preciso observar que muitos dos que votaram SIM o fizeram porque os seus partidos fecharam questão.

Dentre os que votaram NÃO está o PT, que, também, perdeu qualquer credibilidade ética para fazer discurso contra a corrupção. Jogaram para a plateia e para o espetáculo, e aproveitaram ao máximo a indefinição do PSDB. Querem que Temer permaneça sangrando até 2018, e já sabiam que o SIM venceria!

O PSDB, embora tenha se posicionado pelo NÃO enquanto bancada, deu o quorum para a votação (como o PT), forneceu o deputado relator do relatório do SIM, e ainda mantém ministros no governo. Foi o principal perdedor, pois está afundado em contradições, dando 22 votos SIM, 21 NÃO, e 4 ausências. Brilhante, não é?

A votação do governo foi baixa para prosseguir com conforto os seus projetos, e Rodrigo Maia reclamou da deslealdade que o setor palaciano revelou com ele nesse processo. Temer, perdeu ganhando! O chamado "custo Temer" está cada vez maior para a sociedade.

Que me perdoem as opiniões em contrário, mas, mesmo que essas considerações ainda estejam sendo feitas no calor dos acontecimentos, não quiz deixar de registrar minhas impressões.


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(*) O crime de corrupção passiva é definido no Código Penal como o ato de "solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem", com pena de 2 a 12 anos de prisão e multa, em caso de condenação.

Na reportagem em anexo no link você poderá encontrar o teor integral da denúncia do PGR:

Como votaram os deputados (02/08/17):

(1) por nomes, estado e partido:
http://www.valor.com.br/sites/default/files/infograficos/Politica/temerCCJ/votos_deputados_Temer_Camara_10000.html.

(2) por estado:
http://g1.globo.com/politica/noticia/veja-como-votaram-os-deputados-por-estado-em-relacao-a-denuncia-contra-temer.ghtml.

(3) por partido:
.http://g1.globo.com/politica/noticia/veja-como-votaram-os-deputados-por-partido-em-relacao-a-denuncia-contra-temer.ghtml


Torneira aberta na Câmara: afinal, quem recebeu quanto do governo Temer?
http://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2017/08/02/denuncia-temer/

Coerência: 108 deputados votaram pelo afastamento de Cunha, Dilma e Temer... https://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/2017/08/06/coerencia-108-deputados-votaram-pelo-afastamento-de-cunha-dilma-e-temer/?cmpid=copiaecola

sábado, 29 de julho de 2017

A democracia bloqueada

A democracia brasileira está bloqueada. O que a bloqueia? Quem são os responsáveis? O que devemos fazer para desbloqueá-la?

Por ser um valor fundamental, a Constituição de 1988 (*), já, no seu artigo 5º, apressou-se em estabelecer:
"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza ..."
Esse preceito é premissa ética para que se realize o sonho republicano da democracia brasileira. O seu cumprimento é condição para eliminar da sociedade brasileira o favoritismo e a discriminação. O favoritismo dá benefícios e privilégios injustificáveis, sem merecimento, a algumas pessoas; a discriminação impõe fardos injustificáveis a pessoas que não são em nada diferentes em direitos daquelas às quais não são impostos os mesmos fardos.


Estranho o valor expresso no caput do artigo 5º da Constituição! Todos concordam unanimemente com ele; afinal, com esta redação, ele já está inscrito na Constituição e ninguém está propondo retirá-lo! Mas ele está longe de ser plenamente cumprido! Cumpri-lo, entretanto, não é apenas uma obrigatoriedade constitucional para com o povo brasileiro, mas uma condição fundamental para desbloquear a própria democracia, rumo ao Brasil necessário e possível. Não queremos apenas extirpar a miséria e a pobreza, queremos um país com alto índice de desenvolvimento humano, para ser, realmente, mais democrático! Um Brasil do qual nos orgulhemos, e no qual os nossos filhos queiram viver!

A democracia brasileira é sólida e resiliente às crises

É necessário, em primeiro lugar, reconhecer que continua viva a força e o vigor do movimento de democratização da sociedade brasileira, que culminou com a Constituição de 88! Ela foi chamada de "Cidadã", por Ulisses Guimarães, porque simbolizou a decisão consciente dos brasileiros de viver em um Estado Democrático de Direito. Este foi um sonho longamente acalentado e duramente conquistado por todos os democratas e pela nação, após ter sido submetida a 21 anos de ditadura. Promulgada, a nova Constituição - que fará 30 anos em 2018 -, produziu uma imensa força de coesão e estabilidade institucional, sem o que a nossa democracia não estaria resistindo às duras provas a que está submetida diante da atual e grave crise. Em síntese, a Constituição realizou-se e consolidou-se como referência simbólica, jurídica e legal, nau segura, para podermos atravessar as tempestades!

Contribui, também, fortemente, para a estabilidade de nossa democracia, o fato de estarmos inseridos em um mundo novo, cheio de conflitos e violência, é verdade, mas que, em toda parte, anseia por mais democracia. Isso, nos exigirá trabalhar com novos paradigmas, pois neste novo mundo os indivíduos interagem, em rede, com o uso das novas tecnologias de comunicação. As informações são abundantes e, com o auxílio da nova ciência dos dados e da inteligência artificial, expandem-se as conquistas científicas em todas as áreas. Isto está mudando o mundo do trabalho, as relações sociais e as próprias ciências sociais. As possibilidades de educação, aprendizado e busca de conhecimento se expandiram vertiginosamente, a nível global, com a educação à distância e o surgimento de iniciativas como os MOOC’s (**), onde se pode estudar quase gratuitamente nas melhores universidades do mundo. Isto está articulando e aproximando, globalmente, a todos os povos do mundo. Problemas novos e antigos estão sendo resolvidos, e novas formas de convivência, de comportamento - e novos valores - estão a emergir. Este mundo novo não está batendo à nossa porta, ele já entrou, até em nossa casa, sem pedir licença, mesmo que ainda não o tenhamos percebido!

Se é correta essa hipótese, de que fatores endógenos e exógenos se somam para garantir a estabilidade de nossas instituições democráticas, não é hora de nos deixarmos assaltar por medos que nos aprisionam em soluções conservadoras, e que bloqueiam o desenvolvimento da nossa democracia. É hora de avançar! E precisamos, para isso, colocar o dedo na ferida, caso contrário corremos o risco de perdermos a oportunidade história que se oferece!

O favoritismo e a discriminação coexistem juntos. Elas estão dentro das relações sociais. Podem estar relacionadas às relações de poder político e econômico, mas, também, a causas relativamente autônomas a estas, como a incapacidade de conviver com o diferente sem intolerância ou preconceito. Nos últimos 30 anos a luta contra as discriminações vinculadas às diferenças e ao preconceito com relação às minorias de gênero, raciais, de orientação sexual, etc., obteve grandes vitórias, embora este seja um processo em andamento e muito ainda se tenha que avançar.

Mas, neste mesmo tempo, pouco a democracia brasileira avançou para coibir o favoritismo e as discriminações derivadas das relações de poder político e econômico. Continuamos a ser o país do favoritismo, cuja manifestação mais evidente é a impunidade dos crimes cometidos pelos poderosos, enquanto restam discriminações avassaladoras, que se revelam, da forma mais perversa, quando constatamos que a justiça pune, sim, quase que exclusivamente aos criminosos pretos, pobres e miseráveis!

Nesta etapa, para desbloquear o desenvolvimento da democracia brasileira, a tarefa que clama pelas energias e a união de todos os democratas é acabar com os favoritismos derivados do poder político e econômico. Isso não é tarefa fácil, pois as resistências começam por nós mesmos; elas não são apenas objetivas e políticas, mas também subjetivas e culturais. É uma tarefa para todos os democratas, os que conquistamos a Constituição de 88, mas, sobretudo, para as novas gerações, principalmente a juventude, que será a principal protagonista desse processo. Este texto, tem como objetivo fazer apenas um esboço dessas questões tão complexas.

O que bloqueia a nossa democracia?
1. A impunidade dos crimes de colarinho branco. A impunidade dos poderosos atravessa a história brasileira. E ela sempre foi prejudicial ao país. Mas foi a Constituição de 88 que gestou, pouco a pouco, as condições para que surgisse uma nova geração de policiais federais, procuradores e juízes, concursados, compromissados com a missão de dar fim à impunidade dos crimes de colarinho branco. Isso se seguiu aos avanços que foram se acumulando na legislação penal para o combate à corrupção, tanto interna quanto internacionalmente, à aprovação da lei da ficha-limpa, à efetiva atuação do STF no julgamento do mensalão e ao desenvolvimento de sistemas sofisticados, baseados em inteligência artificial, para o tratamento de grandes volumes de dados relacionadas ao fluxo do dinheiro originado de operações ilícitas no Brasil e no exterior.
A Operação Lava-Jato foi consequência desse acúmulo da democracia brasileira. Ela desnudou, como nunca se fizera antes, o papel da corrupção para financiar a conquista e a manutenção do poder político. Esta é a sua importância histórica. Em particular, após a chegada do PT ao poder em 2002, com os fatos trazidos à luz pelo mensalão e pelo petrolão, ficou evidenciada a existência de um sistema inovador, o da "corrupção estratégica”, orientada por um projeto político, e por possuir um comando e planejamento centralizado para atingir os seus objetivos. Ela se diferencia da velha e conhecida "corrupção laissez faire", que não possui comando ou planejamento centralizado. Os desvios revelados pela aliança de políticos e empresários, em que partidos e corporações empresariais formaram, sistemicamente, organizações criminosas, está documentado e provado fartamente pelas operações judiciais.
Alguns dos políticos mais poderosos da republica estão denunciados, alguns se transformaram em réus e outros já estão condenados. São o ex-presidente e o atual presidente da república, ex-presidentes da Câmara, ex-governadores, governadores, etc. 
Pelo lado empresarial, estão envolvidos os donos das maiores empreiteiras nacionais. Alguns destes, junto com os seus diretores, já estão condenados e fizeram acordos de colaboração premiada. 
Em aliança criminosa, políticos e empresários dilapidam os organismos do estado, a previdência, os fundos de pensão, as empresas estatais, e estendem as suas garras à administração pública direta e indireta nos níveis federal, estadual e municipal; e desmoralizam as instituições, levando a política e a justiça ao descrédito. 
Este tipo de impunidade dos de cima tem se revelado insaciável pelos valores que desviam. A corrupção, em si, tem tido um forte peso causal na gestação da própria crise econômica. Exemplo mais claro é o que está acontecendo no Estado e na cidade do Rio de Janeiro. 
Sem que a justiça seja igual para todos, tem, ademais, um efeito de vetor que se difunde e propaga, como exemplo moral às avessas, para todos os setores da sociedade; compromete a ação policial, marginaliza-a, e torna impossível combater eficazmente o crime e a violência, particularmente o crime organizado vinculado ao tráfico; a violência e a insegurança invadiu as ruas e os lares, e vitima inocentes, mesmo nas cidades mais pacíficas; em consequência, os presídios foram transformados nos exemplos mais acabados de uma sociedade discriminatória, e de armazenagem e depósito, indigno, de criminosos pobres, pretos e miseráveis. 
Desbloquear, portanto, a democracia brasileira, passa por usar e aperfeiçoar a legislação para enfrentar a criminalidade, particularmente os criminosos de colarinho branco, começando por aí, como força de exemplo, pois são os mais perigosos e prejudiciais ao Brasil.
2. A legislação do sistema político-partidário-eleitoral. Esta legislação impede alcançar o objetivo de eleger uma representação política de qualidade, tanto no poder executivo quanto no legislativo em todos os níveis. Na verdade, essa legislação evoluiu para o seu contrário. Torna-se, portanto, necessário mudá-la, para dar acesso à eleição de candidatos cujos patrimônios maiores sejam a sua representatividade social, e não o volume de recursos financeiros que disponham. E como passaram a ser fundamentalmente ilícitos, isso tem como consequência a derrota de candidatos concorrentes em disputa desleal.
O ideal da democracia, de eleger representantes comprometidos com o bem comum, foi bloqueado. 
A reforma política ora em gestação na Câmara, na calada da noite, agravará este problema, pois tem como objetivo aumentar a probabilidade de reeleger os que lá já se encontram, provendo mais recursos públicos para a campanha - alguns bilhões a mais -, e aumentar o controle dos caciques e donos dos partidos com a adoção do "distritão" e a introdução da votação em listas fechadas. 
Portanto, para desbloquear a democracia, é essencial aperfeiçoar a legislação eleitoral, para coibir a entrada de recursos ilícitos nas campanhas eleitorais, para diminuir o seu custo, e para torna-las concorrências limpas. A sociedade teria que ter a coragem e a clareza para dizer neste momento: "recursos adicionais zero, pois vocês já são exorbitantemente caros para a nação!" 
Temas candentes estão precisando ser enfrentados. Eles não são fáceis para o cidadão comum: o parlamentarismo, o voto distrital, a distribuição equitativa dos tempos de televisão, etc.. O que é certo é que são indispensáveis, e precisam ser enfrentados.

Quem bloqueia a democracia?

Por óbvio, são os maiores partidos, o PT, o PMDB e o PSDB, em aliança com uma nuvem de médios e pequenos partidos.
Atuam em causa própria para voltarem em 2018, articulando a fajuta "reforma política" já citada acima.
Mas, a sua atuação mais perniciosa, para o bloqueio da democracia, é que os maiores partidos, agregando a maioria dos parlamentares na Câmara dos Deputados e no Senado, são os que mais temem e combatem a Lava-Jato. Esta foi declarada o seu inimigo comum; por isto formam uma "santa aliança" de caráter suprapartidário e supra ideológico para combatê-la. Nas reuniões partidárias de caráter público evitam falar dela para não demonstrar o seu desconforto. Mas, a portas fechadas, as cúpulas partidárias muito falam dela, exatamente para montar estratégias para combatê-la!
Têm boas razões para isso, pois as suas principais lideranças foram citadas nas colaborações premiadas dos empresários; alguns já são réus e outros já perderam seus mandatos; alguns já foram condenados, e outros estão em prisão preventiva ou já cumprindo pena. Agarram-se ao foro privilegiado para não serem processados, e fogem, como o diabo da cruz, dos juízes de 1ª instância. Impedem a aprovação de medidas para o aperfeiçoamento da legislação anticorrupção (vide "As dez medidas contra a corrupção"), e agora, na calada da noite, já estão trabalhando em modificações regressivas do Código Penal para prejudicar ou impedir as apurações. 
Neste instante, com as honrosas exceções de sempre, dedicam-se à operação “salva Temer”. Está montado, diante dos nossos olhos e da nação, um balcão de negócios para impedir que o presidente Temer seja julgado por crimes que todos nós sabemos que cometeu! O nosso sistema político, e a nossa cultura, está em vias de permitir que esse cidadão continue como presidente de nosso país! Será? 
Não faltam argumentos aos engajados nesta operação; aqui, é em nome da estabilidade democrática; ali, é em nome da recuperação da economia; acolá, é porque as leis, o regimento interno da Câmara, e a prerrogativa de ter o poder de caneta de Presidente, lhe permite fazer as negociatas que está fazendo para se manter no cargo, se valendo dos cargos e verbas públicas que, naturalmente, não são seus! Quanto a este último argumento, dizem que FHC, Lula, Dilma, que todos em toda parte do mundo, usam e usaram dessa prerrogativa! Mas, o que pesa, também, fortemente, e isto não podem dizer, e o que já acontecera no fim do governo Dilma, é que não querem largar o osso, e deixar de mamar nas magras tetas da viúva! 
Mas é necessário dizer, com todas as letras, que Temer perdeu as condições morais para continuar governando! Quando, para nós, brasileiros, isso será razão suficiente? 
Estranho o nosso país: possui uma estabilidade democrática firme para enfrentar as tempestades; possui um parlamento livre e aberto sem o qual não existe democracia; possui uma imprensa livre e não amordaçada; possui um poderoso judiciário independente. Mas, possui um sistema político-partidário-eleitoral ultrapassado e doentio, que é o principal responsável pelo bloqueio do desenvolvimento da democracia brasileira!

O que podemos fazer para desbloquear a democracia?

Esta é a pergunta sobre a qual as consciências democráticas estão debruçadas em toda parte. Mas algumas respostas já parecem óbvias:
(1) Toda a força à Lava-Jato. A Lava-Jato, não é um fenômeno da “judicialização da política”. Ao contrário, o seu caráter é democrático, pois expressa a necessidade histórica de acabar com a impunidade dos crimes de colarinho branco para que o Brasil possa ser mais organizado, mais produtivo e mais justo! É a política se fazendo por outros meios para desbloquear a democracia! Portanto, diante de um poder legislativo constituído por tantos parlamentares envolvidos com o crime, ela precisa prosseguir, pois, ela mesma, transformou-se num fator de esperança e de credibilidade institucional! 
(2) Promover uma profunda reforma política, para libertar a democracia dos interesses fisiológicos e salvacionistas dos políticos implicados em crimes comuns;
Além desses dois fatores de caráter estrutural, insere-se um terceiro, de caráter conjuntural, mas de grande importância simbólica, expressando o valor fundamental de que a nação não pode ser presidida por quem esteja denunciado de crime comum:
(3) Deixar que a justiça julgue Temer. Isso é essencial, pois, se esse valor fundamental não for cumprido, cada dia adicional de seu governo acrescentará mais uma gota de desesperança, pessimismo e descrença na democracia, o caldo de cultura ideal para o fortalecimento, nas eleições de 2018, de alternativas e correntes políticas autoritárias, irresponsáveis, irracionais e populistas, cujos olhos estão voltados para o passado!
Muitos democratas dirão: essas propostas, particularmente a (2), não são viáveis para 2018. Creio que, mais do que nunca, então, é necessário que se pergunte: não estaríamos deixando de ousar, e perdendo uma oportunidade histórica de avançar mais rápido, confiando na democracia?

Carlos Alberto Torres
Em 29/07/2017


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(*) Constituição da República Federativa do Brasil - Senado Federal. Texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações determinadas pelas Emendas Constitucionais de Revisão nos 1 a 6/94, pelas Emendas Constitucionais nos 1/92 a 91/2016 e pelo Decreto Legislativo no 186/2008, Brasília, 2016. 

"Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (EC no 45/2004)
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; II–ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; III–ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; IV–é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; V–é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; ...". Segue até o último inciso, o LXXVIII.
(**) MOOC (Massive Open Online Course).
Alguns exemplos: https://www.coursera.org/; https://www.edx.org/; https://www.futurelearn.com/. Existem também em várias universidades públicas e privadas brasileiras iniciativas já bem sucedidas de ensino à distância.


terça-feira, 18 de julho de 2017

Íntegra do discurso de Gleisi Hoffmann no 23º Encontro do Foro de SãoPaulo

Gleisi Hoffmann apresentou-se na condição de presidente do PT no 23º Encontro do Foro de São Paulo, em 16/07/2017, na NicaraguaConhecer as suas declarações na íntegra - onde revela o seu pensamento e o de seu partido - é extremamente importante para entender os rumos da democracia e da esquerda no nosso continente. Elas propiciam uma avaliação da política internacional do PT pelas suas próprias concepções e palavras.

Não se pode desconhecer a importância desse encontro de um sub-conjunto expressivo de partidos e movimentos (*) da esquerda latino-americana com os quais o PT se identifica, sobretudo porque alguns desses partidos estão no exercício do poder e governam os seus respectivos países.

Muito do que acontecerá no futuro próximo na América Latina está relacionado com o evidente declínio do prestigio dessas concepções e do insucesso desses projetos em vários países, particularmente no Brasil, na Venezuela e em Cuba.

A declaração de Gleisi Hoffmann, além de ter pontuado enfaticamente a adesão e convergência com esses projetos, aproveitou o encontro para apresentar a visão do PT sobre os processos criminais em que Lula está incurso, e obter solidariedade internacional para sua causa. 

Apresento suas declarações em duas versões e três reportagens: (1) o vídeo de sua intervenção; (2) a edição jornalística do discurso, com texto em espanhol, colhida no site do PT (embora esta versão não reproduza exatamente o discurso feito em português); são incluídas, também, três reportagens: (3) da revista Veja; (4) da Gazeta do Povo - república; (5) do IG - Último segundo.

(1) O vídeo (discurso integral, sem edição) 



(2) La presidenta del PT (Partido de los Trabajadores) habla el defensa de Lula en el 23º Encuentro del Foro de São Paulo (http://www.pt.org.br/declaraciones-de-gleisi-hoffmann-en-el-foro-de-sao-paulo/). O texto está abaixo:




Compañeras y compañeros, delegados y delegadas, invitadas e invitados a este XXIII Encuentro del Foro de São Paulo. En nombre del Partido dos Trabalhadores (PT), del Brasil, nuestros calurosos y fraternales saludos. Soy Gleisi Hoffmann, Senadora de la República (de Brasil) y hace un mes, en nuestro 6º. Congreso Nacional, fui electa presidenta de nuestro Partido. Soy la primera mujer a ocupar este honroso puesto.

Agradezco a las y los compañeros del Frente Sandinista de Liberación Nacional por auspiciar este Encuentro y saludo los triunfos electorales más recientes de Daniel Ortega en Nicaragua y Lenín Moreno en el Ecuador, que demostraron claramente que es posible enfrentar y derrotar a las nuevas tácticas electorales y golpistas de la derecha. Al igual festejamos la importante victoria que ha sido la liberación del compañero Oscar López Rivera, este gran luchador por la independencia puertorriqueña, y también consideramos victorioso todo lo logrado hasta el momento en el proceso de Paz en Colombia, un proceso que debemos acompañar y apoyar hasta su aplicación definitiva.

Sin embargo, la derecha reaccionaria y golpista no descansa. La última semana un juez de primera instancia en Brasil ha condenado el Presidente de Honor del PT y ex-presidente del Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, a nueve años de prisión con base en delaciones sin fundamentos y sin pruebas. La acusación era haber recibido un apartamento de regalo de una constructora. Pero, los hechos demuestran la dimensión de la persecución y de la calumnia que quieren imputar a Lula, pues dicho apartamento en realidad pertenece a un banco y no a la constructora y, por lo tanto, no podría ser donado (por ella) a cualquiera.

Nuestro ex-tesorero, João Vaccari Neto, acaba de ser absuelto en primera condenación impuesta por ese mismo juez, pues contra él solo pesaban delaciones y no pruebas conforme instrucción del Código Penal brasilero, seguido correctamente por los jueces de segunda instancia.

Estamos frente a una ofensiva de judicialización de la política en todo el continente, y en Brasil la intención es destruir el PT e impedir que el mayor líder popular brasilero, Lula, sea nuestro candidato en las elecciones presidenciales de 2018, pues saben que la posibilidad de su victoria es enorme. Y más que nunca necesitamos nuevamente de un gobierno de izquierda en nuestro país para retomar el desarrollo nacional, la política externa altiva y activa y revertir las consecuencias del ajuste neoliberal impuesto por la banda golpista que se instaló en el gobierno de nuestro país.

A pesar del revés electoral que sufrimos en Argentina y el golpe de estado parlamentario en Brasil, los principales partidos miembros del Foro de São Paulo están retomando la ofensiva política ante los actuales gobernantes de la derecha en estos dos países con la perspectiva de volver a gobernarlos en su corto plazo.

El PT manifiesta su apoyo y solidaridad al gobierno del Partido Socialista Unido de Venezuela, sus aliados y al Presidente Nicolás Maduro frente a la violenta ofensiva de la derecha contra su gobierno y condenamos el reciente ataque terrorista contra la Corte Suprema. Tenemos la expectativa que la Asamblea Constituyente pueda contribuir para una consolidación cada vez mayor de la Revolución Bolivariana y que las divergencias políticas se resuelvan de forma pacífica.

Los análisis que venimos haciendo a lo largo de los últimos Encuentros ratifican el hecho de que estamos enfrentando a una nueva fase del capitalismo neoliberal, lo que confirma cada vez más claramente al constatar la concentración de las cadenas productivas globales sobre un número cada vez menor de empresas monopolistas en cada sector, que a su vez son controlados por un grupo cada vez más concentrado de megabancos y fondos de inversión. Estos grupos económicos presionan y aumentan sus exigencias a los Estados Nacionales para ampliar sus ganancias.

En momentos de crisis económica como la que enfrentamos desde 2008, un fenómeno que siempre se presenta es el proteccionismo nacional, principalmente en los países imperialistas, que cierran sus economías al mismo tiempo que exigen la apertura de los demás países. Prueba de esto es que el Presidente de EUA, Donald Trump, fue electo el año pasado sustentado por una plataforma proteccionista en la economía, xenófoba y reaccionaria en lo social y fascista en la política. Sus medidas económicas y comerciales más recientes, el rechazo al Acuerdo de Paris sobre cambios climáticos, las medidas antiinmigración, la revisión del acuerdo de normalización de las relaciones con Cuba y la injerencia directa en el conflicto sirio lo comprueban.

Por otro lado se debilitan las instituciones políticas, económicas y sociales nacionales e internacionales heredadas del liberalismo del siglo XIX. Ellas ya no responden con eficacia a las necesidades de las sociedades en los días actuales, pues la corrupción, el tráfico de influencias, el desvío de recursos y el enriquecimiento ilícito de sectores políticos y la sumisión de la política a los dictámenes de la economía no responden, no solucionan y no convencen a nuestros pueblos ante los problemas y necesidades que enfrentan en su vida cotidiana.

Estoy segura que los debates de este XXIII Encuentro por los partidos miembros del Foro de São Paulo contribuirán para la implementación de una política de desarrollo para América Latina y el Caribe, con amplitud en su visión y con una propuesta económica de menor dependencia de commodities, mayor valor agregado, integración regional más fuerte y transformaciones estructurales fundamentales. Para esto último hemos logrado un gran acuerdo que se tradujo en la concreción de una amplia plataforma programática y de acción: el Consenso de Nuestra América.

Nosotras e nosotros del PT defendemos que es necesario enfatizar la igualdad de oportunidades entre hombres y mujeres, los derechos de las y los trabajadores migrantes, el rechazo a la xenofobia y al racismo, la agenda del trabajo decente, la democratización de los medios de comunicación y la valoración de la economía social y solidaria.

Debemos valorar y profundizar las propuestas políticas ya definidas en los principios que componen el “Consenso de Nuestra América”, la resolución de la CELAC que considera a América Latina y el Caribe una Zona de Paz, y los principios del Derecho Internacional, particularmente, de la autodeterminación de los pueblos y la no injerencia externa.

Por oportuno queremos manifestar nuestro apoyo y solidaridad irrestrictos a las y los compañeros del Partido Comunista y al pueblo de Cuba frente al retroceso por parte de la nueva administración del Gobierno estadounidense en relación a los acuerdos alcanzados con la administración Obama y el mantenimiento del criminal bloqueo económico.

Este año celebramos el centenario de la Revolución Rusa de 1917 y también el cincuentenario de la caída en combate y posterior asesinato del guerrillero heroico, el comandante Ernesto Che Guevara, a quien recordamos para que tengamos siempre presente la necesidad de la transformación social de nuestros países.

Aprovecho para reforzar la invitación para que nos volvamos a encontrar en Montevideo el mes de noviembre para una nueva edición de la Jornada Continental por la Democracia y contra el Neoliberalismo.

Gleisi Hoffmann, presidenta del Partido de los Trabajadores


(3) Na Nicaraguá, Gleisi dá apoio a Maduro e cita perseguição a Lula




(5) Gleisi aponta perseguição a Lula e apoia Maduro em encontro do Foro de São Paulo - Último Segundo - iG (http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2017-07-16/foro-de-sao-paulo.html)


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Inclui partidos políticos de esquerda de Argentina, Aruba, Barbados, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Curaçao, Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, Martinica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Porto Rico, República Dominicana, Trinidade e Tobago, Uruguai e Venezuela.