segunda-feira, 9 de abril de 2018

O "tipping point" do quadro político

No dia 7/04/18, sábado, o quadro político mudou. A prisão de Lula, como gostam de referir-se alguns cientistas sociais, foi um ponto de inflexão ou de virada, também conhecido como um “tipping point” (*).


Doravante, nada permanecerá igual: nem o quadro político eleitoral, nem o posicionamento dos protagonistas nos três poderes. A sociedade se movimentará em busca de uma alternativa do campo democrático para eleger o novo presidente da república.

Será na justiça, particularmente no STF, que se verificarão as mudanças de posição mais evidentes. Provável que pelo menos mais um juiz mude o seu entendimento para apoiar a atual jurisprudência determinando o cumprimento da pena imediatamente após a condenação em 2ª instância, somando-se aos que já a defendem. Não cabe especular quem será nem como isso se dará.

Até o PT poderá vir a fazer uma inflexão radical em sua política - uma "autocrítica" - para encampar a luta contra a impunidade. Alguns argumentam que, com isso, o PT estaria voltando à sua origem, quando defendiam a ética na política; essa é a sua melhor alternativa se olham para a história. Mas a maioria dos petistas ainda insiste em defender que o PT sequer existiria sem Lula, e apostam no “volta Lula”. Entretanto, suas principais lideranças históricas já estão enroladas na justiça ou presas; agora foi a vez de Lula ser preso. Se Lula não for libertado não terão mais nada a perder; a realidade os obrigará a mudar de estratégia para disputar as eleições. Pela lei da sobrevivência, poderão abandonar os seus heróis de ontem e passar a exigir a punição de todos os bandidos. Cuidem-se, desde Renan e Jucá até o Sarney, o Temer, o Aécio e até a própria Gleisi. Em se tratando do PT, nada surpreenderá!

A sociedade brasileira como que estava emparedada por uma barreira invisível, política, simbólica. Porque não podíamos punir a Lula, esta barreira impedia que, simplesmente, realizássemos uma premissa da justiça e da democracia: punir a todos os poderosos envolvidos em ilícitos.

Lula, ao usar todo o seu prestígio e popularidade, inclusive internacional, para escapar da justiça e da devida punição, tornou-se a grande esperança de todo um mundo de conhecidos e reconhecidos criminosos escondidos atrás de diferentes mecanismos viciosos de nosso aparato legal, como o “foro privilegiado”, do fajuto cumprimento da pena somente após o “trânsito em julgado”, e de inúmeros outros vieses judiciais historicamente inseridos na legislação penal para manter impunes aos poderosos.

Esgotou-se o tempo de Lula. O seu discurso nos momentos que antecederam à sua prisão, sem respeitar a dignidade dos cargos que ocupou, foi lamentável. Incentivou à ocupação de lotes urbanos, terras rurais, queima de pneus...; ameaçou os meios de comunicação livres, clamou por revolução, proclamou-se como sendo uma ideia...; atacou a justiça, os seus jovens profissionais concursados, os  policiais federais, os procuradores e os juízes que o levaram à condenação. Proclamou-se dezenas de vezes inocente e perseguido! O ato foi apenas o que foi: uma catarse e um ritual de passagem. Lula respondeu com uma trôpega e inadimissível desobediência, teatralmente, para montar o espetáculo cinematográfico que culminou com a sua prisão inevitável!

Os méritos de Lula, entretanto, ninguém lhe retirará! Duas vezes presidente da república, a história saberá lhe fazer justiça. Os brasileiros, ao apoiarem majoritariamente que ele pague suas dívidas com a justiça e a sociedade, o fazem sem ódio, mas como um gesto fundamental, para que o Brasil supere a sua crise e recupere a esperança!

Como chegaram ou chegamos, socialmente, a este ponto? Como deixaram ou deixamos isso acontecer? Deixemos apenas o lixo rolar ladeira abaixo! Permaneçamos, todos, no alto da montanha!  A tarefa da reconstrução democrática terá que ser de todos nós, desta vez sem essa coisa do "nós contra eles"!

O nosso rumo é a democracia e o Estado Democrático de Direito! Mas, sejamos claros, os brasileiros querem acabar com a impunidade dos poderosos, ao mesmo tempo em que querem esvaziar as cadeias, para que tenham, nelas, menos pobres e pretos e mais criminosos de colarinho branco, exatamente os que são mais perigosos.


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(*) https://en.wikipedia.org/wiki/The_Tipping_Point

Uma referência que ajudou a popularizar o conceito de "tipping point" no Brasil é o livro:

Gladwell, Malcom "O ponto de virada - The tipping point". Editora Sextante (GMT Editores Ltda.), Rio de Janeiro, 2009. Tradução da edição original em inglês de 2002, publicada com o título "The Tipping Point".

domingo, 8 de abril de 2018

O que pensa o Vamos pra Rua

O grupo "Vamos pra Rua!" foi criado no Facebook no dia 26/03/18 como um instrumento de mobilização para a manifestação contra a impunidade, que ocorreu no dia 3/04, e que fora convocada pelo Vem Pra Rua e outros movimentos.

Ele é formado por democratas, ativistas de diferentes movimentos sociais da cidadania, que julgaram necessário diferenciar-se de outros grupos que estariam presentes na manifestação.



Abaixo, o seu texto fundacional com que descreveu o seu diferencial e objetivos:
"O grupo “Vamos pra Rua”, foi criado como instrumento de mobilização para organizar a ida dos residentes em Brasília e no DF à manifestação do próximo dia 03/04/18.
Ele é formado por cidadãos que se sintam diferenciados pelas seguintes características:
  1.  somos democratas, queremos viver em um Estado Democrático de Direito, não aceitamos ideias autoritárias e populistas, e muito menos propostas de intervenção ou golpe militar;
  2. estaremos na manifestação como uma força de paz, e nossas palavras de ordem e comportamentos são avessos a qualquer tipo de violência. 
Julgamos que essa é a posição majoritária dos brasileiros e que, portanto, essa visão deve ganhar visibilidade na manifestação.
 Mas isso exigirá organização! 
Os objetivos dos cidadãos-democratas que estarão nas ruas no dia 3/04 são os  seguintes:
I. Lutar contra a impunidade dos criminosos de colarinho branco e apoiar a continuidade da Operação Lava-Jato;

II. Defender a manutenção da atual jurisprudência para que os condenados em tribunais de 2ª instância cumpram imediatamente suas penas após cessados, nesta instância, os seus direitos recursais;

III. Combater a concessão pelo STF de qualquer tipo de salvo-conduto ou HC, seja a Lula ou a qualquer outro brasileiro, para impedir que o condenado cumpra a sua pena após a decisão do tribunal de 2ª instância.
Com um abraço fraternal de luta,

Madalena Rodrigues
Marta Crisóstomo Rosário
Carlos Alberto Torres
Mario Salimon"
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No próprio dia 3/04/18, dia da manifestação, o Correio Braziliense honrou ao Vamos para Rua! com a publicação da entrevista abaixo, na coluna À Queima-Roupa (*), do Caderno Cidades, cujo texto corresponde à elaboração conjunta de Madalena Rodrigues, Marta Crisóstomo Rosário e Carlos Alberto Torres.


Madalena Rodrigues, Marta Crisóstomo Rosário, Carlos Alberto Torres
O que vocês esperam alcançar com este movimento? O movimento “Vamos pra Rua” tem um objetivo primordial, entre outros. Queremos mostrar ao STF, nesta terça-feira, que nós, brasileiros, não vamos mais tolerar a impunidade. O acatamento do habeas corpus do Lula e a protelação do Supremo Tribunal Federal em julgá-lo nos deixa apreensivos. Fique claro que não nos referimos exclusivamente ao caso do Lula, mas ao fato de que a prisão pós-segunda instância é a garantia de que centenas de processos envolvendo crimes do colarinho branco no Brasil não se estenderão indefinidamente, possibilitando, muitas vezes, a prescrição do crime. Cito três democracias, digamos, maduras, como a França, os Estados Unidos e nossa vizinha Argentina, onde a prisão após segunda instância existe há anos e, se não extinguiu a impunidade e a corrupção, reduziu ambas substancialmente. 
Alguns defendem a intervenção militar. E vocês? Repudiamos totalmente essa ideia. O Brasil não quer e não merece qualquer retrocesso político. 
 O nome “Vamos pra Rua” não vai confundir o cidadão com grupos de extrema-direita?”
De maneira nenhuma. Somos um grupo que vem mostrar sua própria identidade como um segmento diferenciado do movimento “Vem pra Rua”, a quem cabe a paternidade dessa convocação. Mas não somos uma dissidência. Defendemos incondicionalmente os valores democráticos, não somos, enquanto iniciativa mobilizadora da cidadania contra a impunidade, ligados a qualquer partido, embora respeitemos e valorizemos a política e as preferências e opções partidárias de cada um. Os brasileiros precisam romper com uma polarização situada nos extremos do espectro político que olha pelo retrovisor da história; ambos esses polos são populistas, autoritários e salvacionistas; um se declarando de esquerda, outro de direita, e representados na sociedade pelo “lulopetismo” e pelo “bolsonarismo”. Mas nenhum deles é toda a esquerda ou toda a direita, pois existe mais ao centro um amplo contingente majoritário de brasileiros que vão da esquerda democrática até a direita democrática, incluídos os liberais. 
 Por que o grupo de Brasília buscou outra identidade? Nossa identidade inclui até mesmo a cor que vamos usar no dia 3 de abril (hoje), a cor azul. Expressa a ideia de que manifestamos nossa indignação, mas de modo pacífico e democrático. A palavra “Vamos” é um convite. Queremos atrair aqueles que não querem se sujeitar a qualquer tipo de extremismo, nem se misturar ao tumulto de carros de som estridentes com palavras de ordem autoritárias ou irresponsáveis. 
O “Vamos pra rua” quer a prisão do Lula? Como dissemos, a prisão do Lula não é um paradigma para o “Vamos pra Rua”. Ela é importante sim, mas estamos focados no combate amplo à impunidade em todos os seus aspectos.  
A corrupção é coisa antiga e de solução difícil. A sociedade brasileira conseguiu avanços importantes com a aprovação da Lei da Ficha Limpa, a Lei de Acesso à Informação e com o projeto das 10 Medidas de Combate à Corrupção, que apesar de seus 2,5 milhões de signatários, infelizmente está parado no Congresso Nacional. O trabalho da Lava-Jato tem sido fundamental nesse sentido e deve continuar, mesmo que atinja ex-presidentes, eventualmente o atual presidente da República, o que torna o caso Lula emblemático. Mas não seria o único, pois há todo um exército de investigados por corrupção que devem responder pelos desvios de verba que consomem dezenas de bilhões dos recursos públicos, todos os anos. 
O senhor enxerga alguma luz no fim do túnel? O Brasil precisa continuar evoluindo e creio que vai evoluir no sentido de acabar com a impunidade e com o foro privilegiado, que é parte desse processo. Os brasileiros estão muito mais alertas e participativos em relação aos acontecimentos políticos. Hoje, nas filas, nos táxis, nos restaurantes, fala-se de política até mais do que de futebol, o que é muito surpreendente em se tratando do nosso país. Estamos assimilando a ideia transformadora de que é preciso ter responsabilidade sim, quando depositamos nosso voto na rua. Mas nossa responsabilidade de cidadãos não termina aí. Democracia é um processo em constante evolução. Nossa participação como cidadãos precisa acontecer não apenas quando votamos, ou nas manifestações públicas, mas permanentemente. Cada um em sua atividade, tende a estar cada vez mais atento à participação, à exigência de transparência e eficiência por parte dos poderes públicos. Vigilância, controle social permanente, cidadania, são valores importantes para o Vamos pra Rua. Estamos também dizendo: Vamos transformar o Brasil. Ir pra rua com nossas ideias e nossa identidade. Todos somos parte desse movimento. 
O Vamos pra Rua!, entretanto, não acabou no dia 3/04, pois a luta contra a impunidade no Brasil continuará. No próprio dia da manifestação já ultrapassáramos a marca dos 2.500 membros. Esta acolhida estimulou a continuidade do grupo, ao avaliar que os brasileiros, na sua luta contra a impunidade, querem continuar mobilizados. Os próximos passos serão garantir a manutenção da jurisprudência do STF, de que os condenados em 2ª instância devem começar a cumprir imediatamente suas penas; da mesma forma, o grupo se engajará na luta pelo fim do foro privilegiado.


Oficina de cartazes
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(*) Ana Maria Campos – Coluna “Eixo Capital” – Foto: Antônio Siqueira/CB/D.A Press – Correio Braziliense


sexta-feira, 6 de abril de 2018

QUEM SÃO OS DEMOCRATAS?

QUEM SÃO OS DEMOCRATAS ? (*)
de Carlos Alberto Torres

Um amplo conjunto majoritário de brasileiros de todos os matizes políticos, que vão da esquerda democrática até a direita democrática, incluídos os liberais, que desejam viver no Estado Democrático de Direito.


Neste momento histórico estão fora desse contingente o populismo e o autoritarismo, representados pelo “lulismo”, pelo “bolsonarismo” e por todos os que defendem intervenção ou golpe militar.

Não são democratas, também, os que defendem a impunidade dos poderosos, desrespeitam a justiça e os cidadãos com suas chicanas, e atuam em todos os poderes da república, em uma verdadeira “santa aliança” tácita, de caráter suprapartidário e supra-ideológico, para impedir o aperfeiçoamento necessário da legislação penal para combater a corrupção e o crime de colarinho branco. Os que assim agem temem e combatem a Lava-Jato.

Os democratas de todos os matizes políticos não aceitam a intolerância, a violência dos extremistas, não praticam o “nós contra eles” e, tampouco, a desfaçatez dos que são coniventes com bandidos de estimação.

Os democratas lutam contra com todos os tipos de privilégios, particularmente o foro privilegiado, que permite a existência de uma casta de brasileiros acima da lei.
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(*) Atualizado em 7/9/18.

segunda-feira, 2 de abril de 2018

Joaquim Barbosa, simplesmente

A possível candidatura de Joaquim Barbosa como candidato a Presidente da república oxigena a campanha eleitoral.


O PSB, ao ter Joaquim Barbosa como filiado, e como provável candidato, presta uma contribuição efetiva para a despolarização do processo eleitoral. Por seus méritos e credibilidade, será um dos candidatos a presidente que terá chance de disputar o 2º turno.

É, seguramente, um fato novo que desbloqueia a campanha eleitoral das alternativas populistas, autoritárias e salvacionistas representadas por Lula e Bolsonaro.

Aqui neste blog já publicáramos a excelente entrevista com Joaquim Barbosa, "O nome da trégua", concedida à jornalista Maria Cristina Fernandes, do Jornal Valor, Brasília no dia 01/09/17 (*)

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(*) http://www.decisoesinterativas.com.br/2017/09/o-nome-da-tregua.html

O retrato de Joaquim Barbosa desta postagem é do artista Elson Rezende de Mello (http://www.elsonrezende.com.br).

quinta-feira, 22 de março de 2018

Como funciona a justiça

Postei em minha Linha do Tempo no Facebook, no dia 21/03/18, esse banner conceitualmente e politicamente correto do MBL, denominado "COMO FUNCIONA A JUSTIÇA PELO MUNDO". Surpreendeu-me o grande número de compartilhamentos. No momento em que estou terminando essa edição já totalizam 3300, superando em muito o número de 380 curtições e reações ao próprio post.


A ele agreguei o texto:
"Nos EUA e na França o criminoso vai pra cadeia imediatamente se a sentença do tribunal de 1ª instância condena-lo à prisão. No Brasil, siga a seta. É o sonho de consumo de todos os criminosos de colarinho branco do mundo. Alguns ministros do STF pretendem manter esse status quo.
#ResistaCármenLúcia!".
Tratou-se da campanha em defesa de que fosse mantida a jurisprudência estabelecida em 2016 pelo STF, de que os réus já devessem cumprir suas penas - inclusive a de prisão - imediatamente após suas condenações em tribunais de 2ª instância. Coerente a isso, posicionei-me, também, contrário a que fosse concedido casuisticamente habeas corpus ao ex-presidente Lula para que ele escapasse da regra. 

Para caracterizar a postura da presidente do STF, ministra da Cármen Lúcia, que resistiu bravamente aos seus pares que queriam promover o retrocesso na legislação penal, escrevi, no mesmo dia:
"A ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, converteu-se nestes dias na heróica resistente, dentro da suprema corte, à tentativa de alguns de seus pares de livrar Lula da cadeia. 
Hoje, quarta-feira, dia 21/03/18, no plenário da Corte, Cármen Lúcia travará uma batalha decisiva. Alguns de seus pares partirão com tudo sobre ela para tentar reverter a determinação legal de que os criminosos condenados em um tribunal de 2ª instância passem a cumprir suas penas! 
Seus oponentes são os mesmos que se converteram, via habeas corpus, em libertadores de criminosos poderosos de colarinho branco. Os mais notórios são Gilmar Mendes, Lewandowiski e Toffoli. Mas eles não estão sozinhos. 
Aparentemente, o ministro Celso de Melo, o decano da corte, converteu-se no líder desses cavaleiros do atraso dedicados a promover essa regressão casuística na legislação penal. Sarney, convertido em comandante de honra da operação “salva-Lula-da-cadeia”, lhe cobra uma atitude de gratidão, por ter sido o presidente que o indicou para o STF. 
Mas Cármen Lúcia não está sozinha! Ela colou-se à consciência democrática e republicana da esmagadora maioria dos brasileiros que não quer mais viver em um país onde os poderosos fiquem impunes e acima da lei. 
Ela representa a esperança de um Brasil mais ético, democrático e justo!
#ResistaCármenLúcia!"






segunda-feira, 12 de março de 2018

Ontologia versus Epistemologia

Carlos Alberto Torres

Não há quem tenha se debruçado sobre a metodologia da ciência natural ou social que não tenha tido que dar tratos à bola para compreender os conceitos de ontologia (se a realidade existe independente do pensamento humano) ou de epistemologia (relativa à forma pela qual o conhecimento pode ser adquirido).

Todos, queiram ou não, em suas reflexões sobre a vida ou sobre o mundo que os cerca, já tiveram que debruçar-se sobre problemas de natureza ontológica ou epistemológica.


O quadro acima é um recurso mnemônico para quem frequentemente precisa refletir sobre questões ontológicas e epistemológicas em sua produção intelectual. Aos que desejarem aprofundar-se encontrarão referências excelentes espalhadas em milhares de textos filosóficos ou que abordem a metodologia da ciência.

Para usar o quadro, uma breve descrição:

I. Em primeiro lugar, você deve observar as cores:


  • No eixo vertical (em verde escuro): ontologia, com suas duas posições polares; acima, o objetivismo; abaixo, o subjetivismo.
  • verde claro (nas colunas mais internas): os nomes mais comuns das posições filosóficas ontológicas.
  • No eixo horizontal (azul escuro): epistemologia, com suas posições polares; à esquerda, o empiricismo; à direita, o racionalismo.
  • azul claro (nas colunas externas): os nomes mais comuns das posições epistemológicas na metodologia da ciência; uma sucinta lista de alguns dos pensadores referenciais dessas posições e o quanto se aproximam dos polos ontológicos e epistemológicos.
II. Em segundo lugar, observar os quadrantes da figura, no sentido dos ponteiros do relógio:
  1. objetivismo-racionalismo: um espaço vazio, pois não se compatibilizam a visão ontológica, de uma realidade existente objetivamente, portanto acessável pelos sentidos, observável e mensurável, com uma posição epistemológica de aquisição de conhecimento baseada inteiramente na razão.
  2. subjetivismo-racionalismo: as posições ontológico-epistemológica se compatibilizam colocando a metodologia da pesquisa científica como tributária inteiramente da razão.
  3. subjetivismo-empiricismo: um espaço vazio, pois não se compatibilizam uma realidade meramente subjetiva com as observações, fatos e dados observacionais que caracterizam o empiricismo.
  4. objetivismo-empiricismo: as posições ontológico-epistemológica se compatibilizam; ou seja, o de uma realidade objetivamente existente, acessável pelos sentidos e observável com medidas empíricas.
III. A ciência moderna, livre de visões meramente polares, não prescinde nem da razão, nem da subjetividade, e nem, sobretudo, dos dados observacionais empíricos sobre a realidade objetiva que nos cerca. A pesquisa científica vale-se tanto da indução, a partir dos dados observacionais em busca de generalizações teóricas, quanto da dedução para testar hipóteses empiricamente a partir de prévias construções teóricas. Por isso, em uma de suas configurações mais prestigiadas denomina-se de método hipotético-dedutivo, como ilustrado na figura abaixo.

quinta-feira, 8 de março de 2018

O drama é maior do que 2018

Convido-os a ler o excelente artigo do professor Alberto Aggio. Ele mostra-nos porque um "Cenário pós-Lula deverá requisitar o concurso do conjunto da sociedade na reconstrução do País".



O Brasil, para sair da crise, não pode retroceder nas conquistas democráticas e civilizatórias que já alcançou. Os brasileiros sabem que nossa crise não é apenas econômica. Se o fosse, Temer poderia converter-se em candidato a presidente da república com alguma chance de vitória. Sobretudo, os brasileiros sabem que a saída da crise vai além da questão econômica, e está sendo conseguida como fruto do seu trabalho, da sua luta cotidiana e da sua esperança inesgotável!

O Brasil quer reconstruir-se, como uma democracia moderna e inclusiva do seu povo, com toda a sua diversidade étnica, cultural, comportamental e regional. Quer coisas básicas, como comer e morar com dignidade. Mas quer educação e saúde de qualidade, e sentir-se, em liberdade, seguro dentro de suas casas e nas ruas! Para isso, sabe que precisa estar longe do populismo e do autoritarismo, pois estes se alimentam de ilusões e de velhas concepções, que nos manterão prisioneiros de um Estado patrimonialista e corrupto.

Os brasileiros, mais do que nunca, sabem que precisam ver-se livres da impunidade dos poderosos como condição para que voltem a acreditar em seus politicos, governantes e juízes. A ética, simplesmente, converteu-se em matéria prima comportamental para a reconstrução do país!


"O drama é maior do que 2018
Alberto Aggio (*)


O Brasil vive um momento dramático. Os brasileiros vão às urnas em outubro esperando que o País encontre saídas reais para a crise e um novo sentido de futuro. As últimas escolhas e a composição dos últimos governos deixaram sequelas profundas que comprometeram a credibilidade da política. Hoje a crise ética é uma fratura aberta; a segurança pública, um descalabro, acossada pelo crime organizado. Parcas melhoras na economia e no emprego não alteraram esse cenário de desesperança.

Diante da confirmação da condenação de Lula pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), que deve ceifar sua candidatura presidencial, o País tem diante de si o desafio de superar o lulismo. A corrupção sistemática que arrasou o País nos anos do lulismo abalou todo o edifício político que havia sido montado nos anos de democratização. O cenário pós-Lula deverá requisitar o concurso do conjunto da sociedade, da opinião pública, dos intelectuais, dos partidos políticos e de todos os que se possam mobilizar pela reconstrução do País.

Lula e o PT nasceram no outono do autoritarismo como peças do “sindicalismo de resultados”, com roupagem e retórica de esquerda. No governo, o lulopetismo foi uma “esquerda de resultados”, nefasta para a sociedade brasileira, em especial para os mais pobres pois os subalternizou, fixando-os em seus interesses individuais e impedindo qualquer perspectiva de elevação cultural e política que os convocasse a formular e compartilhar um projeto nacional e civilizatório. O lulopetismo foi tóxico para a democracia e a esquerda. Como escreveu Demétrio Magnoli em artigo recente, “a ‘esquerda’ lulista escolheu o capitalismo selvagem do consumo privado, do crédito popular, do cartão magnético, das Casas Bahia e do Magazine Luiza” como horizonte de satisfação hedonista das massas. A pragmática petista contou, das origens até agora, com a anuência da “esquerda maximalista” que soldava apoios ao “grande líder” quando julgava necessário e conveniente. Papel desempenhado também pelos intelectuais das universidades públicas. Foi assim que o lulopetismo condenou o Brasil a não ver realizada a social-democracia ou o reformismo que poderiam instaurar um novo cenário histórico no País. Em nome do mito e servindo-se dele, o PT bloqueou a afirmação de uma esquerda democrática, defensora das reformas e aberta ao novo.

No Brasil de hoje, as ruas, que foram essenciais em 2013 e no impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, esmoreceram, mas não se despreocuparam. Como se sabia, seria ilusão esperar delas uma saída clara para a crise em que o País mergulhou. Sem conseguir estancar a crise ética, o governo Temer não produziu a expectativa positiva que se esperava, mesmo com uma oposição fraca e prisioneira do lulismo. A política, que havia revivescido, acabou por não se consolidar. Resultado: o drama se instalou, com uma sociedade órfã sem poder confiar no governo ou na oposição.

A expectativa voltou-se para as dimensões externas à política, notadamente para a Operação Lava Jato, que cumpria exemplarmente seu papel republicano e constitucional. Desorientada, a opinião pública passou a admitir saídas ilusórias e despropositadas. Alguns continuaram a ver nas ruas, via democracia direta, a alternativa a esse estado de desorientação. Outros concluíram que decisivo seria “dar o poder” aos “homens de toga”, como substitutos da má política. Embalados pela ânsia de poder, outros ainda viram nas eleições presidenciais de 2018 a salvação mediante apoio a algum outsider, uma sedução pelo transformismo que não faria mais que prolongar nossa agonia; por sorte, parece que essa febre está cedendo.

Mesmo nesse cenário parece haver alguma oxigenação no protagonismo dos chamados “movimentos cívicos” que clamam por renovação da política. Indiscutivelmente positivos, seu exclusivismo e seu finalismo eleitoral merecem, contudo, preocupação, bem como requerem uma checagem do seu real tamanho e sua incidência. Se é preciso evitar o “populismo” como alternativa, também é justo preocupar-se com o que os italianos chamam de qualunquismo, isto é, uma política sem organicidade, que se esgota na identidade do homem comum e das coisas simples, pois sabemos que a política é complexa e exige muito mais do que isso.

Fará bem ao País uma coalizão de forças que se expresse em ideias claras, equipando a sociedade e o Estado para enfrentarem os problemas que derivam da grande transformação advinda da revolução tecnológica em curso. O Brasil tem todas as credenciais para proporcionar a seus cidadãos uma vida digna no momento em que vai completar 200 anos de existência como país independente.

É, certamente, uma batalha dramática e exigente, considerando todos os desafios que temos pela frente, cujo inimigo maior são as promessas, imprudentes e perigosas, que comprometem os horizontes fiscais da República, além de escamotearem, com políticas econômicas dignas de desenhos autárquicos do passado, os equívocos trágicos que a História, mesmo a mais recente, nos tem ensinado.

Não há razão para desejar partir do zero e tampouco há razão para descrer dos brasileiros de bem que construíram, mesmo contraditoriamente, um País cheio de vitalidade e que, transformado, será um excelente lugar para viver. É preciso extrair do esforço democrático de luta dos brasileiros um amplo programa de reformas que deverá, sem as falsas promessas e ilusões da demagogia e da antipolítica, pôr o País para andar. Não surgirá nada de novo nesta quadra se nossos propósitos não visarem uma atualização verdadeira e realista. As ideias-chave para tanto são a valorização do trabalho, da ética e da República, estímulo à inovação e ao crescimento econômico, visão social consonante com o mundo em transformação, democracia e novo reformismo. Com as pessoas no centro das nossas preocupações e dos nossos horizontes."

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(*) PROFESSOR TITULAR DA UNESP